Em nota divulgada na terça-feira (19), o procurador-Geral da República, Augusto Aras, afirmou que cabe ao Poder Legislativo julgar “eventuais ilícitos que importem em responsabilidade de agentes políticos da cúpula dos Poderes da República”, em meio à pandemia. Em tom de ameaça, disse ainda que, “o estado de calamidade pública é a antessala do estado de defesa”.
De acordo com o cientista político Paulo Niccoli Ramirez, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fesp-SP), esse tipo de ameaça decorre do isolamento internacional e da perda de popularidade do presidente Jair Bolsonaro.
“Trump deixou a presidência dos Estados Unidos, e Biden assume com uma série de críticas às políticas ambientais e morais do Brasil, como o racismo, ataques aos indígenas e a destruição das florestas. Dentro do país, Bolsonaro começa a ver uma alavancagem da sua impopularidade. Cada vez mais grupos sociais da sociedade civil se mostram contrários às suas atitudes”, disse Niccoli, em entrevista ao Jornal Brasil Atual, nesta quinta-feira (21).
As críticas ao governo Bolsonaro atingiram um novo patamar, após as mortes por falta de oxigênio ocorridas em Manaus. Da mesma maneira, a dificuldade de acesso aos insumos para as vacinas em função dos choques diplomáticos com a China e a Índia potencializaram a insatisfação. Daí a necessidade do círculo próximo ao presidente elevar o tom.
Escalada
O estado de defesa, por sua vez, antecede à decretação do estado de sítio. Com essas medidas de exceção, o Estado poderia, por exemplo, impedir reuniões, prender pessoas sem o devido processo legal e censurar a imprensa. São instrumentos aplicados em casos de guerra ou calamidades de grandes proporções.
Salvo os casos previstos na Constituição, a governos fazem uso desse tipo de expediente quando “perderam a mão”, segundo Niccoli. Ele lembra também que é um tipo de artimanha para o endurecimento de regimes, sem a necessidade de um golpe clássico. Foi assim, por exemplo, que Adolph Hitler acumulou poderes, na Alemanha nazista. Ele decretou medidas de exceção, após atribuir aos comunistas a culpa pelo incêndio no prédio do Parlamento, no início de 1933.
Um dia antes da nota de Aras, Bolsonaro disse que “quem decide se um povo vai viver numa democracia ou numa ditadura são as suas Forças Armadas”. Outro elemento que compõe essa escalada autoritária é o projeto de lei que pretende unificar as polícias, sob comando da presidência, esvaziando os poderes dos governadores.