Por Viegas Fernandes da Costa.*
Não defendo o PT. Nunca defendi o PT. Neste aspecto concordo com o que dizia Bakunin, em seus “Escritos contra Marx”, ao tratar das impossibilidades do Partido Comunista promover a revolução. Um partido, ao ocupar estruturas de poder, tende a criar as condições para se perpetuar nestas estruturas. A tese dos fins justificando os meios é o caminho, como tão bem analisou Maquiavel em seu “O Príncipe”.
Ainda sem defender o PT, por muitos anos militei neste partido. Carreguei a estrela vermelha na roupa, vendi rifa, participei da sua vida política, porque entendia que ele representava, naquele momento, o caminho possível para algumas reformas tão necessárias ao país, que outras organizações não seriam capazes de promover, seja porque ideologicamente não lhes interessavam, seja porque não possuíam densidade ou estrutura para tanto.
Nunca me arrependi dos votos que depositei na urna. E não me arrependo hoje. Pouco antes da eleição de Dilma, anunciei meu voto em sua candidatura por reconhecer a importância das migalhas que o governo petista promoveu no país. Sim, migalhas, diante das possibilidades e dos desafios existentes no Brasil. Mas migalhas que até então sempre foram negadas.
Particularmente nunca acreditei em heróis, e por isso não espero muito destes próximos quatro anos, razão pela qual não me surpreenderam as medidas econômicas e fiscais que o governo anunciou, assim como não me surpreendem as denúncias de corrupção. Não me surpreender não significa concordar ou aceitar, que fique claro.
A razão pela qual me afastei do PT, há alguns anos, foi justamente por perceber que o partido traçava um caminho diferente daquele para o qual fora criado. O PT que eu reconhecia era aquele de Chico Mendes, de Florestan Fernandes, de Paulo Freire e de tantos outros pensadores e fazedores de uma nova realidade. Ao me afastar, entretanto, não o neguei.
O PT foi e continua sendo um partido político importante. Isto é inegável. É um partido legítimo sob o aspecto da representatividade, e não apenas sob o aspecto do aparato burocrático-legal, como é o caso da maioria das agremiações partidárias brasileiras. Tentar destruí-lo é, de algum modo, afastar das estruturas de poder aqueles que representa.
Por isso, preocupa-me a sistemática campanha empreendida contra o PT, reforçada desde o início do ano. Sabemos, por exemplo, que o impeachment de Collor não aconteceu por conta das denúncias de corrupção, mas porque reteve o dinheiro da classe média e porque interferiu nos negócios da grande mídia nacional, limitando a participação estrangeira nas empresas de comunicação brasileiras.
Nestas últimas semanas venho recebendo uma série de convites para participar de atos pedindo o impeachment da presidente Dilma, mesmo sem existir nenhuma denúncia de improbidade administrativa ou algo do gênero contra ela. Vejo também em muitos meios de comunicação, uma abordagem nada equitativa quando se trata do PT. Ainda que a corrupção seja “ampla e irrestrita”, e que partidos como o PSDB e o PMDB possuam um histórico de envolvimento com a corrupção bastante maior, o PT é tratado como o grande bode expiatório. A pergunta que faço é: por quê?
Fui um dos caras-pintadas que saiu à rua pedir o impeachment de Collor. Hoje percebo o quanto fui manipulado. Collor caiu (mas voltou pelo voto popular), a corrupção não acabou e as críticas ao governo continuam as mesmas. Outro dia, José Serra (PSDB) vaticinou que Dilma não chegaria ao fim de seu mandato. O que Serra sabe que não sabemos? Quais os acordos de bastidores dos quais participou?
Pedem o impeachment de Dilma, por quê? Quem a substituiria? Quais as consequências? A quem interessa sua queda? Pintei a cara uma vez, e foi o suficiente. Um país é coisa séria, não dá para ficar brincando com ele.
Assim como no caso Collor, novamente agora a mídia é pauta política. Fala-se em regulamentação dos negócios da mídia, e este é um debate importante, porque não existe liberdade de expressão, tampouco democracia, quando a mídia é negócio concentrado nas mãos de poucos. O Brasil é assim. Aqui, mídia é latifúndio. Desconfio honestamente que esta pauta explica a beligerância contra o PT e os atos pelo impeachment. Por isso, meus caros amigos e amigas que me pedem para participar de um golpe, aviso: aprender com a história é importante.
* Viegas Fernandes da Costa é historiador e escritor.
Foto: Caras-pintadas em manifestação em frente ao Congresso Nacional, em Brasília, em setembro de 1992