Por Isadora Stentzler.
A aprovação do Projeto de Lei (PL) 490 pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ)na última quarta-feira (23), que altera a legislação da demarcação de terras indígenas, pode extinguir as comunidades originárias do Oeste do Paraná.
Isso porque, entre as alterações, o PL impõe um marco temporal para demarcação das terras: a data da promulgação da Constituição do Brasil, em outubro de 1988, passa a ser o período base para definir se o território é ou não de posse dos indígenas.
Hoje, 15 comunidades do Oeste integram o local chamado de Guasu Guavirá, que compreende tekohas dos municípios de Terra Roxa e Guaíra. São 816 famílias: mais de quatro mil pessoas.
Histórico
De acordo com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), desde a década de 1990 já haviam ações judiciais contrárias à presença indígena na região, mas o Grupo Técnico (GT) para estudos de identificação e delimitação dessas áreas só foi criado em 2009. Na época, o estudo não foi adiante.
Em 2014, após uma ação judicial do Ministério Público Federal (MPF), é que os estudos deram início e foram finalizados em 2018, por determinação judicial. Em 2020, no entanto, todos os estudos foram anulados.
“A gente está vendo esse PL como um massacre contra os povos indígenas”, disse o cacique da aldeia Tekoha Yhovy, Ilson Soares, de Guaíra. “No caso da Guasu Guavira, que teve o RCID anulado por mandado da Justiça, a gente percebe que não terá a nossa terra reconhecida, já que esse PL coloca em risco não só essa terra, mas também terras demarcadas e reconhecidas. Pra nós, seria o fim dos nossos direitos à terra e também à nossa identidade”, complementou.
O RCID, citado pelo cacique, é o Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação, documento antropológico realizado pela Fundação Nacional do Índio (Funai) para identificar se a terra é ou não originaria dos povos tradicionais.
Impactos
Dentro deste histórico, caso o PL 490, que segue para a votação na Câmara dos Deputados, seja aprovado ali e no Senado, as comunidades ficarão ainda mais ameaçadas. Isso porque a região vive uma série de conflitos, que já culminaram com o assassinato de indígenas e atropelamentos, não solucionados pelas investigação.
Além disso, a cosmovisão e tradição destes povos fica sob ataque, já que, para as comunidades, o respeito à natureza e sua tradicionalidade perpassa pelos territórios em que habitam.
“A não demarcação ameaça a nossa existência, porque seria o fim dos nossos direitos. E não teríamos defesa suficiente pra gente permanecer nos nossos territórios (…) Muitos fazendeiros, criadores de gado, não aceitam a presença indígena e querem o espaço pra expandir monocultura, soja”, explicou o cacique.
“A gente sempre viveu ameaçado, as lideranças sendo ameaçadas. Perdemos pelo menos quatro parentes assassinados em Guaíra e Terra Roxa, fora os que morreram propositalmente em acidentes, mas não tivemos desfecho desses crimes. Muitas vezes não podemos contar com a policia. Por falta de provas e evidência, a gente não consegue ter uma investigação efetiva”, relatou Ilson.
Como em todo o Brasil, as comunidades da região se organizam para um novo ato contra o PL.
Na quarta-feira, quando o projeto foi votado, centenas de Avá-Guarani Guasu Guavirá protestaram no centro do município de Guaíra contra o projeto. Representantes de 11 aldeias participaram, sendo oito de Guaíra e três de Terra Roxa. Nesta segunda (28), uma comitiva com 17 indígenas da região irá a Brasília, somando-se à mobilização nacional contra o PL.