É um paradoxo o fato de os agricultores familiares serem os mais ameaçados pela insegurança alimentar.
A luta contra a fome alcançou hoje um “ponto de inflexão”, e apoiar os agricultores familiares é fundamental para o sucesso, afirma o diretor-geral da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o brasileiro José Graziano da Silva, em discurso a parlamentares britânicos.
“A principal causa da fome hoje não é a falta de alimentos, mas sim a falta de acesso a eles”, disse em discurso diante do Grupo Parlamentar Interpartidário sobre Agricultura e Alimentação para o Desenvolvimento.
É um paradoxo o fato de os agricultores familiares — que produzem a maior parte dos alimentos no mundo — serem os mais ameaçados pela insegurança alimentar, disse Graziano.
Por isso, ele pediu uma maior conscientização e apoio frente à piora da situação dessas pessoas, muitas das quais vivem em regiões rurais de países em desenvolvimento e “apenas conseguem sobreviver” diante das consequências da mudança climática e, cada vez mais frequentemente, de conflitos civis.
Ele completou ser essencial investir para ajudá-los a melhorar sua própria produtividade e o uso dos recursos naturais, e disse que muitos lares nos países em desenvolvimento não podem investir para aumentar sua resiliência, como seria a introdução de sistemas de irrigação por gotejamento, que economizam água.
“É uma via de mão dupla: os agricultores familiares precisam de nossa ajuda, mas nós também precisamos que os agricultores familiares façam parte do futuro sustentável e com segurança alimentar para todos que queremos”, afirmou.
Isso é especialmente válido na medida em que as técnicas de cultivo industrial estão chegando a seus limites naturais, e apesar de terem contribuído para um aumento de 40% na produção de alimentos per capita desde a década de 1960, a fome não foi erradicada. Cerca de 815 milhões de pessoas padeciam de desnutrição crônica no ano passado, apesar de o mundo produzir alimentos suficientes para todos.
Os desafios atuais do sistema alimentar estão relacionados às emissões de gases de efeito estufa, à distribuição econômica e à crescente incidência da obesidade e do sobrepeso, e esses desafios devem ser abordados levando em conta os agricultores, afirmou Graziano.
Proteção social integrada
Também são necessários programas de proteção social para os agricultores familiares vulneráveis, já que estes permitem benefícios sistêmicos, disse o responsável da FAO aos membros do Parlamento britânico, lembrando o sucesso do Brasil ao vincular as transferências de renda à matrícula de crianças na escola.
Tais políticas devem ser complementadas por leis que exijam a compra pública de alimentos dos agricultores familiares para os programas de alimentação escolar, estratégia que incrementa as vendas dos pequenos produtores e melhora os resultados nutricionais.
Outro ponto levantado por Graziano é a questão das legislações específicas. “Onde as políticas públicas e os programas se baseiam na legislação adequada, os indicadores sobre a má nutrição melhoram significativamente”, concluiu.