Mais uma vez, a Argentina dá o exemplo e mostra o compromisso de seus governos democráticos com os direitos humanos. O país se prepara, agora, para a nova fase do que está sendo chamado de “megacausa”, o maior julgamento aberto do país que colocorá no banco dos réus 68 acusados de crimes contra a humanidade praticados nas dependências da Escola de Mecânica da Marinha (ESMA) no período da última ditadura militar deles (1976-1983).
Um dos principais centros clandestinos de prisão, tortura e assassinato no país, estima-se que cerca de cinco mil vítimas passaram pela ESMA. Daí as dimensões históricas que adquiriu e a importância deste julgamento que ouvirá 900 testemunhas nesta nova fase. Num prazo previsto de dois anos serão julgados 789 casos de violações de direitos humanos.
A “megacausa”, resposta a tanta dor e sofrimento causado pelo regime militar ao povo argentino, teve seu primeiro julgamento em 2007. Mas, a morte de Héctor Febres, prefeito acusado de chefiar a maternidade da prisão clandestina durante a ditadura, impediu que a sentença final fosse dada. Ele morreu envenenado por cianureto enquanto aguardava ser julgado.
Na ESMA funcionou sistematicamente um esquema de apropiação de bebês. Relatos apontam que as grávidas davam à luz encapuzadas. Ao todo, 500 bebês foram sequestradosali e em maternidades clandestinas no país. No ano passado, na segunda fase do julgamento da “megacausa”, 16 pessoas foram condenadas e 180 testemunhas ouvidas. Dentre elas, os ex-ditadores, generais-presidentes Jorge Rafael Videla e Reynaldo Bignone, condenados à prisão perpétua.
Nova fase de julgamento
No banco dos réus, nesta nova fase, pela primeira vez, estarão seis tripulantes responsáveis pelos macabros “voos da morte”, quando as vítimas eram jogadas em alto mar, dos aviões, em pleno voo e ainda vivas.
Há, também, o julgamento de réus civis colaboradores da ESMA, como Gonzalo Torres de Tolosa, conhecido por Tenente Vaca, um dos integrantes do grupo de Tarefas da ESMA e o economista Juan Ernesto Alemann, ex-funcionário do centro clandestino acusado por torturas.
E, obviamente, oficiais de alto escalão. Dentre eles, o ex-capitão da Marinha, Alfredo Astiz, conhecido como o “Anjo da Morte”; Jorge Eduardo Acosta, ex-capitão de navios de guerra e ex-chefe de Inteligência e do Grupo de Tarefas da ESMA; e o ex-capitão de corveta Ricardo Miguel Cavallo (extraditado em 2008, da Espanha).
Desculpas das Forças Armadas
De acordo com levantamento de entidades humanitárias a última ditadura militar argentina é responsável pela prisão e desaparecimento de 30 mil presos políticos e combatentes do regime. É como sempre digo, nossos vizinhos, também vítimas de ditaduras militares entre as décadas de 60 e 80 do século passado, estão bem à frente do Brasil.
Mas a verdade virá à tona aqui também, queiram ou não. Não se iludam com as protelações que conseguem. E nem com o fato de as Forças Armadas não terem pedido, até agora, desculpas aos brasileiros pelos crimes cometidos por uma parte de seus integrantes.