A Petrobrás vem sofrendo críticas duras da imprensa e do “mercado”, em função da decisão do Conselho da empresa, de não pagar dividendos extraordinários para os acionistas. O lucro líquido da Petrobras em 2023 chegou a R$ 124,6 bilhões, o segundo maior registrado na história da companhia, superado apenas pelo montante do ano anterior: R$ 188,3 bilhões. Para se ter dimensão da importância que tem a Petrobrás para o Brasil, somente no ano passado, a companhia pagou R$ 240 bilhões em tributos à União e demais entes públicos. Para efeitos comparativos, em 2023, o bolsa família, que tira da fome extrema 55 milhões de brasileiros, custou R$ 175 bilhões, pouco mais de 70% do que a Petrobrás pagou de impostos.
Os resultados do ano foram sustentados por recordes operacionais e pela estratégia comercial para o diesel e a gasolina, considerada bem-sucedida pela direção da estatal. A empresa bateu recorde, a começar pela produção diária originária do pré-sal, que chegou a 2,17 milhões de barris, 10% acima do registrado em 2022. Outro recorde do ano passado foi a utilização do parque de refino, que ficou em 92% da sua capacidade, na média. O governo Bolsonaro estava vendendo as refinarias, para o país passar a exportar exclusivamente óleo bruto e importar derivados. O governo atual está retomando a capacidade de refinar o petróleo, que é fundamental para o Brasil em todos os aspectos.
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A cadeia de produção do petróleo, que é a mais densa da indústria, implica na etapa de exploração, para extração do gás natural, petróleo e outros componentes; depois vem a fase de refino para a produção de gasolina, óleo, nafta e outros; posteriormente vem a indústria petroquímica que produz uma série de materiais essenciais, como polímeros; finalmente a indústria de transformação para produção de embalagens, filmes, fios, produtos automotivos. Muitos imaginam que o petróleo só tem utilidade como fonte de energia, mas ele é a base para mais de 3.000 produtos industriais fundamentais.
A direção da empresa tomou a decisão de não pagar os dividendos extraordinários, como vinham sendo pagos nos anos anteriores. Foram anunciados R$ 14,2 bilhões em dividendos para o último trimestre de 2023, dentro do modelo de pagamento mínimo da companhia. Não é que a empresa não vá pagar dividendos relativos a todo 2023, ela simplesmente decidiu não pagar os extraordinários, o que vinha fazendo nos anos anteriores. Dividendos são uma parcela do lucro da empresa que é repartida entre os acionistas, os dividendos extraordinários são aqueles pagos além do mínimo obrigatório. Ou seja, a empresa não tem que pagá-los obrigatoriamente.
Depois do golpe de 2016, como a estratégia era vender ativos da empresa, privatizar o que fosse possível, não havia sentido em aumentar os investimentos. A política dos governos golpistas de Temer e Bolsonaro, era justamente desinvestir, ou seja, vender tudo que fosse possível. Fizeram uma privatização realizada aos pedaços e cheia de irregularidades.
Conforme o engenheiro Felipe Coutinho, presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET), tem demonstrado em seus artigos, a redução dos investimentos foi o principal fator que possibilitou pagamentos de dividendos altos e insustentáveis pelas direções da Petrobrás em 2021 e 2022. Ele observa que os lucros e dividendos distribuídos hoje, são frutos dos investimentos realizados no passado. Claro que aumentar a distribuição dos dividendos, em prejuízo dos investimentos, compromete os resultados futuros. Por isso tal política é insustentável. Conforme mostra o presidente da AEPET, em 2023, a Petrobrás, apesar de ter a menor receita entre seis gigantes do setor (Exxon Mobil, Shell, Total, BP, Chevron e Petrobrás), pagou o maior montante em dividendos. Isso já no governo Lula, que tem outra visão da empresa. Como contrapartida, a Petrobrás foi a petrolífera, entre as seis listadas, que realizou o menor investimento líquido: apenas 51% em relação à média das demais. O autor mostra que a relação na Petrobrás, entre dividendos pagos e investimentos líquidos, em 2023, foi 4,2 vezes superior à média praticada pelas outras petrolíferas.
A estratégia do governo Lula é diferente dos governos golpistas. A Petrobrás tem um papel na meta de reindustrializar e desenvolver o país. Não existe indústria sem energia. E petróleo é o centro da matriz energética no mundo, e vai continuar sendo por bastante tempo. Gostemos disso ou não.
