Uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) em Guarujá, no litoral sul de São Paulo, foi alvo de vandalismo nesta quinta-feira (8). Os criminosos, que ainda não foram identificados, destruíram parte do encanamento da rede de oxigênio utilizada no tratamento de pessoas contaminadas pelo novo coronavírus. A ação colocou em risco ao menos 18 pacientes. Uma parte teve que ser transferida para outras unidades. Outros precisaram de cilindros de oxigênio para manter a assistência respiratória.
De acordo com o médico sanitarista e ex-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) Gonzalo Vecina Neto, os autores dessa ação, assim como os “negacionistas” da pandemia, são “facínoras” que abusam da impunidade.
“Os negacionistas são muito poucos. Mas fazem muito barulho. São como esses facínoras, assassinos, que foram destruir a rede de oxigênio da UPA do Guarujá. São absoluta minoria, só que eles têm a sensação da impunidade”, afirmou Vecina a Marilu Cabañas, em entrevista ao Jornal Brasil Atual desta sexta (9). “Nossa sociedade tem que distribuir justiça e diminuir a impunidade. Esses facínoras têm que ser encontrados e punidos”, acrescentou.
Privatização das vacinas
“Facínoras” também foi o adjetivo utilizado por Vecina para classificar os “ricos” que apoiam o projeto de lei aprovado nesta semana pela Câmara dos Deputados que prevê a possibilidade de compra das vacinas por empresas privadas. De acordo com o especialista, o fura-fila das vacinas vai permitir que pessoas sejam imunizadas antes daquelas pertencentes aos grupos de risco, que têm maiores chances de desenvolver a forma grave da doença.
“É uma coisa animal, de uma ferocidade terrível, essa ânsia dos ricos sobre a população brasileira. Vai criar uma situação que beneficia exclusivamente os ricos, em detrimento de toda a população. Isso tem que ser denunciado”, declarou o sanitarista.
CPI da Pandemia
O ex-diretor da Anvisa também comentou a decisão do ministro Luis Roberto Barroso, que concedeu liminar nesta quinta obrigando o Senado a instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) a fim de apurar eventuais omissões do governo de Jair Bolsonaro no enfrentamento da pandemia. Vecina prevê que a CPI não deve “acabar em pizza, nem em impeachment”. Ainda assim, é uma ferramenta política importante para expor a “situação dramática” que o país está vivendo.
“Temos mais de 4 mil mortos por dia. E não estamos tendo a adoção de medidas tão fundamentais, como o lockdown. Estamos deixando faltar medicamentos para intubação, que poderíamos estar comprando. Estamos deixando faltar oxigênio no país inteiro. E quem é esse ‘estamos’? É o presidente desta república. É o governo federal que está fazendo tudo isso. Isso tem que ser exposto”, criticou Vecina. “Acho que não terminará em pizza, nem terminará em impeachment. Mas colocará mais alguns pregos nesse caixão”, acrescentou.
Vecina também classificou como “muito irresponsável” que questões relativas à saúde pública, como a proibição da realização de cultos presenciais durante a pandemia, tenham sido contaminadas por visões religiosas extremistas. O advogado-geral da União, André Mendonça, durante julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a questão, chegou a dizer que “os religiosos estão a morrer pela liberdade”.
“O direito ao culto religioso é fundamental numa democracia. Só que antes vem o direito à vida. Sem o direito à vida, os outros direitos não servem para absolutamente nada. E como é que se garante o direito à vida? Não se aglomerando em locais fechados, como são as igrejas. É tão natural, tão obviamente compreensível para qualquer um, que me sinto um idiota de ter que repetir uma coisa dessas”, desabafou o sanitarista.