“A votação da quarta 22 marcou a certeza de que manobras parlamentares e a pressão das ruas ainda não foram recursos suficientes para brecar o retrocesso da terceirização para todas as atividades da empresa”, constata Bruno Lima Rocha, professor de ciência política e de relações internacionais.
Segundo ele, “este PL 4330 semeia em solo fertilizado pela grande mídia e os recursos discursivos do neoliberalismo. É preciso fazer a avaliação da semântica da “modernização das leis trabalhistas”, ladainha neoliberal mil vezes repetida e que implica, no mundo real, em perda de direitos, precarização do trabalho, aumento da correria louca do pós-fordismo e ainda maior dificuldade em mobilizar pessoas no cotidiano”.
Eis o artigo.
A 4ª feira 22 de abril iniciou com um leve tom de confiança por parte dos sindicalistas vinculados a CUT e CTB(governistas) e mesmo os representantes da CSP Conlutas e da Intersindical (à esquerda do governo). Após anos de peleguice e da triste sina de ir a reboque de um governo de centro direita parece que as energias restantes do sindicalismo brasileiro ao menos conseguem ser suficientes para defender direitos adquiridos. O PL 4330 seria a pior derrota desde o golpe de 1964 e deveria ser derrotado. Se este retrocesso fosse interrompido será possível brecar a agenda conservadora do Blocao que também é “base” do governo. Não foi desta vez.
Parecia que, após a resistência da opinião pública (que difere da opinião publicada) e do reposicionamento anunciado pela bancada tucana, o PL 4330 seria enterrado na sua essência, a terceirização da atividade-fim das empresas. No final da noite, a Câmara aprovou por 230 votos a favor contra 203. O texto é pior do que se imagina, pois o mesmo não permite a incidência de taxação sobre a margem de lucro (e sim sobre a folha de pagamento) e autoriza a nefasta quarteirização, que seria a terceirização dos serviços contratados pela empresa já terceirizada de outrem. Tamanho retrocesso teve a seguinte proporção de votos dos partidos que deram condições para esta restauração do período anterior a 1932.
A favor da terceirização: PSDC (100%); PP (90,3%); PMDB (77,4%), SD (76,9%), PSDB (76,7%), PSD (75,0%), PV (75,0%). Ainda tiveram representantes que votaram a favor da terceirização as bancadas de PTB, PTN, PDT, PEN, PHS, PMN, PPS, PR, PRB, PROS, PSB e PSC.
Os únicos partidos que fecharam questão e garantiram a disciplina de seus parlamentares foram: PC do B, PT, PSOL ePTC.
Podemos interpretar o óbvio. Não há lealdade alguma da bancada do governo e a tendência dos partidos nanicos é inclinar-se para a direita e o mesmo ocorre com a falta de fidelidade partidária dos partidos de “centro” e seus membros.
Crise de modelo, fim de hegemonia e o malabarismo ineficaz da ex-esquerda
Agora que o Blocão de Cunha assegurou a derrota dos trabalhadores, é necessária a espera que o Senado vete ou ao menos derrube a ementa que libera a terceirização em todos os setores da empresa. Este é um exemplo concreto de como o Parlamento é uma armadilha para os direitos da população. Um esforço gigantesco para apenas garantir a manutenção de um direito adquirido. Por evidências como estas é que a representação se vê esfacelada na legitimação popular. Depois os liberais não entendem porque a democracia indireta é tão mal vista na América Latina.
Esta luta não está perdida, mas constata como há um avanço ideológico à direita e como este fenômeno ocorre em plena década de governo de coalizão. Os fatores de reprodução ideológica não foram abalados e tiveram força renovada com o Bismarckismo Tropical. Novamente a peleguice confia no andar de cima da pirâmide e outra vez mais a patronal não decepciona.
Comporta-se como dela se espera: age sanguessuga do Estado e da sociedade. Não foi por falta de aviso esta rotunda derrota. A mentalidade do peleguismo colocou a Força Sindical dentro do governo e, no primeiro mandato de Dilma, um acórdão de corredor garantira a Marco Feliciano a antiga gestão da Comissão de Direitos Humanos da Câmara. Agora, com o Blocão andando na margem direita e de cabeça erguida através de Eduardo Cunha, paga-se o pato pela tal da governabilidade.
A terceirização atingiria ainda mais as condições de mobilização popular
A votação da quarta 22 marcou a certeza de que manobras parlamentares e a pressão das ruas ainda não foram recursos suficientes para brecar o retrocesso da terceirização para todas as atividades da empresa. Ao suprimir o serviço público e as empresas de economia mista, por um lado, estamos com a proteção de ao menos uma parte razoável da base sindical brasileira; por outro, se a direita ganhar e acabar com a formalização das relações de trabalho, os servidores públicos e concursados serão vistos como uma espécie de “privilegiados” da classe trabalhadora, o que aumentará a corrida por concursos e, por outro, aumentará o fosso e a falta de solidariedade entre assalariados dos setores privado e público.
Obviamente que isto atende ao interesse de patrões e pelegos históricos (eu diria pelegos coerentes, como Paulinho da Força e seus guias, como Medeiros, Magri e Joaquinzão); mas também vai ao encontro da incoerência de quem se aliou com a direita em busca daquilo que não existe: uma iniciativa privada nacional e nacionalista, que aceita o pacto social e reforça as condições do mercado de trabalho para fortalecer sua posição no mundo e o Brasil no Sistema Internacional.
Pura bobagem. As mesmas empresas que estão na Lava-Jato estão no cartel do metrô de São Paulo e em boa parte na lista do HSBC, e também são fraudadoras localizadas na Operação Zelotes e seriam pegas em flagrante se não houvessem melado a CPI do Banestado. Infelizmente, estamos em um país cuja justiça social é confundida com a postura jacobina do aparelho de Estado e é simplesmente impossível fazer luta de classes aplaudindo ou refutando operações da Polícia Federal.
O bom sinal é que ainda dá tempo de não perder este direito adquirido, mas para isso é preciso criar tensão, muita tensão na base do governo, dentro do governo, no plano do ajuste “austericida” de Levy e cia e, deixar exposto para Dilma que caso ela não vete, o pouco que resta de legitimidade vai pelo ralo.
Vale ressaltar que este PL 4330 semeia em solo fertilizado pela grande mídia e os recursos discursivos do neoliberalismo. É preciso fazer a avaliação da semântica da “modernização das leis trabalhistas”, ladainha neoliberal mil vezes repetida e que implica, no mundo real, em perda de direitos, precarização do trabalho, aumento da correria louca do pós-fordismo e ainda maior dificuldade em mobilizar pessoas no cotidiano.
Apontando os próximos passos
Ainda é possível a virada no Senado, o que implica um embate direto entre Renan Calheiros (PMDB-AL) e o próprio Cunha (PMDB-RJ). O amigo de Collor de Mello é duro na queda e costuma cobrar caro por seus acordos. Deve entregar o texto remendado para a Câmara e Cunha prometera vetar a mudança da casa revisora. Ou seja, a bomba estará na porta de Chefia de Gabinete da Presidência. Fica a profecia insistente. Se a Dilma tiver de vetar a atividade fim terceirizada e não o fizer então o governo acaba. De vez.
Fonte: IHU.
Lamentavelmente, esta análise se limita ao parlamento! Ainda bem que a realidade inclui a rua, a praça, o portão e o chão de fábrica! GREVE GERAL JÁ!