Bancada Ruralista defende interesse internacional em biocombustíveis

Por Nuno Nunes.

Os ataques que os povos indígenas e quilombolas do Brasil têm sofrido, com ameaças a mudanças da Constituição Federal quanto aos critérios para demarcação das terras, judicialização de processos para emperrar trabalho da FUNAI e INCRA, é remetido sempre à Bancada Ruralista do Congresso Nacional, que atua em defesa dos interesses dos proprietários rurais. A Bancada é composta por partidos como DEM, PSD, PR, PP, PTB, PSDB, PPS, PMDB, PSB, PSC, PDT, PMN, e outros menores.

Porém, estes deputados e senadores, que ficaram assustados em abril de 2013, quando indígenas ocuparam o plenário da Câmara para impedir mais um ataque: a transferência da prerrogativa de demarcações de terras da FUNAI/MJ para o Legislativo. Mas no segundo semestre, os ataques se qualificaram, com a proposta acordada com o governo, que consiste na regulamentação do§ 6º do artigo 231 da Constituição Federal, que cria regras claras ao definir os bens de “relevante interesse público” da União para fins de demarcação de TIs.

Perguntemo-nos: o que interessa aos proprietários rurais dizer o que serão áreas de relevante interesse público? À primeira vista funcionaria assim, quando a FUNAI delimitar uma certa área como indígena, o possível produtor rural que vive dentro dela e porventura comprou do governo estadual o título da área há décadas, não precisará mais dizer que ali nunca existiram indígenas, mas agora dirá: mas eu planto o alimento que a nação consome, se me tirarem daqui, o Brasil passará fome. Em nome disto, os deputados e senadores defendem os heróis da nação que alimentam a todos, e inclusive, têm suas campanhas eleitorais financiadas por estes proprietários rurais, correto? Errado, completamente errado!

O que acontece é que tanto indígenas quanto proprietários rurais estão sendo manipulados pelo mercado financeiro e seus investidores internacionais pelo sistema de financeirização do mercado de futuro dos commodities. Mas o que é isso?

Bem, aí é que vem aquele papo que todo mundo já tá cansado: o capitalismo. Porém, neste caso, ele vem acompanhado de várias outras frentes, as quais vamos estudar agora.

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Vejamos numa alegoria. Vamos supor que a raposa quer comer os ovos das galinhas que estão soltas no quintal do fazendeiro, porém a regra diz que raposas não podem entrar com mais de 50% do seu corpo além da cerca, a fronteira do terreno. A raposa contrata uma ave de rapina, o famoso urubu, oferecendo-lhe uma parte dos ovos caso ajude nos negócios. O urubu aceita e pula a cerca, percorre entre as galinhas e oferece a elas milho para que comam, gratuitamente. Elas deixam de ciscar, correr atrás de minhocas e viciam-se no milho transgênico do urubu/raposa, que as faz colocar mais ovos por dia e ter a impressão que vivem melhor assim. Os ovos são levados pelo urubu gratuitamente, pois ele afinal deu às galinhas um novo milho que as fez colocar mais ovos, como se isto fosse ótimo. O urubu entrega os ovos à raposa ficando com algumas dúzias para se sustentar. Com o milho oferecido em seu bico, as galinhas deixam de ciscar e buscar novos lugares para pegar minhocas, e fixam-se. O urubu organiza esta fixação colocando uma ao lado da outra desenhando uma linha divisória no chão e diz: agora você não pode sair deste quadrado.

A raposa ganha muitos ovos e chama seus amigos para entrarem no sistema que utiliza o urubu como intermediário. Os amigos raposa atraem novos urubus e pedem que atraiam novas galinhas e dividam-nas em quadrados para que elas produzam ovos. Assim, surge o interesse mutuo. O urubu passa a preparar novos locais com linhas no chão e diz às raposas: vejam, aqui vou colocar mais 10 galinhas, você quer investir aqui, vamos assinar um contrato? O contrato é simples: me dê 10 ovos agora por cada quadrado vazio, que ano que vem terei galinhas interessadas no quadrado que colocarão 30 ovos. As raposas se interessam e formam uma parceria, porém isto chama atenção do fazendeiro, que até então está preocupado com que a raposa não entre em seu quintal, mas percebe que as galinhas estão estranhamento dispostas pelo chão em seus quadrados, porém algumas galinhas não aceitam permanecer daquele modo e cacarejam, reivindicam seu modo tradicional de vida, ciscando com suas próprias forças. O fazendeiro então ajuda as galinhas tradicionais, apagando os quadrados no chão e garantindo que as galinhas andem conjuntamente.

