Há dois anos tive a oportunidade de passar 3 dias com Julian Assange, na casa de campo inglesa onde ele cumpriu sua prisão domiciliar, para fazer a matéria de capa da revista Trip de maio de 2011 – fui redator-chefe da revista até janeiro passado. Nas salas espaçosas e nos quartos, a mobília de época convivia com dezenas de laptops, cabos e enormes HD externos. Na porta da geladeira da cozinha no casarão do século XVIII, um imã gritava solitário: “Free Bradley Manning”.
Nas longas conversas com o australiano criador do WikiLeaks, o nome do soldado era aparecia com frequência. Em um trecho inédito da entrevista reproduzido a seguir, Assange afirma que são duas as intenções do governo estadunidense ao coagir o jovem militar responsável pelo vazamento de 250 mil cables, como são chamados os comunicados das embaixadas estadunidenses à Casa Branca. A ação do jovem Manning em 2010, então com 22 anos, expôs ao mundo a forma como os EUA enxergam e se relacionam com o mundo. Manning começou a ser julgado na segunda-feira 3 de junho. Mas vale recuperar as palavras de Assange sobre o que ele acredita serem as motivações para sua detenção pelo governo estadunidense:
“Primeiro, Manning foi preso e está mantido nestas condições sombrias, em uma solitária, para que ceda. Querem que ele faça uma confissão, que diga que deu documentos para nós e, mais, que conspiramos junto com ele para conseguir tais documentos. Dessa forma eles ganhariam um argumento para indiciar-nos por conspiração e espionagem. Querem obrigá-lo a fazer uma confissão falsa que leve a esse tipo de conexão”.
O criador do WikiLeaks continua, com sua calma habitual: “Em segundo lugar estão fazendo isso com Manning para não perderem o controle sobre os militares. Eles se preocupam com a existência de um soldado que não seguiu as ordens. Mas Bradley viu violações de direitos humanos dentro do aparato militar dos EUA e causou tremendo constrangimento para o exército americano ao entregar esse material para a imprensa. E, claro, não querem passar a ideia de que generais não conseguem manter o controle sobre os soldados. Usando-o como exemplo, outros soldados vão ficar em seus lugares e cumprir suas tarefas. Dar à imprensa material como esse iria conter as práticas abusivas do exército americano, e esse é um ponto-chave das forças armadas daquele país”.
Fonte: Carta Capital