Por Mariama Correia, Agência Pública.
Em São Carlos, eu tenho uma pessoa que amo muito e que tem uma preocupação muito grande com a proteção da infância”, diz a ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos (MDH), Damares Alves, em vídeo publicado na página do Facebook de Thais Bertolote (PL), candidata à vereadora em São Carlos (SP). E acrescenta, endossando sua campanha: “Vamos juntas, Thais, mudar a realidade neste país”.
Uma das figuras centrais no atual governo, a ministra Damares é cabo eleitoral disputada este ano. Com a popularidade em alta e vista como o trunfo de Bolsonaro para as eleições de 2022 – seu nome está sendo apontado como um dos favoritos para a vice-presidência –, ela é hoje a principal guardiã das pautas morais no governo, que garantem o apoio do eleitorado conservador. E, embora declarações diretas de apoio a candidatas – ou amigas, como ela diz nos vídeos – sejam mais raras, nos bastidores Damares articula, desde o ano passado, o apoio de lideranças políticas e religiosas para estimular candidaturas femininas.
A ministra disse ter como meta colocar “pelo menos uma mulher” nas câmaras de vereadores de cada município brasileiro (nas eleições de 2016, as mulheres conquistaram apenas 13% das vagas) e lançou o “Maratona + Mulheres na política”, um curso para estimular candidaturas. A iniciativa é suprapartidária e sem filtro religioso, segundo MDH, que não divulgou o perfil das participantes.
Ainda assim, a investida da ministra vem sendo interpretada por críticos do governo como uma forma de atrair mais religiosas conservadoras para a política partidária. E, de fato, esta já é a eleição municipal com mais candidatas com cargo religioso desde 2008. Segundo a Justiça Eleitoral, entre os postulantes que se declararam profissionais da religião, majoritariamente vinculados a partidos de direita, como mostramos em outra reportagem, 193 são mulheres. Considerando apenas o nome de urna das candidatas, a palavra “irmã” aparece 1.159 vezes entre as 186.144 postulantes.
Sucesso no campo conservador
“Damares é uma articuladora do voto feminino evangélico”, considera a antropóloga Jacqueline Teixeira, que pesquisa questões de gênero entre os evangélicos. Ela observou que a trajetória de sucesso no campo conservador, historicamente dominado por homens, fez dela inspiração para muitas candidatas do segmento, que reverenciam a ministra nas redes sociais e replicam sua cartilha política para conquistar o eleitorado.
Contar com o apoio de Damares é uma chancela política digna de slogan de campanha, como fez Maely Benedetti, candidata a vereadora em Tucumã (PA) pelo PSC. “Apoio total da ministra”, ostenta na imagem de capa de sua fanpage. A foto mostra Damares sorridente apontando para a candidata, que retribui com o mesmo gesto.
“Apresentei meus projetos na área de educação infantil em audiência com a ministra, em Brasília”, disse Maely à reportagem, em entrevista pelo WhatsApp. Uma dessas iniciativas seria criar um ambiente de acesso à internet para estudantes de Tucumã. A candidata estreou na política este ano defendendo a tríade família, igualdade e justiça em uma campanha bastante movimentada nas redes sociais.
No Facebook, Maely tem uma verdadeira coleção de fotos ao lado da ministra. Em um dos posts, afirma que Damares prometeu “equipar o conselho tutelar de Tucumã”, mas não deu mais detalhes à reportagem sobre declaração. Recentemente Damares foi acusada de usar o Conselho Tutelar de São Mateus (ES) e a própria estrutura ministerial para interferir no aborto legal de uma menina de 10 anos, vítima de estupro no Espírito Santo.