Em uma carta escrita a mão e assinada no dia 19 de abril, indígenas da Tekoha Y’Hovy, de Guaíra, no Oeste do Paraná, pediram ajuda após um novo surto de covid-19 ser registrado na comunidade. Só nas últimas semanas, 21 novos casos foram confirmados, sendo 11 entre crianças e adolescentes com idades entre 8 e 13 anos.
No documento, eles pedem à Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), do ministério da Saúde, o envio de mais profissionais para atuarem na região e denunciam o descaso com a saúde indígena na pandemia.
A carta foi enviada, segundo Vicenta Takua, de 37 anos, porque já se esgotaram alternativas junto aos órgãos competentes.
“Estamos sem saída com tudo isso que está acontecendo. Tem um interdito proibitório da Justiça Federal de Guaíra que nos proíbe de manifestar em local público, principalmente na BR. Tem uma doença aí fora da aldeia que está matando e está entrando nas aldeias e já não temos outras formas de articulação, a não ser por meio de cartas, por meio de redes sociais, que acabam não sendo a melhor coisa porque o poder público normalmente não atende”, diz.
Na Tekoha vivem 220 pessoas, em um território que ainda não está demarcado. Na carta, eles citam que há apenas cinco profissionais responsáveis pelo atendimento de 14 aldeias nos municípios de Guaíra e Terra Roxa.
“Estamos informando que a Sesai não está conseguindo dar o atendimento devido para Tekoha Y’Hovy por conta do quadro de funcionários ser muito pouco e também que o único agente de saúde indígena da aldeia trabalha dando assistência aos infectados pela covid-19. Assistência esta que muitas vezes é feita sem os equipamentos de proteção adequados, até mesmo com a falta de álcool em gel, equipamentos que são de grande importância para a proteção e prevenção sua e deus familiares”, diz trecho da carta.
A comunidade exige, no documento, a contratação de três enfermeiros para Guaíra, mais um médico – pois há apenas um fazendo os atendimentos nas aldeia de Guaíra e Terra Roxa – e a disponibilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) para os profissionais e agentes.
O documento tem assinaturas de indígenas da comunidade.
Falta de diálogo
À reportagem, Vicenta disse ainda que foram feitos vários pedidos ao Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI), subordinado à Sesai, mas que eles não foram atendidos. De acordo com ela, a pasta alegou não ter orçamento para a contratação de funcionários e há mais de um mês não atende as ligações dos indígenas e não responde os e-mails.
“Não tem profissionais suficientes, até essa demanda por funcionários na saúde é uma demanda bastante antiga que nunca foi atendida pelo DSEI, e agora com a pandemia essas demandas foram se tornando mais urgente, ainda mais agora que estamos no segundo surto de covid aqui em Guaíra”, conta Vicenta.
Dos 21 novos casos confirmados, um foi internado em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI), em Palotina, e outros quatro foram atendidos e medicados na Unidade de Pronto Atendimento (UPA).
“O receio é de aumentar os casos e talvez a gente perder parentes pra doença e mesmo assim não ser atendido até porque a equipe de saúde agora nem vem visitar os pacientes, medir temperatura, nem acompanha a recuperação nem nada”, explica Vicenta.
Em nota, o Ministério da Saúde negou que há falta de equipamento de proteção individual e que algum paciente estivesse internado, como de denunciou Vicenta.
A pasta não respondeu sobre a falta de diálogo com a comunidade e nem sobre a contratação de mais profissionais, dizendo que “a região é composta por 1 enfermeiro, 2 técnicos em enfermagem, 1 dentista, 1 auxiliar de saúde bucal e 1 médico do Programa Mais Médicos” e que 100% da aldeia recebeu a primeira dose da vacina e 86%, a segunda.