Antes alardeado como fonte renovável de energia do futuro, o óleo de palma avançou rapidamente graças às suas “credenciais verdes”. E se tornou um dos principais biocombustíveis para veículos na União Europeia, como comprovam números do setor recentemente revelados.
No entanto, organizações ambientais denunciam que seu uso na realidade impulsiona o desmatamento e prejudica o meio ambiente ainda mais do que as fontes de energia fósseis, que veio para substituir.
Em 2014, quase a metade do óleo de palma usado na Europa abasteceu carros e caminhões, segundo dados compilados pela Federação das Indústrias de Óleo Vegetal e Oleaginosas da União Europeia (Fediol, na sigla em inglês) e obtidos pela ONG Transport & Environment (T&E), sediada em Bruxelas, em cooperação com a organização alemã de proteção à natureza Nabu.
Impacto devastador
Só perdendo para a canola, o óleo de palma é o segundo combustível renovável mais usado: entre 2010 e 2014 sua demanda mais do que quintuplicou. Os números mostram, além disso, que o crescimento de 34% do biodiesel – biocombustível misturado a diesel – no bloco se deveu inteiramente à importação de óleo de palma.
Em contrapartida, grandes plantações de palmeiras vêm tomando o lugar da floresta tropical nativa, sobretudo no sudeste da Ásia. O impacto é devastador tanto para a biodiversidade como para o balanço das emissões de gases causadores do efeito estufa. O desmatamento na Indonésia foi o maior do mundo em 2014. Na média, o biodiesel é atualmente 80% pior para o clima do que o diesel fóssil, acusa a T&E.
O óleo de palma provém da mesma planta de que se extrai o azeite de dendê, sendo também empregado na alimentação, cosméticos e ração animal. Nesses setores, porém, sua aplicação está em baixa, em parte devido à pressão de grupos ambientalistas sobre as grandes corporações.
Até agora não havia dados sobre a participação da palma na composição de produtos da UE. Segundo Jos Dings, diretor-executivo da T&E, as novas revelações “mostram a feia verdade sobre a política de biocombustíveis da Europa, que impulsiona o desmatamento, eleva as emissões por transportes e não ajuda em nada aos agricultores europeus”.
Biocombustíveis de segunda geração como resposta
Os argumentos a favor dos biocombustíveis pareciam convincentes: queimá-los liberaria a mesma quantidade de gás carbônico que as plantas absorvem do ar, resultando num saldo de emissões neutro.
Mas na realidade acontece o oposto: estudos demonstram que, considerando-se o desmatamento, o impacto climático global dos assim chamados “biocombustíveis de primeira geração” – gerados principalmente a partir de canola, palma, girassol e soja – é ainda maior do que o dos combustíveis fósseis.
Ainda por cima, essas plantações competem por território com o cultivo de alimentos, em especial na Indonésia e Malásia, responsáveis por 87% da produção mundial de óleo de palma.
Falando à DW, Daniel Rieger, especialista em política de transporte da Nabu, pleiteou que se abandone o biocombustível de primeira geração: “Não faz sentido usar grandes áreas para cultivar plantas e então abastecer veículos com elas. É um desperdício de natureza.”
Ele defende que se desvie o foco para os combustíveis de segunda geração, baseados em resíduos orgânicos. Melhor ainda seria substituir o modelo de transporte que privilegia carros e caminhões por formas mais sustentáveis, como navegação fluvial e trens, ressalta o ambientalista.
A percepção pública dos biocombustíveis também precisa mudar. Um problema está na denominação, que soa falsamente “verde”, critica Rieger: “As pessoas pensam: ‘Biocombustível soa orgânico, então tem que ser bom para o clima global.’”
Futuro questionável na UE
Após reconhecer que seguir usando essas variedades não combina com sua meta de cortar as emissões de gases-estufa, a UE impôs em 2015 um teto de 7% para biocombustíveis produzidos a partir de plantas alimentícias. O bloco também estabeleceu critérios de sustentabilidade, e o desenvolvimento do que denominou “biocombustíveis avançados”, usando lixo municipal, óleo de cozinha reciclado e resíduos da agricultura.
Em 2009, a UE estabeleceu como meta que, até 2020, 10% da energia para transportes em todos os seus países-membros provirá de fontes renováveis. O principal substituto do petróleo são os biocombustíveis, já que os veículos elétricos representam uma parcela ínfima do setor automobilístico.
A Transport & Environment e outras entidades ambientais pedem a exclusão das plantas comestíveis do mix energético da UE a partir de 2020. Enquanto isso, a Comissão Europeia debate novas políticas de energia renovável, devendo divulgar nos próximos meses uma proposta alternativa. Em seguida caberá a cada Estado-membro decidir como implementará a decisão sobre o futuro dos biocombustíveis.
Fonte: DW/Melanie Hall (tam) – Título original: Demanda europeia de biocombustível incentiva desmatamento