Telegramas sigilosos do Itamaraty revelam que o governo do presidente Jair Bolsonaro recusou oferta de 86 milhões de doses de vacinas contra a covid-19. O montante foi sugerido pelo consórcio Covax Facility ainda no primeiro semestre de 2020, e seria suficiente para vacinar 20% da população brasileira. Em vez disso, depois de longas negociações, o governo brasileiro optou por adquirir apenas 43 milhões de doses, recusando igual quantidade.
As informações constam na correspondência diplomática entre o Ministério das Relações Exteriores e a embaixadora Maria Nazareth Farani Azevedo, chefe da missão brasileira em Genebra, na Suíça. Os documentos sigilosos, obtidos pela CPI da Covid, foram divulgados nesta quinta-feira (10) pelo jornalista Jamil Chade, em reportagem publicada no portal UOL.
Nessa correspondência, o Itamaraty reconhece as vantagens de integrar a Covax Facility, esforço coordenado pela Gavi Alliance. Ao participar da aliança, o Brasil teria “acesso a futuras vacinas contra a covid-19 a preços inferior aos do mercado”, por exemplo. Além disso, o mecanismo de compra coletiva serviria para “compartilhar riscos” entre maior número de países.
Ganhando tempo, perdendo vidas
Apesar desses benefícios, o governo brasileiro optou por “ganhar tempo” ao arrastar o processo de inclusão no consórcio, revelam os telegramas. O país já havia chegado atrasado, pois não participou da primeira reunião da Covax Facility, ocorrida em abril do ano passado. A atitude não foi bem recebida pelo grupo. Meses depois, em julho de 2020, o ministério manifestou interesse em participar da iniciativa.
Nesse momento foi apresentada a oferta de 83 milhões de doses. Mas houve recuo do governo, quando tomou conhecimento das vacinas que fariam parte da iniciativa naquele momento. Eram nove imunizantes em desenvolvimento. A lista incluía as da Universidade de Oxford-AstraZeneca, a Clover BioPharmaceuticals, do Instituto Pasteur, da Universidade de Hong Kong, a Novavax, a da Universidade de Queensland, a da Moderna, da Inovio Pharmaceuticals e a CureVac.
“Em análise preliminar, o Ministério da Saúde indicou que as vacinas contempladas encontram-se em diferentes estágios de desenvolvimento, razão pela qual haveria ainda bastante incerteza quanto a seus resultados finais”, explica o telegrama. Ao final, o governo brasileiro optou por adquirir apenas a metade do total de imunizantes ofertados.