Arte e política são meio e fim para associação em prol da cidadania LGBT

Cataz2 - CopyConfira a entrevista com o Grupo ACONTECE, que será fundado dia 22

Por Larissa Cabral para Desacato.info

Buscar o reconhecimento das diferenças de cada ser humano e respeitá-las é o que une diversas minorias marginalizadas e oprimidas no Brasil, vítimas do preconceito e do conservadorismo tão presentes na nossa cultura. A luta pela cidadania LGBT – cidadania de modo geral, eu diria – é um desafio cotidiano e um novo grupo está se formando em Florianópolis para provocar transformação social, buscando a construção de uma sociedade mais democrática.

O Grupo ACONTECE – Arte e Política LGBT, associação que será fundada no dia 22, pretende defender e promover por meio da política, arte e cultura o direito à liberdade da orientação sexual de LGBT e a cidadania das minorias, com base nos princípios fundamentais dos Direitos Humanos. Em entrevista ao portal Desacato.info, o grupo também falou sobre a omissão em relação à Comissão de Direitos Humanos e Minorias, sobre o trabalho bem feito da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais e criticou a falta de liberdade de orientação sexual e de gênero no País.

Leia a seguir a entrevista com o grupo:

Desacato: Qual é sua opinião sobre os atuais movimentos e iniciativas voltas à defesa da liberdade da orientação sexual no Brasil?

Grupo ACONTECE: O Movimento LGBT, bem como os movimentos sociais em defesa dos direitos humanos e em prol da cidadania das minorias, são a mola propulsora do debate para a construção de uma sociedade mais democrática em todos os sentidos. Uma sociedade livre de preconceitos, livre de opressões e com o direito a liberdade de ser, que reconheça que nossas diferenças é a única igualdade que nos une.

O Brasil, no entanto, é o campeão de denúncias e casos de homofobia. Temos uma sociedade culturalmente segregadora e preconceituosa. O preconceito é tão arraigado em nossos cidadãos que a maioria deles nem percebe quando são vítimas e também reproduzem valores arcaicos.

Neste sentido é que surge as aspirações do Grupo ACONTECE – Arte e Política LGBT. Pretendemos, por meio da Arte, despertar nas pessoas sua condição de sujeito. Pensamos que aí, existem dois pilares: um de fazer com que as pessoas, LGBT mesmo, se reconheçam como tal e o quanto são afetadas pelos preconceitos que as cercam – preconceitos de orientação sexual, racial, de gênero, social, econômico – ; e também contribuir para visibilizar a arte e a produção artística da população LGBT. A Arte será tanto produto de nossas ações, como instrumento delas, quando o propósito for a manifestação, a intervenção social para reivindicação de políticas públicas.

D: Quais são as principais metas e bandeiras do grupo? Quem são os principais interlocutores nesses temas em Santa Catarina e no Brasil?

G. A: A principal meta do grupo é defender e promover a cidadania das minorias, por meio da arte e da política, pautadas nos principios fundamentais dos Direitos Humanos. Os interlocutores são, de um lado a sociedade e de outro o poder público.

No primeiro caso, tentaremos trabalhar com a desconstrução daqueles valores já expostos, sólidos em nossa população de uma moral branca, rica, heteronormativa, cristã. Acreditamos que a execução efetiva de políticas públicas só pode se consolidar com iniciativas junto ao poder público, por meio de demandas ao executivo, legislativo e judiciário.

D: Como vê a atuação da Frente Parlamentar Mista pela Cidadania LGBT, da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos Humanos, da Comissão de Direitos Humanos e Minorias e da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais?

G. A: É importante separar as instâncias e competências de cada uma delas. A CDHM foi constituida em meados dos anos 90, na Câmara dos Deputados e desempenhou papel muitíssimo importante nos avanços dos Direitos Humanos no Brasil, até os últimos eventos deste ano.

A Frente Parlamentar Mista é composta por cerca de 171 parlamentares, mas de fato possui pouca incidência nas decisões e discussões efetivas pela cidadania LGBT no Congresso, por uma questão muito séria atualmente: estes parlamentares não se posicionam de fato na defesa dos assuntos LGBT quando pautados na Câmara e no Senado. A deputada federal Erika Kokay (PT-DF), que integra esta Frente, costuma dizer que “o Congresso não é homofóbico”, no entanto, os deputados não tomam pra si o debate e se furtam de usar a tribuna para defender estas matérias.

Esta situação de omissão favoreceu que a CDHM chegasse ao que se tem hoje, uma composição massivamente dominada por representantes do obscurantismo social e político no País. Desta realidade é que chegamos à compreensão do que é a Frente Parlamentar pelos Direitos Humanos: um grupo de deputados que saíram da CDHM, assim que o Dep. Marco Feliciano (PSC-SP) assumiu a presidência. A proposta da Frente Parlamentar é fazer o contraponto dentro da Câmara. Mas seu papel não se cumprirá de fato, se um conjunto significativo de deputados e senadores não começarem a se posicionar e passar a fazer o debate político de fato não só no Congresso, como também na sociedade.