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O urubu, assim, se vê ameaçado, pois havia conseguido provar às raposas que o sistema funcionava sob seu comando, e que as galinhas iriam se interessar em novos quadrados, e para isso recebia adiantado das raposas o pagamento em ovos. Desesperado, o urubu conversa com as raposas e abre o jogo: estou falindo, meus quadrados perderam o valor. As raposas imediatamente se solidarizam e prestam seu conhecimento: que nada, urubu, o negócio vai de vento em popa, apenas selecione algumas galinhas e diga para as galinhas cacarejarem bem forte na frente do fazendeiro, dizendo que todas as galinhas estarão ameaçadas e o milho acabará caso não pare de interferir no quintal!

Assim acontece hoje no Brasil. As raposas são só mega investidores internacionais, como o JP Morgan, George Soros, que contratam urubus brasileiros para criarem empresas, tendo estes 50%, enquanto os estrangeiros ficam por trás “investindo”. A lei permite a estrangeiros comprar terras, apenas sendo sócios com menos de 50%. Deste modo, os brasileiros urubus compram terras e garantem que o espaço estrangeiro no mercado agropecuário brasileiro. O fazendeiro é o governo que monitora a entrada de estrangeiros. As galinhas são agricultores que trabalham a terra e garantem o consumo de sementes estrangeiras, pois este negócio foi permitido no país com a autorização aos transgênicos.

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Os urubus são SLC Agrícola (http://www.slcagricola.com.br), Brasil Agro (http://www.brasil-agro.com), entre outras, que atuam no mercado de futuros na bolsas de valores, colocando suas fazendas adquiridas com capital nacional, que atraem investimentos estrangeiros com a venda de ações, e se revertem em mais capital usado para adquirir mais fazendas que reiniciam o ciclo de enriquecimento em parceria.

Postal Brasil Agro

Quando o urubu prepara novos quadrados, está dizendo aos investidores que há mais terras para receber recursos no futuro, e aí que entram as galinhas que não aceitam esta lógica e chamam atenção do fazendeiro. Áreas agricultáveis para o futuro, previstas para receberem investimentos das raposas e urubus, tem sido apontadas como Terras Indígenas e Quilombolas pelo fazendeiro, a União. Com medo de perderem investimentos futuros, empresas nacionais a mando do capital especulativo internacional montam um aparato de galinhas cacarejantes, financiando campanhas eleitorais (Ver “Autores do PLP 227 são financiados por empresas beneficiadas pelo teor do projeto” em http://www.brasildefato.com.br/node/14479) para o legislativo nacional e estaduais, que falam sem parar às demais galinhas enquadradas sob “ameaças aos seus quadrados”, que o “fazendeiro usa de interesses escusos para refazer novos quadrados” “não respeita a propriedade privada”. Isso tudo ocorre, sendo que tais galinhas enquadradas podem ser realocadas, indenizadas por suas benfeitorias, tudo dentro da lei, mas assustadas, são levadas pelos gritos que vêm de Brasília, mais especificamente do local em que um grande ovo de concreto foi dividido, uma parte ao Senado e outra à Câmara dos Deputados.

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Com toda a gritaria, urubus menores, os advogados, se especializam em direitos indígenas e quilombolas, direito agrário e do agronegócio, buscando lucrar alguns ovos com a confusão, são contratados para colocarem argumentos jurídicos nos cacarejos, e emperrar tudo na justiça. Mas alguém tem que pagar para os advogados, e aí que os agricultores são mais uma vez enganados, pois juntam recursos para pagar aos defensores da causa que nunca será ganha. Isto ocorreu em Santa Catarina, dia 12 de setembro de 2013, quando a Comissão de Direito Agrário da OAB/SC convidou FUNAI e INCRA para participar de um Fórum sobre demarcação de terras indígenas e quilombolas, apoiado pelo Deputado Valdir Colatto, da Bancada Ruralista, com intuito de angariar clientes agricultores e buscar informações para finalizar um parecer à CPI Contra FUNAI e INCRA. O Fórum foi encerrado por protestos de indígenas, quilombolas e professores da UFSC que não concordaram com o evento, que se utilizava do II Congresso Internacional sobre Direito Agrário. Inclusive a Doutora Thaís Colaço foi agredida pela Secretária do Sindicato dos Agricultores de SC.

