Belo Monte bate à sua porta


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Faz algum tempo que tenho enfrentado dificuldades para manter minhas contribuições ao Correio da Cidadania sobre os impactos sinistros da construção da hidrelétrica de Belo Monte. Depois de anos tratando dos impactos indiretos da obra sobre a cidade de Altamira, vi meus textos tornarem-se insuportavelmente repetitivos.

Por Rodolfo Salm.

Há anos sentimos os impactos indiretos da obra: a elevação generalizada dos preços de alimentos, dos serviços e dos alugueis; a pronunciada degradação da infraestrutura urbana; o caos e a violência no trânsito; e o aumento nos índices de criminalidade e no esgoto a céu aberto; o aumento na prostituição e no tráfico e consumo de drogas; o alcoolismo desenfreado dos operários da obra por toda parte na cidade; a degradação da saúde e da cultura dos povos indígenas.

Escrever sobre a inviabilidade econômica da obra também perdeu o sentido, uma vez que ela está praticamente pronta. Nunca é demais repetir que a energia hidrelétrica não é limpa, como se vê na fotografia ao lado, pois devasta ambiente e destrói vidas humanas, mas principalmente por que emite gases do efeito estufa em níveis alarmantes.

Porém, tudo isso foi e continua sendo solenemente ignorado. Também me parece um tanto quanto inútil tratar novamente de toda a corrupção associada a esta obra, das propinas locais ao nível federal, envolvendo as empreiteiras e as campanhas eleitorais, pois desde que o governo caiu em desgraça essas notícias aparecem todos os dias nos jornais.

Mas é sempre bom lembrar que os críticos de Belo Monte sabíamos e denunciávamos isso antes de todos, mesmo quando o governo da presidente surfava em alta popularidade.

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Agora, os impactos diretos da construção da hidrelétrica de Belo Monte são finalmente visíveis no entorno da cidade de Altamira. A mata que cobria a foz do igarapé Ambé, a pouco mais de cem metros de onde moro, em poucos dias foi convertida por um exército de tratores em um amontoado de troncos mortos, lama e raízes retorcidas. Não se vê sinal dos animais que havia ali, mas é impossível não pensar no que se passou com os ninhos de aves, os répteis, os anfíbios e os pequenos mamíferos. Para não falar nos peixes que habitavam suas águas outrora cristalinas, agora contaminadas pela lama podre da matéria orgânica em decomposição.

Nem mesmo as explosões no canteiro de obras que faziam tremer as janelas da minha casa causaram-me tanto mal-estar quanto a destruição completa daquele ecossistema, pois passado o impacto momentâneo delas, retornava à ilusão da normalidade.

De toda forma, a devastação da foz do igarapé Ambé não é nada comparado ao desmatamento da ilha do Arapujá, cuja vegetação constituí importante “cartão postal” no rio Xingu, de frente à cidade, e que deve começar a qualquer momento.

Fotos: Rodolfo Salm

Fonte: Correio da Cidadania

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