Já o debate promovido pela AGBLT é social e de base. Trata-se da maior rede em defesa da cidadania LGBT da América Latina, com 286 ONGS filiadas, de todo o Brasil, das cinco regiões, dos 26 estados e Distrito Federal; um trabalho propositivo e intervencionista. Discute-se com a sociedade as realidades locais e se constrói ações concretas para promoção da cidadania LGBT no Brasil.

D: Onde estão os principais desafios e dificuldades para avançar na luta pelas liberdades individuais e pelos direitos humanos?

G. A: Enfrentamos entraves institucionais contra os avanços da cidadania LGBT e também os ecos de conservadorismo da sociedade. O Brasil se apresenta ainda como um país em que valores religiosos de cunho moral perduram e interferem no posicionamento das pessoas. Este é o principal desafio para se avançar, quer seja sobre as pautas LGBT, como também em relação aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. É um traço marcante de nossa cultura política e social.

D: Qual é o papel da arte e da cultura na busca pelo cumprimento dos objetivos da Associação e na luta pela liberdade da orientação sexual de LGBT de modo geral? 

G. A: ACONTECE Arte e política LGBT é uma associação que vê nas artes e na cultura um poder de transformação social. Nosso objetivo é trabalhar em prol de uma sociedade mais justa, igualitária e democrática, na qual a liberdade a todas as expressões sejam respeitadas dentro dos preceitos dos Direitos Humanos.

Em nossa cultura machista e sectária, as questões relativas à sexualidade dominam o ranking da violência e exploração. Logo, pretendemos através da arte (literatura, dança, teatro, música, pintura, escultura, arquitetura, cinema, perfomance, entre outras) suscitar a consciência de uma mudança cultural e revolucionária, pautada no respeito, na garantia de direitos e na visibilidade da diversidade humana e suas expressões.

O papel que a arte exerce sobre a cultura é de fundamental importância, pois ela pode resignificar a própria cultura e seus padrões. Entretanto, entendemos também que a política tem total importância nessa virada cultural, pois também exerce poder de mudança cultural e social. É justamente nesta união entre arte e política que pretendemos lançar esforços na constante empreitada por um país digno para todas e todos.

Fortalecer nossa identidade através da arte e da política é um grande passo necessário nesta luta. Precisamos tirar a carapuça que nos foi forjada a golpes covardes e mostrar a verdadeira face humana, livre de rótulos.

D: Como a Associação ACONTECE percebe a relação da liberdade da orientação sexual e a defesa da laicidade do Estado e do respeito à liberdade de crença?

G. A: Não existe liberdade de orientação sexual, nem de gênero. As crenças religiosas em nosso país, desde que nascemos, nos obrigam a desempenhar papeis binários (homem ou mulher) determinados pela anatomia “pênis x vagina” e suas respectivas funções sociais. Para pessoas que não são assim, o que sobra é violência, marginalidade, desrespeito, abuso, e uma série de problemas impostos selvagemente pelos crentes.

O Estado é quem deveria proteger seus cidadãos de crenças arbitrarias que segregam e humilham diariamente muitos de nós. O Estado, como o provedor da democracia e seus bens, é e deve ser LAICO. Sem CRENÇA. Pois a crença pertence a um campo pouco provável e do absurdo, onde os fatos não contam. Não estamos contra as crenças, mas contra a falácia de acreditar em algo que historicamente é a causador da cultura do machismo, do holocausto, da escravidão, da perseguição aos LGBT entre outras milhões de atrocidades.

A liberdade é uma faca de dois gumes, se nós criássemos uma igreja onde cristãos fossem a aberração do mundo, os causadores de toda a pestilência e mal desta galáxia, estaríamos exercendo nossa liberdade ou sendo preconceituosos? Pois é, liberdade tem fronteira e estas são bem grossas. Não podemos chamar de liberdade crenças medievais que são comprovadamente atrasos sociais, que insistem em desqualificar e aniquilar outras pessoas só por serem assim ou assado. Isso não é liberdade, é opressão.

A relação entre liberdade sexual e Estado laico e religião se dá no nível em que o Estado deve garantir e defender as expressões sexuais/culturais/sociais e a liberdade de religião/crenças DESDE QUE nenhuma desta vá de encontro aos Direitos Humanos. Necessitamos de um Estado laico para garantir a verdadeira liberdade, pautada na diversidade de nossa gente, de nossos sexos e de nossas crenças, criando através da cultura e da arte um sentimento de identidade nacional, que faça de nosso povo um povo de amor, de respeito, de conhecimento e justiça.

Para mais informações sobre a ACONTECE – Arte e Política LGBT, acesse http://www.acontecelgbt.org

Confirme sua presença na Assembleia de Fundação da Associação: https://www.facebook.com/events/474163922669219/

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