Por Maria Ângela D’Incao.*
Choramos com você, Amarildo, vítima da violência policial do BOPE.
Rio de Janeiro, 11/08/2013 – A mulher, Elizabeth, e os seis filhos do ajudante de pedreiro Amarildo (Anderson, Emerson, Ana Beatriz, Amarildo, Allisson e a pequena Milena de seis anos) compareceram ao ato de solidariedade, organizado por diversas instituições da sociedade civil em alusão ao Dia dos Pais, para cobrar das autoridades um desfecho para o caso Amarildo.
A pergunta “Onde está Amarildo?” é simbólica de uma democracia que procura se firmar no cenário do país. Vivemos e ansiamos por melhorar a democracia e estado de direito.
Todos brasileiros, sabiam que ele estava morto pela polícia que o abordou e o prendeu para averiguações em 14 de junho de 2013, na entrada da Rocinha. Contudo, os policiais que o abordaram e prenderam para interrogatório mentiram a seus próprios colegas e superiores. Mentiram ao Brasil. O major, presente na operação, não impediu a tortura e morte desse brasileiro de compleição frágil, de olhos inteligentes e negros. Do mesmo modo, os que estavam fora, em guarda dos policiais do BOPE, ouviram os gritos da tortura e nada fizeram.
Assusta certamente saber que esses policiais não interferiram. Por que não o fizeram? Uma dolorosa resposta é a de que não interferiram por que estão habituados a violência. Ela faz parte de seu cotidiano – Não sentiram que algo extremo e excessivo estava acontecendo.
O Ministério Público e seus peritos revelaram em 22 de junho deste que Amarildo não desapareceu como se supunha em 2013. Ao contrário estava morto e embalado em uma capa de moto preta pela polícia de elite. Essa estória nos envergonha, amedronta e afronta.
O que dizer desse evento cruel e desabonador ao governo? Não há palavras que possam expressar esse horror a que acabamos de assistir. O Brasil está mudo e sem palavras. Nossos jornais e mídias nos apresentaram mais um thriller de horror. Seguimos como quem segue uma estória de terror em capítulos, impróprias para menores de idade, mas a qual todos assistem, pois está em nossas telinhas e jornais cotidianos.
É forçoso dizer que a “vida”, aqui, é muito maior que a “arte” poderia supor, parafraseando Oscar Wilde. Não precisamos de escritores e literatos para entretenimento com enredos de terror. Esses policiais brasileiros, de alto nível, são atores e diretores dessas histórias que nos deixam amedrontados e que, de tão terríveis, nos dão a sensação de algo ocorre obscuro em nossa sociedade.
Esse fato, entre outros, denigre nosso governo. Espera-se que a presidência do país tome medidas efetivas contra essa violência exposta por policiais sustentados pelo próprio governo, contra pessoas simples e desamparadas socialmente.
A parte a dor e medo que esse caso encera, deveria o governo refletir sobre a imagem de um país que almeja se colocar entre os bons para turismo internacional mesmo que a educação ocupe lugar cada vez mais baixo na comparação com outros países. Assim, são necessárias explicações oficiais para os estrangeiros – não me refiro a simples palavras de pesar, mas a atitudes efetivas de punição a esse crime que vai muito além de mero afastamento já dado aos responsáveis.
Há um denominador comum em situações desse tipo, o escândalo dos Precatórios, das mortes dos bebes e da hemodiálise, de Diadema, Heliópolis, das meninas prostitutas de Itaituba, da polícia paulista, da morte do índio, da morte dos sem terra, etc.: o corporativismo grupal e as jurisprudências especiais. A impunidade é decorrência da presença dos distintos tribunais que inibem a aplicação da lei comum para os crimes cometidos pelos ‘socialmente importantes’, dos estamentos superiores ou especiais. Os distintos tribunais se alicerçam na mentalidade imperial e autoritária que acha viável, entre outras coisas, a abortada proposta de negociação da reforma administrativa apoiada nos tetos salariais especialíssimos para os deputados e senadores.
Mais que manter a inflação controlada, hoje, o governo tem o dever de procurar transformar os tribunais do país, corporativos e segmentados, em tribunal comum a todos. Isso levaria a uma situação infinitamente melhor para a segurança nacional e a democracia. Levaria a uma sociedade minimamente coesa onde a presença de um ethos moral geral elevado teria que estar presente na ética cotidiana dos diferentes grupos sociais e profissionais em especial da polícia.
Choramos por você Amarildo e ansiamos que se possa ver, em seu inominável sacrifício, o começo de uma nova era de confiança no governo e na polícia para todos os cidadãos, inclusive os despossuídos. Será Presidente?
*Maria Angela D’Incao é Sociologa, com experiencia em estudos de mulheres e cidadania
Colaboração de Isabel Gnaccarini.
Fonte: Portal Ecodebate