“O presidente Jair Bolsonaro tornou-se um problema internacional tão grande que ninguém está disposto a ajudá-lo. Ninguém fala em dar grande ajuda ao Brasil. O mundo inteiro está tentando ajudar a Índia”, disse o cientista político Maurício Santoro, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), ao jornal The Washington Post. A reportagem, reproduzida hoje (3) pelo jornal O Estado de S. Paulo, aborda as razões das diferenças na ajuda internacional à Índia e ao Brasil.
A rapidez da ajuda à Índia, que como o Brasil tem uma grande disseminação do novo coronavírus e muitas mortes, vem de diversos países. Semana passada, o governo de Joe Biden divulgou a entrega de mais de US$ 100 milhões em equipamentos e material hospitalar. Cingapura e Tailândia enviaram oxigênio. O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, anunciou que o Reino Unido fará tudo o que for possível.
Na semana passada, a presidente do Parlamento Europeu, Ursula von der Leyen, tuitou três vezes sobre a ajuda à Índia. No entanto, pouco ela falou sobre o Brasil.
Bolsonaro pediu ajuda
Em março, o presidente Bolsonaro pediu ajuda às organizações internacionais, e governadores pediram à ONU “ajuda humanitária”. Há duas semanas, o embaixador brasileiro na União Europeia implorou por ajuda. “É uma corrida contra o tempo para salvar muitas vidas no Brasil”.
“O que está acontecendo no Brasil é uma tragédia que poderia ter sido evitada”, afirmou um membro do Parlamento Europeu ao embaixador brasileiro em uma audiência este mês. “Mas esta tragédia foi baseada em decisões políticas erradas”.
Ao Brasil, a Alemanha enviou ventiladores depois que o sistema de saúde em Manaus colapsou. A Organização Mundial da Saúde (OMS) começou a enviar vacinas. A União Europeia e seus países membros concederam cerca de US$ 28 milhões em doações desde o início da pandemia, segundo um porta-voz. Em resposta a uma solicitação do Brasil em março, o bloco contribuiu para o envio de “80 mil unidades de medicamentos criticamente necessários” ao Brasil.
Trump deu cloroquina
À pergunta da razão pela qual os Estados Unidos não se mexeram para ajudar o Brasil com a urgência demonstrada em relação à Índia, um porta-voz do Departamento de Estado apresentou uma lista de contribuições dos EUA ao Brasil antes da fase pior da pandemia, por um total de mais de US$ 20 milhões em assistência fornecida pelo governo. O porta-voz acrescentou ainda os US$ 75 milhões de “ajuda do setor privado”. A contribuição, grande parte da qual foi enviada durante a administração Trump, incluiu mil ventiladores e 2 milhões de comprimidos de hidroxicloroquina.
“Continuamos ativamente dispostos a discutir com o governo brasileiro suas necessidades e a encontrar maneiras de continuarmos nossa parceria com o Brasil a fim de ajudar a satisfazer as suas necessidades”, afirmou ao jornal o porta-voz do Departamento de Estado.
A diferença de tratamento dado aos dois países é fruto da diplomacia brasileira, que destruiu a imagem internacional que o Brasil levou décadas para construir. O governo Bolsonaro insultou grande parte do mundo, zombou do globalismo, acusou países europeu inclinados ao respeito do meio ambiente de colonialismo e desmatamento ilegal.
Desastre diplomático
Bolsonaro amplificou uma mensagem nas redes sociais usando termos depreciativos contra a aparência da mulher do presidente francês, Emmanuel Macron. Reiterou as afirmações infundadas do presidente Donald Trump sobre fraude eleitoral, e foi o último líder do G-20 a reconhecer a vitória do presidente Joe Biden. Durante meses, membros do seu governo e apoiadores dispararam ataques racistas contra a China e zombaram de sua vacina. Na última terça-feira, seu ministro da Economia afirmou que a China “inventou o vírus”.
O governo Bolsonaro menosprezou a ciência da China e suas vacinas, enquanto dependia do país para obter material para as vacinas. Em abril, o ex-ministro da Educação de Bolsonaro tuitou uma mensagem racista provocando uma violenta censura da China e da Suprema Corte brasileira. O filho do presidente, deputado Eduardo Bolsonaro, culpou a China pela pandemia, depois a acusou de usar o sistema 5G para espionagem.
Desde o começo o governo chinês havia feito advertências de “consequências negativas” se tal retórica continuasse. E cumpriu. Em janeiro, o embarque de material da China para a produção de vacinas sofreu um considerável atraso, provocando uma série de especulações. Para alguns veículos de informação, os insultos do governo tiveram consequências.