Alterações extremas no regime de seca e cheia podem levar à extinção árvores de igapós

Foto: Cimone Barros.

Por Cimone Barros e Anélia Resende (Maua/Inpa).

Em palestra do Congresso de Iniciação Científica do Inpa, o pesquisador Jochen Schöngart disse que uma forma de mitigar os impactos das hidrelétricas é que os operadores simulem os pulsos de inundação garantindo que as árvores saiam todos os anos durante alguns meses para fora da água para renovar suas reservas e evitar a mortalidade em grande escala.

Mudança  climática, aumento de temperatura, desmatamentos, queimadas e hidrelétricas são ameaças que podem levar à extinção regional de árvores que só ocorrem nos igapós, áreas alagáveis dos rios de águas pretas da Amazônia. Eventos extremos alteram o regime de cheia e seca (pulso de inundação) desses ambientes vulneráveis, que abrigam cerca de 600 espécies arbóreas que durante milhões de anos se adaptaram para tolerar a inundações sazonais de até dez meses por ano.

O alerta é do pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTIC) Jochen Schöngart, que fez a palestra de abertura do VII Congresso de Iniciação Científica (Conic) sobre distúrbios naturais e antropogênicos em florestas alagáveis de igapó.

Os igapós têm lenta dinâmica por falta de nutrientes nos solos. Para suportar a inundação, as árvores fazem adaptações morfoanatômicas, bioquímicas e fisiológicas, por exemplo, desempenhando um metabolismo anaeróbico durante a fase aquática com reservas de carboidratos que a planta produziu e armazenou durante a fase terrestre (não inundada) para poder tolerar o longo período que ficará inundada.

“Quando essas árvores não saem mais da água, desse ambiente, isso causa mortalidade em grande escala. E nessas topografias você tem espécies endêmicas que são tão bem adaptadas que só ocorrem naquele ambiente e com isso são muito vulneráveis também, como é a Eschweilera tenuifolia, conhecida como macacarecuia ou cuieira”, disse Schöngart, vice-coordenador do Grupo Ecologia, Monitoramento e Uso Sustentável de Áreas Úmidas (Maua).

Conforme o pesquisador, a implementação de usinas hidrelétricas muda o regime hidrológico por armazenar mais água nos reservatórios durante a época chuvosa para liberar essa água na seca para ter uma “produção mais ou menos estável”. O resultado é que os níveis máximos anuais ficam menores e os níveis mínimos anuais ficam mais altos, porque a usina libera mais água durante a seca.

“Isso causa problema para essas espécies arbóreas do igapó, porque elas ficam de repente durante vários anos consecutivos inundados e ultrapassa a capacidade de adaptações dessas espécies resultando em mortalidade de grande escala”, contou o pesquisador, lembrando que Balbina já causou impactos de grande escala pela criação do reservatório que inundou uma área de 4.400 km2.

Pesquisas do Grupo Peld/Mauá mostram que mais de 20 anos depois da usina de balbina as árvores em florestas de igapó à jusante da barragem continuam morrendonas topografias mais baixas, aproximadamente 12% dos igapós em até 120 quilômetros depois da barragem são dominadas por árvores mortas, conhecidas como paliteiros. O estudo investigou a conexão entre a represa e as árvores mortas de Macrolobium acaciifolium, conhecida como arapari.

Para futuras instalações de usinas hidrelétricas, o pesquisador sugere que se leve em consideração o reservatório, a região ao redor da usina e as áreas alagáveis à jusante da barragem. Para Schöngart, uma forma de mitigar os impactos é obrigar os operadores das usinas a simular os pulsos de inundação garantindo que as árvores saiam todos os anos durante alguns meses fora da água para renovar suas reservas e evitar a mortalidade em grande escala. “Mas tem de ser implementado na legislação para garantir isso”, disse.

Adaptações

As adaptações ocorrem em diferentes níveis. As morfoanatômicas são formação de raízes adventícias que permitem que a espécie consiga obter água e nutrientes quando o sistema radicular principal já está em condições de solo encharcado ou inundado.

A formação de aerênquima são cavidades de ar dentro do caule e da raiz, e a planta consegue difundir esse oxigênio capturado pelas lenticelas para as raízes e com isso consegue aumentar a concentração dentro da raiz em condições anóxicas (falta de oxigênio) de solo durante a inundação. “Então, ela manda oxigênio capturado da atmosfera pelo tronco para baixo e consegue se manter nessa condições desfavoráveis”, disse o pesquisador.

Durante o Conic serão apresentadas 168 pesquisas de iniciação científica desenvolvidas por estudantes de graduação de várias instituições de Manaus orientados por pesquisadores do Inpa.Iniciado na segunda-feira (30), o Congresso encerra na sexta-feira (03) com apresentação de pôsteres e a mesa-redonda Iniciação Científica – oportunidades, desafios e perspectivas.

“A Iniciação Científica é um programa estratégico para o Inpa considerando que temos de investir agora na formação de futuros cientistas”, disse a diretora substituta do Inpa, a pesquisadora Hilândia Brandão, que assumiu a gestão até o novo diretor ser nomeado.

Participaram ainda da mesa de abertura, a coordenadora de Capacitação Beatriz Teles, que é coordenadora geral do Programa de Iniciação Científica do Inpa, e o membro do Comitê, o pesquisador Basílio Vianez. “Nosso programa já tem 27 anos. Antes realizávamos a Jornada Científica e só nos últimos anos passamos a ter o Congresso, no qual abrimos bolsistas de outras instituições apresentarem seus trabalhos”, explicou Teles.

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.