Quem ganha menos paga mais imposto no Brasil e isso é resultado da falta de um sistema tributário justo. No artigo a seguir, o economista do Dieese/SC, José Álvaro Cardoso de Lima Cardoso, fala sobre a necessidade da progressividade na tributação. Estudo do Departamento Intersindical constatou que, entre janeiro de 1996 e dezembro de 2016, a defasagem acumulada na tabela de cálculo do Imposto de Renda é de 83,10% .
*Por José Álvaro Cardoso de Lima Cardoso
Um dos instrumentos de alocação dos recursos e distribuição de renda mais eficientes em qualquer sociedade é uma adequada política tributária. Esta deve ter várias virtudes, sendo que uma das mais importantes é a progressividade, ou seja, o princípio que define que deve pagar mais impostos aqueles que dispõem de mais recursos, ou seja os mais ricos. Segundo definição da cartilha A Progressividade na Tributação Brasileira: por maior justiça tributária e fiscal, elaborada pelo DIEESE em parceria com o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil – Sindifisco Nacional e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), um tributo é progressivo quando tem mais de uma alíquota e elas incidem de forma crescente, conforme aumenta a base de cálculo ou faixa de renda.
Impostos indiretos, como o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) e o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), ao não considerarem as diferenças de renda entre os cidadãos, são menos eficientes em realizar o princípio da progressividade, uma vez que incidem sobre o consumo. Já os impostos diretos – ou seja, os tributos cujos contribuintes são os mesmos indivíduos que arcam com o ônus da respectiva contribuição – tendem a alcançar níveis de progressividade maiores, como é o caso do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF).
Nesse contexto, o debate sobre o IRPF, em especial sobre a forma de correção da tabela de incidência do imposto, é de suma importância para a reorganização do sistema tributário brasileiro em bases mais justas. Na medida em que a tabela do imposto de renda sempre tem variado em proporção inferior ao verificado nos salários ou mesmo da inflação, ocorre uma corrosão dos rendimentos dos trabalhadores em termos reais, já que o imposto de renda aumenta cada vez mais sua tributação nos salários devido à defasagem da correção das faixas. Na Nota Técnica que embasa este artigo, o DIEESE constatou que a defasagem acumulada na tabela de cálculo do Imposto de Renda é de 83,10% (referência utilizada foi o IPCA-IBGE), entre janeiro de 1996 e dezembro de 2016. Se o período considerado for de janeiro de 2003 a dezembro de 2016, a defasagem é de 31,24%. Isso significa que o trabalhador assalariado, além de pagar muito imposto em decorrência do aspecto regresso do sistema, paga também montantes elevados de imposto de renda em função da defasagem da tabela.
A correção da tabela do IRPF é fundamental para garantir maior justiça tributária, porém ela não é suficiente. O princípio da capacidade contributiva estabelece a isonomia entre os diferentes rendimentos, tratando diferentemente os desiguais, portanto, além da correção da tabela, esse princípio também deve estar representado em uma estrutura de alíquotas mais adequada. Entre 1976 a 1978, o Brasil tinha 16 faixas, garantindo maior progressividade e maior justiça tributária. Em um período mais recente, de 1983 a 1985, a tabela era composta por 13 faixas. Somente em 2009 a tabela apresentou nova mudança, com cinco faixas. Tais mudanças significaram uma grande injustiça tributária, pois, além de reduzir o número de faixas, reduziu a alíquota máxima (de 60% para 27,5%) que incidia sobre aqueles que possuem maior capacidade contributiva, ou seja, os mais ricos.
Nesse sentido, a reivindicação mais premente dos trabalhadores assalariados, no que se refere ao pagamento do imposto de renda é a correção anual da tabela atual pela inflação, como forma de manter a estrutura de contribuição dos assalariados para o fisco e, em seguida, a criação de uma nova estrutura de tributação que contemple novas faixas de rendimentos. Obviamente as mudanças visando uma maior justiça tributária no Brasil passa por outras propostas fundamentais como: adoção do imposto sobre grandes fortunas (IGF); aumento do imposto sobre doações e grandes heranças; tributação sobre lucros e dividendos; e diminuição da carga tributária sobre bens e produtos de consumo popular. Mas propostas desse tipo, que significam um avanço significativo nos aspectos da justiça tributária e da distribuição de renda, são verdadeiro luxo neste momento onde os trabalhadores sofrem o maior ataque da história já verificado no Brasil.
Economista no Dieese/SC*.
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