Por Solange Engelmann.
Ela mantém uma relação intima com a terra e a natureza, procurando diagnosticá-la a partir do seu cheiro e da sua textura para observar o equilíbrio dos seus nutrientes.
E há décadas promove ensinamentos sobre a importância do solo como um organismo vivo e integrado à natureza e que é responsável pela geração da vida e do alimento saudável para os povos.
Uma austríaca que sobreviveu aos horrores do nazismo, ao ser presa em um campo de concentração durante a Segunda Guerra Mundial. Mas, que na década de 1950 migrou para o Brasil, iniciando sua carreira acadêmica e de atuação militante.
Essa é a engenheira agrônoma e escritora, Ana Primavesi, que ontem (3) no Dia Nacional da Agroecologia, completou 98 anos de vida!
Primavesi foi uma das responsáveis pelos avanços nos estudos sobre o manejo ecológico do solo e sua difusão, se tornando a pioneira da agroecologia no Brasil e na América Latina.
Ela foi a primeira mulher, em um ambiente científico dominado por homens, a defender que o solo é um ser vivo, e que a própria vida das pessoas, é propiciada pela vida do solo.
Ela também desempenhou papel importante para que a agroecologia fosse pensada como uma ciência e, ao mesmo tempo, considera um saber popular, que vem sendo praticado há séculos pelos camponeses, e atualmente reapropriado e resignificado, na produção de alimentos saudáveis e vivos, sem o uso de agrotóxicos e defensivos químicos.
Devido a sua contribuição para a organização e a sistematização do debate agroecológico junto aos camponeses e camponesas nas comunidades rurais, nos espaços acadêmicos e nos assentamentos e acampamentos de Reforma Agrária, o dia 3 de outubro passou a ser considerado o Dia Nacional da Agroecologia no
Brasil.
A engenheira agrônoma ensina que as diversas doenças e pragas que crescem no mundo, têm relação com a agricultura convencional da monocultura, hoje chamada de agronegócio.
“A agricultura convencional é a arte de explorar solos mortos. (…) As pessoas que comem agora estas colheitas, comem plantas doentes e também se tornam doentes. Uma planta deficiente somente pode gerar um homem deficiente e deficiência sempre significa doença. Por isso precisa-se a cada ano mais leitos hospitalares”, explica
Primavesi.
O MST, juntamente com os movimentos populares do campo agradecem a contribuição de Ana Primavesi para a organização e os avanços das práticas agroecológicas e para o debate sobre a agroecologia no país e na América Latina.
Legado e obra
Em homenagem a sua trajetória, Primavesi recebeu vários prêmios, entre eles o One World Award, principal título de agricultura orgânica mundial. Ela publicou 11 livros, mais de 90 artigos científicos e colaborou com várias
publicações. Sua obra de maior destaque é o livro: Manejo Ecológico do Solo: a agricultura em regiões tropicais que promoveu uma revolução na agricultura ecológica tropical na América Latina.
O livro indica que um solo saudável é o pré-requisito para a geração de plantas saudáveis que, consequentemente, asseguram a saúde das pessoas. Nele a autora chama atenção para a importância em restabelecer o equilíbrio entre o solo, os organismos do solo, as plantas, os animais e seres humanos. Além de apontar a necessidade de uma estrutura de proteção para os pequenos agricultores e camponeses, para garantir sua sobrevivência e a manutenção da sua cultura.
A doutora Ana Primavesi foi professora da Universidade Federal de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, onde contribuiu para a organização do primeiro curso de pós- graduação em Agricultura Orgânica.
Ela também se envolveu na fundação de organizações como a Associação de Agricultura Orgânica (AAO), do Movimiento Agroecológico Latinoamericano (MAELA) e da Federação Internacional de Movimentos da Agricultura Orgânica (IFOAM) na América Latina.
Primavesi também publicou: A Convenção dos Ventos – Agroecologia em contos, Manual do Solo Vivo, Manual Ecológico de Pragas e Doenças, que fazem parte de uma coleção lançada pela Expressão Popular. A biografia da agrônoma, Ana Maria Primavesi – Histórias de Vida e Agroecologia, escrita pela agrônoma Virgínia
Mendonça Knabben, também é vendida pela editora.
Entendida como parte fundamental das relações humanas, a agroecologia é colocada em prática na produção de alimentos saudáveis, na construção de novas relações com o meio ambiente, mas também, na luta contra toda forma de exploração no campo.
Os livros podem ser encontrados aqui.