Por Igor Carvalho e Vinícius Segalla.
O Ministério Público do Estado de São Paulo investiga desde o dia 14 de setembro deste ano indícios de fraude na contratação de pessoal comissionado na Prefeitura de São Paulo.
De acordo com os termos do documento de abertura de inquérito da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital – ao qual o Brasil de Fato teve acesso –, a suspeita é de que a prefeitura estaria contratando em cargos comissionados (via indicação, sem concurso público) servidores terceirizados, a custos elevados, para funções de Assistente de Gestão de Políticas Públicas (AGPP), Analista de Políticas Públicas e Gestão Governamental (APPGG) e Analista de Planejamento e Desenvolvimento Organizacional (APDO), “para as quais um contingente de candidatos foram aprovados em concurso nos últimos anos e não restaram nomeados”.
Ou seja, o município gastou para a realização de concursos públicos, selecionou candidatos que pagaram e prestaram estes concursos, mas, na hora de empossar os vitoriosos, não o fez. Para seus lugares, contratou pessoal por meio de cargos comissionados.
No caso mais extremo, um funcionário, que, temendo retaliações, pediu para não ter seu nome revelado, foi aprovado no concurso, não foi diplomado servidor e, depois, foi chamado para preencher o mesmo cargo, mas por meio de contrato por comissão (leia mais sobre o assunto amanhã, na segunda parte desta reportagem, no Brasil de Fato).
O Ministério Público baseia sua decisão de abrir o inquérito em relatório do Tribunal de Contas do Município de São Paulo e em relatório técnico encaminhado aos promotores pelo gabinete do vereador Celso Giannazi (PSOL). De acordo com os promotores, o suposto esquema de fraude nas contratações criou novas denominações e cargos comissionados para exercerem as mesmas funções que são previstas para o preenchimento via concurso público, e não indicação de políticos ou secretários. Veja o trecho abaixo, que versa a respeito de contratações realizadas em 2019.
O vereador Celso Gianazzi explica: “O prefeito Bruno Covas tem burlado os concursos públicos. Ele está contratando pessoal comissionado para exercer funções que, por lei, devem ser exercidas por servidores concursados. Nessas contratações, o que constatamos é que uma série de apadrinhamentos políticos foram utilizados como critério de contratação”.
O gabinete do parlamentar entrevistou uma série de funcionários contratados por meio dessas indicações e, conforme apurou e informou ao MP, eles descreveram suas atribuições e rotinas, que são exatamente as mesmas previstas para servidores concursados.
O MP informa também a “existência de diversos anúncios de ‘processos seletivos’ para a contratação de comissionados, cuja descrição dos cargos era extremamente semelhante a cargos efetivos com aprovados aguardando nomeação, a exemplo do cargo de Analista de Políticas Públicas e Gestão Governamental (APPGG)”.
Os promotores dizem mais: “Há uma política explícita de priorização de contratação de terceirizados, a altos custos, para funções efetivas típicas, citando como exemplo a rejeição, pela Junta Orçamentária Financeira, de nomeação de 20 Assistentes de Gestão de Políticas Públicas (AGPP) para ocupação de postos no Descomplica-SP, deliberando-se pela contratação de empresa terceirizada.”
Neste caso específico, a Secretaria Municipal de Inovação e Tecnologia e a empresa S&C Empreendimentos e Prestação de Serviços LTDA. firmaram contrato no valor de R$ 532.233, para prestação de serviços continuados de atendimento ao cidadão em postos do Descomplica-SP. Tal contratação, afirma o MP, desmonta a tese já apresentada às autoridades pela Prefeitura de São Paulo, de que não teria efetuado as contratações do concurso que realizou porque estava sem dinheiro em caixa.
A promotoria paulista diz ainda que tais procedimentos ferem o artigo 37 da Constituição Federal, que diz que “a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”.
Além disso, “o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que a contratação de servidores comissionados para desempenhar funções desempenhadas cujos cargos deveriam ser providos por regular concurso púbico representa ato de improbidade administrativa que afronta o disposto no art. 37, II da Constituição Federal”, argumenta o Ministério Público. A pena para este crime, cuja responsabilidade seria do prefeito Bruno Covas (PSDB), pode chegar à perda dos direitos políticos por até oito anos e multa.
A representação do Ministério Público, feita no dia 14 de setembro, dava 15 dias para a Prefeitura de São Paulo apresentar defesa preliminar acerca do assunto. Na tarde desta quinta-feira (1), o Brasil de Fato entrou em contato com a administração municipal e perguntou, entre outras questões, se a prefeitura havia cumprido a determinação da promotoria e qual teria sido sua resposta.
Até a publicação desta reportagem, não havia qualquer resposta. Caso o município venha a se manifestar a respeito do assunto, seu conteúdo integral será incluído nesta reportagem.
Edição: Rodrigo Durão Coelho.