Quando Eduardo Galeano escreveu “As Veias Abertas da América Latina” em 1971, ele desnudou as cicatrizes deixadas pela exploração colonial e imperialista. Hoje, quase cinco décadas depois, essas veias continuam abertas, e o sangue que corre é de uma luta contínua por justiça e equidade.
A América Latina, rica em recursos naturais, ainda vê suas riquezas fluírem para fora de suas fronteiras, enquanto muitos de seus habitantes vivem na pobreza. A mineração, a exploração de petróleo e a agricultura em larga escala continuam a beneficiar corporações estrangeiras e elites locais, deixando pouco para as comunidades que habitam essas terras.
O que Galeano chamou de “saque contínuo” persiste sob novas roupagens. A dívida externa, os acordos comerciais desiguais e as políticas de austeridade impostas por organismos internacionais são o novo rosto do colonialismo. Países inteiros continuam subjugados por forças econômicas que perpetuam a desigualdade e a dependência.
Nos dias de hoje, as redes sociais desempenham um papel crucial no controle da informação. Plataformas como Facebook, Twitter e Instagram moldam a percepção pública, muitas vezes limitando o acesso a informações críticas e promovendo narrativas que servem a interesses específicos. A manipulação de algoritmos e a disseminação de fake news são ferramentas poderosas que mantêm o povo desinformado e distraído.
A Venezuela, um país rico em petróleo, enfrenta uma crise humanitária sem precedentes. A hiperinflação, a escassez de alimentos e medicamentos, e a repressão política têm levado milhões de venezuelanos a buscar refúgio em países vizinhos. A situação é um lembrete doloroso de como a riqueza natural pode ser tanto uma bênção quanto uma maldição.
Em contraste, o Uruguai sob a liderança de Pepe Mujica mostrou que é possível seguir um caminho diferente. Conhecido como “o presidente mais pobre do mundo”, Mujica implementou políticas progressistas que melhoraram a qualidade de vida dos uruguaios. Sua abordagem humilde e focada no bem-estar social é um exemplo inspirador para toda a América Latina.
No Brasil, os governos de Lula e Dilma Rousseff trouxeram avanços significativos em áreas como educação, saúde e redução da pobreza. Programas como o Bolsa Família ajudaram milhões de brasileiros a sair da miséria. No entanto, esses progressos foram acompanhados por desafios políticos e econômicos que continuam a influenciar o cenário atual.
A Bolívia, sob a liderança de Evo Morales, experimentou avanços notáveis em termos de inclusão social e direitos indígenas. No entanto, o país também enfrentou desafios significativos, incluindo tensões políticas e econômicas. As brigas entre direita e esquerda transformaram o povo em marionetes, manipulados por interesses políticos que muitas vezes ignoram as necessidades reais da população.
A história da América Latina também é marcada por tragédias e perdas irreparáveis. A morte do poeta chileno Pablo Neruda, poucos dias após o golpe militar de 1973, é um símbolo da repressão brutal que tomou conta do Chile. A suspeita de que Neruda foi assassinado pelos militares apenas intensifica o sentimento de injustiça que permeia a história do continente.
Assim como no passado, a resistência floresce. Movimentos sociais e indígenas têm se levantado para defender seus direitos e suas terras. As mobilizações no Brasil contra a mineração ilegal na Amazônia, os protestos na Bolívia pela recuperação do controle sobre seus recursos naturais são exemplos de um continente que não se rende.
Hoje, mais do que nunca, a voz do povo ecoa nas ruas, exigindo mudanças profundas. Galeano sempre acreditou na força das histórias contadas por aqueles que vivenciam a opressão. E são essas histórias que continuam a alimentar a chama da luta por uma América Latina mais justa e igualitária.
“As Veias Abertas da América Latina” não é apenas um relato do passado, mas um chamado à ação. É um lembrete de que a história não terminou, e que as lutas de ontem são as lutas de hoje. E enquanto houver injustiça, haverá aqueles que, inspirados pelas palavras de Galeano, continuarão a lutar por um futuro diferente. Se Galeano estivesse vivo, talvez escrevesse um novo livro intitulado: “As Feridas Incuráveis da América Latina”.
Laelio Inacio é jornalista pcd.
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