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Este mês, em mais uma tentativa de garantir os investimentos internacionais, apareceu a grande raposa por trás de tudo: o mercado de energia (Ver Deputados e ministros buscam solução para crise nas demarcações indígenas).

O Projeto de regulamentação do§ 6º do artigo 231 da Constituição Federal, apresentado em nome do ex-presidente da FUNAI no fim da ditadura militar, atual Senador Romero Jucá e ex-líder do governo no Senado, aponta em seu Art. 3º, inciso V, que as áreas de relevante interesse público da União, são as concessionadas, permitidas ou autorizadas relativas à exploração de lavras, de petróleo e gás, de potenciais energéticos, incluídos as linhas de transmissão, as áreas de portos, aeroportos e estradas federais.

O que temos aqui? Simples. O Brasil não vive um “problema agrário” pois há terras para realocação de agricultores que serão indenizados para saírem de Terras Indígenas e Quilombolas. O que vivemos é mais uma competição por controle de energia. O potencial energético nacional para Usinas Hidrelétricas já estão previstas pelo Brasil desde a ditadura militar, o que tem-se tentado agora é instalá-las, regulamentando leis que ainda faltam, como a consulta, prevista pela Convenção 169/OIT. Toda esta energia hidrelétrica não pode ser exportada para a China, Índia, EUA, por exemplo, servindo apenas ao Brasil e no máximo países vizinhos. O que temos então se trata de tentativa de intervenção internacional na energia que o país pode exportar, e tem feito isso.

Os canaviais do cerrado que antes geravam açúcar, agora geram biocombustível. A soja que antes alimentavam humanos e animais, agora geram biocombustível, como o milho e outros. O que vivemos, então, para além dos investimentos de raposas para aquisição de terras no país, é o desfarçado interesse no controle de áreas produtivas de energia da biomassa. Tais áreas, nas mãos da União, colocam em atenção nossos vizinhos do norte que controlam o Federal Reserve e emitem dóllares criando crises pelo mundo, as tais famílias da elite global: os Quatro Cavaleiros do Sistema Bancário (Bank of America, JP Morgan Chase, Citigroup e Wells Fargo) possuem os Quatro Cavaleiros do Petróleo (Exxon Mobil, Royal Dutch / Shell, BP Amoco e Chevron Texaco), em conjunto com o Deutsche Bank, o BNP, o Barclays e outros gigantes do velho dinheiro europeu. Mas o seu monopólio sobre a economia global não termina na borda da mancha de óleo. Eles estão na Raizen com a Shell (http://www.raizen.com.br/pt-br/a-raizen/quem-somos), Brasil Agro com JP Morgan, e ainda Elie Horn, braço de George Soros no Brasil (ver http://www.brasil-agro.com/brasilagro2011/web/conteudo_pt.asp?idioma=0&conta=28&tipo=36819), entre outros e odeiam quem os ameace, e como dizia Bautista Vidal, um dos criadores do próalcool, são “sórdidos e canalhas” que não deixam outros se desenvolverem se não sob seus controle.

Estes bancos internacionais estão por trás do sistema do agronegócio, investindo em aquisição de terras propícias à geração de biocombustíveis por meio de laranjas na América do Sul (ver Soros na Argentina em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi0210200737.htm), de olho no controle da tecnologia desenvolvida pela Brasil, por brasileiros como Bautista Vidal, pela Petrobrás, pelas universidades federais. Esta é a guerra que indígenas e quilombolas enfrentam no Brasil e, por isso, ocupar o Congresso não é mais o fim da tática, mas ocupar a bolsa de valores e denunciar este sistema é o começo da solução.

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