Os dados de Felipe Coutinho mostram que o volume de pagamentos de dividendos é ainda muito elevado, em relação às necessidades de investimentos da companhia. Só tem sentido o Brasil ter uma “nação amiga” como a Petrobrás, se ela estiver ao serviço do povo brasileiro. Como se sabe, desenvolvimento econômico é uma “guerra”, não acontece por simples medidas técnicas e administrativas. Se dependesse dos países imperialistas, a Petrobrás jamais existiria e o Brasil estaria simplesmente exportando óleo cru para os países industrializados. Essa era a meta de Michel Temer, Paulo Guedes e assemelhados.
A medida do Conselho de Administração da Petrobras, de pagar apenas os dividendos mínimos e transferir o valor de R$ 43,9 bilhões, que seria distribuído de forma extraordinária aos acionistas, para a conta de reserva de remuneração de capital, foi correta. A empresa tem um plano pesado de investimentos, precisa de volumes imensos de capital nos próximos anos para realizá-lo. Essa reserva que começa a ser feita, vai possibilitar a obtenção de financiamentos melhores, ou possibilitar recorrer menos aos bancos. Além disso, se a empresa tem mais dinheiro em caixa, pode obter taxas de juros um pouco mais favoráveis, no país que tem a segunda taxa de juros real mais alta do mundo (atrás somente do México).
Em 2023 a Petrobrás bateu recordes de produção, aumentou investimentos, reduziu a dívida financeira e colocou em operação 4 novas plataformas. No ano passado também, a Petrobrás investiu US$ 12,7 bilhões, um crescimento de 29% em relação ao ano anterior. Além disso, a companhia pagou R$ 240 bilhões em tributos à União e demais entes públicos. Os lucros dessa eficiência operacional têm que ser colocados ao serviço do povo brasileiro e não encher o bolso de meia dúzia de especuladores. Parte deles, inclusive, que nem sabe direito onde fica o Brasil. Se calcula que os investimentos previstos no Plano Estratégico 2024-2028 da Petrobrás têm o potencial de gerar 280 mil empregos diretos e indiretos.
O petróleo existente no pré-sal já representa 78% da produção total da companhia. Se não existisse o petróleo do pré-sal, hoje o Brasil, possivelmente, estaria importando petróleo. Com Michel Temer e a nomeação de Pedro Parente como presidente da Petrobras, a empresa colocou os preços dos combustíveis lá em cima e passou a vender os ativos que podia, política desenvolvida completamente a serviço dos grupos econômicos privados. A política de distribuição de dividendos nos governos Temer e Bolsonaro era a própria distribuição do butim, do espólio do golpe de 2016. Para isso colocaram os preços dos derivados lá em cima, com reflexos sobre a inflação, ao mesmo tempo em que vendiam ativos estratégicos para favorecer os grupos que tinham apoiado o golpe.
A empresa vinha praticando política de distribuição de dividendos que nenhuma empresa de petróleo no mundo faz. Tornou-se uma empresa a serviço do grande capital especulativo, era uma festa. Por que qualquer coisa que a Petrobrás faça é alvo de tanto bafafá? Basicamente porque:
1º) se trata de petróleo: produto fundamental e maior causador de todos os conflitos bélicos nos últimos 150 anos e sem substituto no curto prazo como fonte de energia e matéria-prima da indústria;
2º) a Petrobrás é a maior companhia da América Latina, produzia em 2013, 2,3 milhões de barris de petróleo diários, tinha uma força de trabalho de mais de 45 mil trabalhadores (em 2013 era mais de 100 mil), opera em 25 países, tem lucro líquido de R$ 124,6 bilhões, foi a 4ª petroleira mais lucrativa do mundo no ano passado,
Entre as petroleiras estatais, no ano passado, a Petrobrás ficou em 2º lugar, atrás da saudita Saudi Aramco, que por sua vez ocupou a 1ª colocação entre as empresas que exploram petróleo, tanto privadas como estatais. A estatal brasileira é maior do que a economia de muitos países. Como já falou alguém: “a Petrobrás é uma outra nação. Felizmente é uma nação amiga”.
É bom lembrar do que falou Getúlio Vargas, que sofreu um golpe em 1954 (que o levou ao suicídio), em boa parte causado pela decisão de fundar a Petrobrás no ano anterior. Disse as seguintes palavras quando era senador, em 1947, defendendo o monopólio estatal de petróleo no Brasil: “Em matéria de petróleo, tudo o que a nossa imaginação sugerir é pouco em face do que pode acontecer”. Há que se observar que o barulho causado por uma simples decisão do governo, em relação a uma empresa na qual a União é sócia majoritária, revela como é estreita a margem de manobra política do governo atual.