Na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) deste ano, dentre os 5 cinco livros mais vendidos estão 4 autores negros e 1 indígena. O que pode parecer apenas uma estatística de ranking, na verdade transmite algo importante que é o interesse particular, em meio ao bolsonarismo, de uma literatura anti-racista que desperta a paixão pela leitura de milhares de jovens e trabalhadores negros sobre temas da identidade negra, das lutas anti-racistas, do genocídio de povos do continente africano, do próprio continente africano nos dias atuais, do orgulho racial, entre outros temas.
Por Silvia Shakur
O livro mais vendido na Flip foi o da escritora portuguesa Grada Kilomba “Memórias da Plantação – Episódios de Racismo Cotidiano”, além desse estão os livros da escritora nigeriana Ayobami Adebayo, do angolano Kalaf Epalanga, do burundiano Gael Faye, da Djamila Ribeiro e do indígena Ailton Krenak.
Num cenário nacional onde Bolsonaro representa uma ameaça a vida dos negros com seus discursos racistas, colocando inclusive em questionamento as bases ideológicas forjadas pela burguesia brasileira de que não há racismo no Brasil através da democracia racial, o interesse desses jovens e trabalhadores por livros que debatem a questão racial é um fenômeno progressista.
Espaços onde temas como a questão racial e as lutas anti-racistas são ensinados e debatidos também estão na mira do governo racista e reacionário de Bolsonaro. Wintraub, por exemplo, fanático adorador de Olavo de Carvalho assim como o presidente, quando anunciou os cortes das universidades federais colocou em cheque a existência desse tipo de conhecimento nas universidades. Lá não apenas os jovens podem ter contato com esses livros e autores mais vendidos da Flip, mas também com outras obras de militantes e intelectuais que dedicaram suas vidas com um empenho irresoluto ao combate ao racismo e à exploração capitalista.
O interesse expressivo por esses autores e seus temas é por um lado a dimensão progressista da reinvindicação da identidade negra frente ao bolsonarismo e seu projeto racista de país, e por outro uma expressão distorcida de como negros e negras que se colocam contra bolsonaro e seus aliados olavistas podem de fato combater ataques como a reforma da previdência e o pacote anti-crime de Moro.
Ainda sim, não podemos enxerga de outra forma que não seja positiva para esse fenômeno, que frente a um projeto de precarização da vida de milhões negros e de intensificação dos assassinatos pela polícia cotidianamente, há um juventude negra que prefere ler e apreender com uma literatura anti-racista frente ao “guru” Olavo de Carvalho, que rechaça o racismo, o machismo e a LBGTfobia de Bolsonaro e que vêm sendo um pólo de enfrentamento ao bolsonarismo e seu projeto de país racista.