Por Nara Lacerda.
A semana que se encerra neste sábado (17) começou com mais um recorde registrado pelo Brasil na pandemia. Na última segunda-feira (12), o país registrava a maior média diária de mortes desde o início da circulação do coronavírus em solo nacional. Nas UTIs dos hospitais, a escassez de remédios e equipamentos para pacientes graves levava o alerta ao máximo.
Na ocasião, o índice de pessoas totalmente imunizadas no país, que passaram pela aplicação das duas doses da vacina, era menor que 4%. Por falta de doses, a campanha de vacinação seguia paralisada em diversos municípios brasileiros.
Um dia depois, na terça-feira (13), um levantamento feito em mais de 2,4 mil cidades indicava que quase metade delas temia a falta de oxigênio em até dez dias. Segundo a pesquisa, do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), mais de 65% dos municípios dizia não ter capacidade de suportar o aumento na demanda.
Os alertas sobre a falta de remédios para intubação passaram a se multiplicar, vindos de governos, mas também de profissionais da saúde. Os relatos descreviam cenas de terror. Sem o medicamento, os riscos do procedimento aumentam, e a retirada de pacientes do auxílio respiratório se torna um processo doloroso e que pode causar sequelas.
Na cidade do Rio de Janeiro, profissionais da saúde denunciaram que os doentes intubados estavam amarrados às camas hospitalares por falta de sedativos. Cenas semelhantes foram narradas por trabalhadores de outros estados, como São Paulo e Goiás.
Em conversa no podcast A covid-19 na Semana, o médico de família Aristóteles Cardona, da Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares, afirma que a situação de falência do sistema já se concretiza.
“Antes a gente falava na possibilidade de colapso, e que alguma coisa precisava ser feita. Durante meses se falou isso. Não era nenhuma grande novidade pensar nessa perspectiva. Acontece que, nas últimas semanas, o que era possibilidade se tornou realidade. De fato, a gente vive sob um colapso”, alerta ele.
Ainda segundo Cardona, a porta de entrada do sistema também enfrenta graves problemas. “O sistema de saúde está cheio. O Samu não dá conta de levar todo mundo. Pacientes que estão em estado crítico nas unidades básicas de saúde esperam por horas. Até quem não trabalha em UTI tem vivido isso. Se a gente já falava em exaustão antes, agora isso é uma coisa que, diariamente, está nos acompanhando.”
A pressão por parte das secretárias de saúde estaduais começou a aumentar. Na quarta-feira (14), o governo paulista divulgou que havia enviado um pedido emergencial para o Ministério da Saúde, e que os estoques precisavam ser reabastecidos em 24 horas. Em Minas Gerais, também houve pedido de urgência na entrega dos medicamentos.
Pelo menos dez estados estão em situação crítica. Além de São Paulo e Minas Gerais, há alertas em Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Maranhão, Tocantins, Roraima, Acre e Amapá.
No dia seguinte, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirmou que os estados com maior poder econômico deveriam se mobilizar para conseguir os insumos. “Não é só empurrar isso para as costas do Ministério da Saúde”, disse ele em entrevista coletiva para a imprensa.
Vale ressaltar, no entanto, que o Ministério da Saúde requisitou à indústria, em março, que toda a produção excedente seja repassada a pasta para posterior distribuição ao Sistema Único de Saúde (SUS). Desde então, os estados relatam lentidão na chegada dos medicamentos.
Na quinta-feira (15), a Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) divulgou que 30% dos hospitais estão com baixo estoque de anestésico e “kit intubação” no Brasil. A quantidade dos insumos estava em níveis suficientes para durar no máximo cinco dias.
Os município que registraram o risco são Belém (PA), Belo Horizonte (MG), Uberlândia (MG), Juiz de Fora (MG), São Paulo (SP), Atibaia (SP), Niterói (RJ), Cariacica (ES), Serra (ES), Brasília (DF), Cuiabá (MT), Curitiba (PR), Porto Alegre (RS), Joao Pessoa (PB) e Salvador (BA).
Enquanto isso, a vacinação está suspensa em diversos locais. Entre as cidades afetadas estão pelo menos cinco capitais: Goiânia, Salvador, Curitiba, João Pessoa e Rio Branco.
Queiroga também cobrou trabalho coletivo por parte dos estados. Aristóteles Cardona afirma que as responsabilidades realmente são de todos, mas lembra que o Governo Federal não tem um plano nacional de combate ao coronavírus e não atua como guia das unidades da federação.
“Um comitê nacional tem que ser tocado pelo Ministério da Saúde. A gente sabe que os serviços de saúde, em sua maioria, são geridos pelos municípios e estados, não há dúvidas disso. Mas em um país com a diversidade e o tamanho do nosso, não dá para combater a covid dessa forma. Sem atuação coordenada por parte do Ministério da Saúde, não tem como combater isso”, alerta o médico.