Câmara adia mais uma vez votação do PL de auxílio a agricultores; oposição pressiona

PL 735 prevê medidas emergenciais para trabalhadores rurais durante pandemia e aguarda votação no plenário

Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, e Marcos Pereira (Republicanos-SP), primeiro vice-presidente. Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados

Por Cristiane Sampaio.

O intenso jogo político em torno da liberação de verbas durante a pandemia gerou um novo adiamento da votação do Projeto de Lei (PL) 735/2020, que prevê medidas de auxílio a agricultores familiares. O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), anunciou, na noite desta terça-feira (14), o adiamento da apreciação da pauta para a próxima semana. “A pedido do governo”, informou, sem dar detalhes.

Horas antes, o deputado Nilto Tatto (PT-SP) havia feito um apelo para que o plenário apreciasse o texto, após os seguidos adiamentos. A proposta é o carro-chefe de um grupo de 26 PLs que pedem iniciativas voltadas a tabalhadores rurais. Entre eles, está, por exemplo, o PL 886/2020, da bancada do PT na Casa, que foi produzido a partir de demandas apontadas por movimentos populares do campo.

O texto que está em discussão na Câmara é o parecer do relator do PL 735, deputado Zé Silva (Solidariedade-MG), cuja votação vem sendo adiada há pelo menos três semanas. A proposta prevê medidas como a renegociação de dívidas rurais e a concessão de crédito para incentivar a produção no campo.

Temos muita gente dependendo do Estado para receber alimentos.

“Esse projeto é estratégico pra gente apoiar neste momento. Na verdade, lá se vão quase quatro meses [do avanço do coronavírus] e é preciso que o Congresso dê resposta a um setor que é tão estratégico para o enfrentamento da pandemia”, cobrou Tatto, acrescentando que a medida contribui para a produção de alimentos no país e ajuda a evitar uma eventual crise de desabastecimento no meio urbano, hoje impactado pela desaceleração econômica.

“A gente já vinha numa crise muito grande e, portanto, temos muita gente dependendo do Estado para receber alimentos. Se a gente não aprovar rapidamente o projeto pra fomentar a produção da agricultura familiar, nós vamos ter um problema sério logo ali na frente com falta de alimentos”, alertou o parlamentar, um dos articuladores do PL.

Os agricultores familiares não figuram entre os grupos atendidos pelas políticas de auxílio emergencial do governo Bolsonaro. “É o momento de o parlamento puxar isso pra si, da forma como já vem fazendo, e mostrar para o povo brasileiro o quanto é importante e significativo apoiar a agricultura familiar neste momento”, disse Nilto Tatto.

Sociedade civil

A votação do PL 735 é alvo de forte pressão da sociedade civil, especialmente das entidades envolvidas na elaboração do PL 886/2020, que pede, além da renegociação de dívidas e da concessão de crédito, iniciativas como o apoio para a construção de cisternas e crédito universal para as mulheres do campo. O texto de Zé Silva, por exemplo, libera este benefício apenas para aquelas que são chefes de família ou mães solteiras e não atende à demanda sobre tecnologias de acesso à água.

De acordo com os interlocutores que defendem o PL na Câmara, a barreira principal para a adoção dessas outras medidas é a equipe econômica do governo, que vem impondo entraves à liberação de mais verbas. A construção de cisternas para 25 mil famílias, por exemplo, demanda um montante de R$ 150 milhões.

Temos o risco de desabastecimento alimentar porque os estoques públicos de alimentos estão muito baixos

Para a antropóloga Maria Emília Pacheco, assessora da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase) e ex-presidenta do Conselho de Segurança Alimentar (Consea), as limitações se comunicam diretamente com o modelo em que estão historicamente fundadas a economia e a agricultura brasileiras.

“Este é um país da economia de exportação de commodities, mesmo que se possa admitir que um ou outro representante do agronegócio faça alguma concessão, mas é um país que optou por esse caminho, que é extremamente de conflito e de risco enorme. Neste momento, temos o risco de desabastecimento alimentar porque os estoques públicos de alimentos estão muito baixos, então, a razão [para não se votar o PL] é política, ideológica. O recurso existe”, afirma Pacheco.

Nos últimos meses, as diferentes propostas aprovadas pelo Legislativo liberaram um montante de mais de R$ 500 bilhões para as ações de enfrentamento à covid-19 no país, segundo dados do Siga Brasil, plataforma do Senado que acompanha os gastos da União.

Brasil de Fato, mais uma vez, tentou ouvir o relator do PL, deputado Zé Silva, e o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), sobre o adiamento da votação, mas não conseguiu contato com os dois.

Edição: Rodrigo Chagas

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