Por Raul Fitipaldi.
Lua redonda e melancólica de março
é atravessada por pássaros de bruma que fogem em debandada.
Dois esqueletos frágeis alçam uma mala pesada como rocha.
Abordam uma esperança incolora pra fora daqui.
Dois gatos e um cachorro, maltrapilhos os três, beiram uma estrada lúgubre e longa até a fronteira. Conversam em calma.
Um estudante, com John Coltrane no fone de ouvido, sobe pela escada rolante do aeroporto.
Duas estudantes escrevem mensagens às suas amigas. Uma em Buenos Aires; a outra amiga em Toronto.
Cinco idosos rezam numa casa de saúde. Preces desbotadas.
Alguns bêbados murcham horas azedas num cemitério deserto. Um comete suicídio e os outros nem percebem.
Um rei bobo, alucinando, brinca de colorir um desenho. Vocifera uma vez, duas, mil vezes todos os dias. Não se sacia nunca o atormentado.
A lua, os pássaros, os gatos e o cachorro. O estudante. As estudantes e as amigas, todos estão já muito longe. Não mais escutam as gargalhadas sincopadas do adoentado.
Os idosos se desmancharam com as preces. O cemitério foi clausurado por lotação inesperada.
Não ficou mais nada. Um continente esvaziado entre pilastras e poemas de Drumnond.