Angola: Painéis solares para produzir água potável

Por Louise Redvers*.

Luanda, 19 de abril, (IPS) – O velho contentor pintado em cores alegres com painéis solares no telhado e com dispositivos de filtração interiores de elevadas especificações parece deslocado nesta poirenta aldeia angolana do Bom Jesus, localizada a 50 quilómetros a leste da capital, Luanda.

Mas em breve irá providenciar cerca de 20.000 litros de água potável e limpa por dia aos 500 residentes que atualmente dependem do abastecimento de água suja do rio próximo.

Concebida pela Quest Water Solutions, companhia de tecnologia canadiana, a estação de água potável em aço inoxidável chamada AQUAtap está a ser experimentalmente aplicada neste país da África Austral com o objetivo, se for bem sucedida, de começar a produzir estes sistemas localmente para serem depois distribuídos pela região.

Usando energia solar armazenada em grandes pilhas, a água do rio Kwanza, a 50 metros de distância, é purificada por meio de areia e outros filtros. Depois são utilizados raios UV para esterilizar a água de acordo com as normas da Organização Mundial de Saúde (OMS) relativas à àgua potável, disponibilizando-a para ser distribuída por uma torneira de aço inoxidável posicionada à frente.

Joaquina Xavier, que atualmente coleta água do rio Kwanza, em frente à nova estação de tratamento de água.

“Na realidade é muito simples e fácil,” explicou John Balano, da Quest, enquanto empurrava cuidadosamente uma das duas torneiras posicionadas à frente do bloco para permitir que a água entrasse numa garrafa.

“Sim, parece um dispositivo deslocado e é um pouco avançado para esta zona, mas não é, na realidade é muito simples e o melhor é o facto de ter uma manutenção baixa.”

“A própria máquina só precisa de assistência uma vez por mês e estamos a formar alguns angolanos que possam prestar essa assistência depois de regressarmos ao Canadá.”

As torneiras de aço inoxidável – que deixam passar uma quantidade fixa de pouco mais de um litro por cada empurrão – e a plataforma de alumínio foram concebidas para uma limpeza fácil, havendo tubos em redor das extremidades para recolher qualquer água entornada.

 

Contudo, um encontro casual há quatro anos com um residente angolano no Canadá chamou a sua atenção para África.

A AQUAtap foi concebida especificamente para uma comunidade angolana rural onde a falta de água potável e o saneamento limitado são importantes contribuintes para a elevada taxa de mortalidade infantil no país, que atinge uma em cada cinco crianças antes dos cinco anos.

Desde o fim da guerra civil de três décadas em 2002, o governo angolano gastou milhões de dólares na reconstrução de infraestruturas e na prestação de serviços básicos como abastecimento de água para a população de 19 milhões.

Balanko e o seu parceiro de negócios, Peter Miele, ambos de Vancouver, têm antecedentes ligados à utilização de tecnologia para resolver questões de abastecimento de água nas zonas rurais do Canadá.

Como parte do projeto “Água para Todos”, foram instalados poços e torneiras em várias comunidades por todo o país embora, segundo as estatísticas do governo, cerca de metade da população continua a não ter acesso a água potável.

A aldeia escolhida pela Quest Water Solutions, que foi sugerida pelas autoridades municipais, tem uma torneiras instalada pelo governo, mas os habitantes, a maioria dos quais são agricultores de subsistência sem emprego formal, disseram à IPS que essa torneira deixara de funcionar há mais de um ano.

Carlos de Costa Gabriel, de 25 anos, acolheu com satisfação a nova máquina e não escondeu o facto de querer um emprego como segurança para tomar conta dela durante a noite e impedir o roubo dos painéis solares.

“Gostamos muito deste projeto. Temos usado a água do rio, que causa muitos problemas como vómitos e diarreia”, disse Gabriel.

“Tenho duas filhas com três e cinco anos e estou muito satisfeito por agora podermos ter água potável porque isso resolve os problemas de saúde.”

Joaquina Xavier, mãe de cinco filhos, de 38 anos, acrescentou: “Agradecemos este apoio. Neste momento a água que usamos está muito suja e custa muito ir buscá-la do rio em baldes.”

“As crianças ficam doentes devido à água e algumas pessoas na minha família morreram por causa dessa água suja, mas esta máquina vai mesmo ajudar.”

Balanko e Miele estão a trabalhar em conjunto com o Ministério da Indústria de Angola, responsável por obter o equipamento para o programa Água Para Todos.

Distribuição de água potável, no âmbito do programa "Água Para Todos", na cidade de Luena, província do Moxico, em Angola

O dispositivo, um de dois que foram enviados para Angola sem custo algum para o governo, está a ser vendido por um montante único de 150.000 dólares, estando incluída também uma garantia de manutenção com a duração de dois anos.

“Não podemos negar que somos uma companhia com fins lucrativos com um produto para vender,” explicou Balanko. “Mas penso que precisamos de ter lucros para podermos retribuir.”

“Trata-se de um custo único para o governo que terá de ser absorvido mas, em troca, os aldeões vão receber água limpa e potável pelo menos nos próximos 15 a 20 anos.”

“Também é economicamente mais rentável a longo prazo porque a água fornecida por nós custa cerca de 2.30 dólares por cada 1.000 litros, ao passo que neste momento as pessoas pagam quase 30 dólares por cada 1.000 litros, o que é 10 vezes mais caro.

A água da AQUAtap será gratuita para os aldeões, explicou Balanko, uma decisão tomada pelas autoridades.

Os canadianos reconhecem que existem riscos devido ao facto da água ser gratuita, à possibilidade de a máquina ser vandalizada ou roubada por pessoas que desejam vender a água comercialmente.

Mas afirmaram esperar que a aldeia se orgulhe do novo dispositivo e que impeça a ocorrência das situações referidas. “O tempo dirá o que vai acontecer mas acreditamos que será acarinhada. Vamos ter um segurança neste local e possivelmente luzes como medida de segurança adicional”, afirmou Balanko.

“Informámos os aldeões que esta máquina lhes pertence e que portanto têm de tomar conta dela, além de termos estabelecido contatos com alguns anciãos e membros respeitados da comunidade para que ajudem a divulgar esta mensagem.

* para a Inter Press Services (IPS).

Foto de capa: Uma vendedora de água limpa – 10 centavos de dólar por saco – espera compradores em um musseque de Luanda, em Angola. Em 2006, o consumo de água contaminada na cidade resultou numa das piores epidemias de cólera na África, afetando 80 mil angolanos. Foto: Thomas Havisham

Fonte: http://ips.org/ipsbrasil.net/

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