As aventuras golpistas da direita brasileira

Por Emir Sader.

 

O golpe de 1932 – que até hoje a direita chama de “revolução”, quando era uma tentativa de contrarrevolução – foi uma aventura para retornar ao sistema político em que as oligarquias controlavam tudo e não cediam nenhum direito ao povo. Voltar à economia primário exportadora, que tinha levado o país à pior crise da sua história. Voltar ao império de governantes como Washington Luis, para quem “a questão social é questão de polícia”. Tentaram o golpe em nome da “democracia”, como sempre, mas seu objetivo era o mais retrógrado possível, a restauração do regime de maior exclusão social e o menos democrático possível.

Foi uma aventura militar golpista, que mobilizou as elites e a classe média de São Paulo, liderada pela família Mesquita, até que foi derrotada pelas forças do Getúlio, apoiada pelos setores que começavam a ser beneficiados pela nova política econômica e social. Até hoje a direita chora aquela derrota, que era apenas o prenúncio de tantas outras posteriores.

Desde que o Getúlio voltou à presidência, a direita delegou aos militares a tarefa de solapar o poder legitimamente eleito. Sempre em nome da defesa da “democracia”, que estaria em perigo, segundo a Doutrina de Segurança Nacional – ideologia da direita na época da “guerra fria”-, foram tentados vários golpes, contra o Getúlio, contra o JK e contra o Jango. Antes dele dar certo, em 1964, houve uma outra aventura direitista, com Jânio Quadros, que foi a forma de desbancar a coalizão getulista. Embora pela vida eleitoral, não deixou de ser uma aventura, como o próprio destino prematuro do Jânio confirmou.

O golpe de 1964 foi um assalto ao Estado por parte das FFAA, para desalojar um governo democrático e impor um governo militar, que promoveu as políticas do grande capital nacional e internacional, alinhado às políticas dos EUA. Foi o governo mais brutal na sua sanha antipopular e antidemocrática, que uniu a toda a direita e a todo o grande empresariado.

A direita voltou ao governo com os governos neoliberais de Fernando Collor e de FHC. Foram vitorias eleitorais, mas não deixaram de ser aventuras, pelo que representaram de dilapidação do patrimônio público, de exclusão dos direitos da massa da população, de concentração de renda, de rebaixamento da imagem externa do país. Deixaram um país menor, mais injusto, com mais estagnação econômica, com um Estado pequeno, com uma projeção internacional ínfima.

A direita voltou a perder o controle do Estado com sua derrota eleitoral de 2002 e viu se confirmar essa situação nas sucessivas derrotas de 2006, 2010 e 2014. O golpe de 2016 foi uma nova aventura, em que o objetivo era tirar o PT do governo e restaurar o modelo neoliberal.

Uma nova aventura, em primeiro lugar porque teve que romper com a vontade popular, expressa democraticamente na reeleição da Dilma, além de impor um modelo não apenas rejeitado quatro vezes nas urnas, como fracassado aqui mesmo e esgotado em todos os lugares. Submete o país a essa aventura, porque não dispõe de outro projeto que não o da adequação ao neoliberalismo, ao capital financeiro e à globalização.

Para isso, destroem a estrutura produtiva da economia, a infra-estrutura, a capacidade de pesquisa, a educação e a saúde públicas, o próprio Estado, para favorecer a centralidade do mercado e sua vértebra – a especulação financeira. É uma nova aventura, que submete o país a um retrocesso nunca vivido anteriormente, em tão curto espaço de tempo.

E tratam de destruir todas as lideranças políticas com apoio popular, para que governe o mercado, através de algum personagem pífio, que não moleste os interesses do capital financeiro. Confessam assim que já não têm nada a propor positivamente ao país – salvo sua destruição como nação – e nenhuma liderança política que os represente. Tem que se representar através do poder do capital financeiro, das manipulações midiáticas e dos atropelos da Judiciário.

A direita fracassou e representa os interesses da ínfima minoria que vive de renda, da sonegação, dos subsídios governamentais, da fuga de capitais, da recessão, do desemprego, da paralisação produtiva do país, da liquidação da legitimidade as instituições. Se jogou numa nova aventura, da qual não sabe como sair. Enquanto isso, destrói o que o país tem de melhor, de mais democrático, de mais representativo, de mais legítimo.

 Emir Sader é sociólogo.

Fonte: Brasil 247

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