Brasil: a aventura da mobilidade

mobilidadePor Dal Marcondes.

Caminhar pelas cidades brasileiras significa enfrentar o desafio da morte em cada esquina. Os motoristas precisam mudar seu comportamento no trânsito

Caminhar pelas cidades brasileiras significa enfrentar o desafio da morte em cada esquina, em cada faixa de pedestre. Se os motoristas brasileiros não mudarem de comportamento no trânsito teremos milhares de turistas atropelados durante as Olimpíadas e a Copa do Mundo. Afinal, principalmente na Europa e nos Estados Unidos, quando uma pessoa desce da calçada em uma faixa de pedestres, o trânsito pacientemente para.

Nas reportagens sobre os preparativos para as Olimpíadas e para a Copa do Mundo há defensores das bicicletas, dos trens, do metrô, dos coletivos em geral e até quem defenda ainda a mobilidade urbana baseada no automóvel. Mas poucos se lembram dos pedestres, que em última instância somos todos nós quando não estamos a bordo de algum tipo de transporte. Cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Manaus, Belo Horizonte e outras que receberão milhares de turistas não estão preparadas para o desafio da cidadania na mobilidade. Até agora não existe nenhum movimento visível em direção à educação dos motoristas brasileiros para que não assassinem os torcedores que vierem visitar o Brasil nestes mega-eventos.

O Brasil precisa deixar de ser o país do jeitinho e se tornar o país que respeita sinalização de trânsito e, principalmente, faixas de pedestres, que atualmente são verdadeiras armadilhas para pessoas que se acreditam seguras porque elas são definidas pela lei como “extensões da calçada”, portanto, território de pedestres, para quem os carros devem parar e esperar.

“Se eu parar na faixa o carro de trás pode bater no meu carro”, foi a explicação que ouvi outro dia na rua. Os motoristas deveriam reduzir automaticamente a velocidade ao aproximarem-se de locais sinalizados para a travessia de pedestres. Dados de pesquisadores americanos demonstram que com carros a 32km/h matam 5% dos pedestres atingidos, enquanto 65% sofrem lesões e 30% sobrevivem ilesos. A 48km/h, 45% das vítimas morrem, 50% sofrem lesões e 5% sobrevivem ilesos. A 64km/h 85% das pessoas atingidas por veículos morrem e os 15% restantes sofrem algum tipo de lesão.

Outro dado impressionante, é que o atropelamento é a terceira maior causa de morte de crianças em nossas cidades. Os números entre os idosos também não são desprezíveis. São cerca de 45 milhões de pessoas que recebem uma licença para dirigir, e que recebem a maior parte da atenção do poder público, contra pouco mais de 150 milhões que caminham e que podem morrer por um simples descuido ao atravessar uma rua, mesmo que estejam sob a “proteção de uma faixa de pedestres”.

Outro dado interessante, desta vez sobre a cidade de São Paulo, mostra que 36% das viagens dentro da cidade são feitas a pé, contra apenas 27% realizadas de automóvel. No entanto, mais de 80% dos investimentos públicos são focados na mobilidade por automóveis. As bicicletas respondem também por outro grande percentual, seja em trajetos completos, casa-trabalho, ou casa-transporte coletivo. Somados, pedestres e ciclistas representam mais da metade das viagens na cidade.

Quando se fala dos conflitos nas vias públicas, há, certamente, a imprudência de muitos pedestres, que também devem cuidar de cumprir a sua parte e não se exporem desnecessariamente, ou de forma imprudente aos riscos da mobilidade urbana. Mas, o que vemos atualmente na maior parte das cidades brasileiras é um abuso de força das pessoas motorizadas. Quanto mais lata, mais arrogância na circulação e a conquista dos espaços destinados a pedestres pelo peso de suas máquinas.

O país já tem um PAC da Mobilidade nas Grandes Cidades, que investirá R$18 bilhões – R$6 bilhões de investimento direto da União e R$12 bilhões por meio de financiamento – para ampliar a capacidade de locomoção e melhorar a infraestrutura do transporte público nas grandes cidades. Nos próximos meses o poder público deveria utilizar parte desses recursos com campanhas de educação para a mobilidade urbana. Caso contrário será trágico ter de explicar porque muitas pessoas que virão passear, praticar esportes ou assistir jogos por todo o Brasil terão de voltar para seus países e para suas famílias em caixões lacrados.

Fonte: Carta Capital.

Foto: Almeida Rocha/Folhapress

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