Por Elaine Tavares.
Câmara de Vereadores de Florianópolis tem 23 representantes que foram eleitos para defender os interesses da cidade e legislar sobre as questões locais. Desses, 14 estão envolvidos em denúncia de corrupção, inseridos no processo da Operação Ave de Rapina. Essa operação, desencadeada pela Polícia Federal, desvendou que os vereadores foram beneficiados com propina na fraude dos contratos de radares e sinalização de trânsito dentro do projeto de lei Cidade Limpa. O nome de cada um dos vereados surgiu nos documentos apreendidos na casa do empresário Adriano Nunes, dono da empresa de mídia exterior Visual Brasil, ao lado dos quais estava escrito: “cortesia” , e o valor respectivo.
Com o andamento da investigação a situação na Câmara tem sido surreal, pois a maioria dos vereadores envolvidos segue atuando e votando projetos que são vitais para a vida da cidade, como é o caso das questões do Plano Diretor, que mexem com grandes interesses empresarias, o que provoca muita desconfiança entre os cidadãos da capital. Até agora apenas dois deles foram afastados, o ex-presidente da casa, César Faria, do PSD, (que inclusive comandou com mão de ferro a votação ilegal do Plano Diretor em dezembro de 2014), e o vereador Badeko (PSD). Mas, além deles também foram indiciados e podem ser denunciados os vereadores Erádio Gonçalves (PSD), Tiago Silva (PDT), Coronel Paixão (PDT), Marcelo da Intendência (PDT), Deglaber Goulart (PMDB), Celio João (PMDB), Dinho da Rosa (PMDB), Ed Pereira (PSB), Roberto Katumi (PSB), Alderico Furlan (PSC), Dalmo Meneses (PP ), e Ricardo Camargo (PC do B). Erádio Gonçalves, inclusive, assumiu a presidência da Câmara e tem tocado os trabalhos na normalidade.
A Comissão de Ética da casa se debruçou sobre o caso dos dois vereadores que já foram afastados, César Faria e Badeko, e indicou a cassação dos mesmos por quebra do decoro parlamentar. Mas, no dia em que o tema seria apreciado pelos vereadores, uma liminar dada pelo juiz Laudenir Fernando Petroncini, impediu a discussão e a votação, baseado, segundo os vereadores, em informações que não condizem com a verdade e que podem ter induzido o juiz a erro.
Para os que acompanham as batalhas que se travam dentro da Câmara de Vereadores, aonde quase nunca é levado em conta o interesse da maioria da população, a situação é de realismo fantástico. O vereador Lino Peres, do PT, lembrou muito bem que quando os vereadores votaram de forma ilegal o Plano Diretor, procurou-se a Justiça para reverter a situação e a resposta dada foi de que o Legislativo era autônomo e não poderia receber intervenção judicial. Agora, como os interesses não são os da população, mas de alguns prepostos de grandes empresas, a justiça se pronuncia e atua impedindo a votação da cassação. Dois pesos e duas medidas ou a escrachada verdade?
Agora, a Câmara terá dez dias para responder aos questionamentos do juiz e só depois o tema poderá voltar a baila, considerando que o magistrado não mantenha a liminar depois de esclarecido. A alegação que impediu a votação foi de que os mesmos vereadores que denunciaram o vereador fizeram parte da Comissão de Ética, o que não é verdade. O denunciante foi exclusivamente o vereador Afrânio Boppré.
Na sessão de quarta-feira, excetuando os pronunciamentos de Lino Peres (PT) e Afrânio Boppré (PSOL) os demais se mantiveram relutantes, afinal, tem pelo menos mais 11 deles que estão na berlinda. Não se pode saber se houve algum alívio por protelar o tema da cassação, afinal isso pode acontecer com os indiciados restantes, ou se o desejo é cassar logo os dois que estão no foco para criar a figura do bode expiatório e colocar panos quentes sobre os demais. A situação é delicada.
Enquanto as coisas se enrolam no campo do judiciário, a população se divide entre a indiferença e a indignação. Nessa quinta-feira o funcionário público Alexandre Magno de Jesus, lotado na Secretaria de Assistência Social de Florianópolis, externou o seu protesto entrando com um pedido de cassação contra o vereador Erádio Manoel Gonçalves (PSD), atual presidente da Câmara, também acusado de receber propina. Agora, resta saber se a casa vai abrir o debate na Comissão de Ética também para esse caso.
Nas ruas, poucos sabem o que está implicado em todo esse enrosco, mas já saem atirando. “São tudo ladrão”, diz Antônio Carlos de Oliveira, vendedor ambulante, mas acrescenta: “Isso não dá em nada, essa gente tem as costas quentes”. Evelise Duarte, funcionária pública, diz que não sabe como essa gente é eleita. “Tu nunca vê esses caras nos bairros ou na vida da gente e, de repente, eles se elegem com milhares de votos. É tudo comprado. Eu não confio na Justiça e se alguém for cassado é porque tem algum interesse aí por trás. Nós sempre vamos sair no prejuízo”.
E assim, a nave dos indiciados segue voando. Projetos importantes continuam sendo votados e com pouca fiscalização cidadã. Sem mobilização popular a tendência é as coisas esfriarem. Nesse dia 12, na Câmara, havia apenas a presença solitária dos bravos dirigentes do Sintrasem, o sindicato dos municipários, e alguns militantes sociais que foram ver de perto mais essa “pizza”. Alguns estão de olho e pelo menos, a partir deles, as informações fluem.