Por Roberto Antonio Liebgott, para Desacato. info.
Em 27 de maio de 2021, o Comitê de Acompanhamento da Pandemia da Covid-19, realizou uma reunião virtual com as coordenações das Comissões e Câmaras Técnica dos Conselho Nacional de Saúde (CNS), para apresentar e debater os dados do relatório “Mapeamento e análise das normas jurídicas de respostas à Covid-19 no Brasil”, realizado por meio de parceria com o Centro de Pesquisa de Direito Sanitário (Cepedisa), da Faculdade de Saúde Pública (FSP), da Universidade de São Paulo (USP) e a ONG Conectas Direitos Humanos.
Os pesquisadores apresentaram os resultados da pesquisa nacional sobre as ações do governo no enfrentamento a pandemia e me pareceu evidente a intenção governamental em adotar, na pandemia da Covid 19, a estratégia da imunização de rebanho, o que é uma falácia, visto que imunização de rebanho se atribui ao controle de epidemias em animais. Em pessoas, a imunização é denominada de coletiva, ocorrendo somente através da vacinação, que aliás, vem sendo conduzida de forma precária e submetendo a população a uma agonia sanitária sem precedentes na história do Sistema Único de Saúde.
O governo Bolsonaro, que instituiu uma prática de governança através da antipolítica e, no caso da pandemia, ele a segue movido eminentemente pela preocupação de não investir recursos públicos, tanto humanos quanto econômicos, no enfrentamento e combate ao coronavírus, nem articular medidas de prevenção, proteção e tratamento. Também se esquiva quanto à garantia de recursos financeiros ao fortalecimento do SUS, a boa informação junto à população acerca dos cuidados e, com isso, abdica de desenvolver campanhas com uma boa e eficaz comunicação. Pelo que se pode notar, o governo opta, como estratégia, por ações desumanizadas e negacionistas e isso, ao que parece, não por ignorância.
Eu participei do encontro representando a Comissão Intersetorial de Saúde Indígena e tive a oportunidade de abordar a temática indígena. Destaquei, em minha breve explanação, as mais de mil pessoas que perderam suas vidas e o adoecimento de mais de 55 mil de, pelo menos, 170 povos. Também abordei aspectos relativos às inseguranças vivenciadas pelas populações indígenas neste período da pandemia:
- insegurança sanitária: pela falta de planejamento das ações, pela fragilidade da atenção básica, pela ausência de saneamento básico, pela precariedade das infraestruturas e das fragilidades das equipes, tendo em vista estarem constituídas de poucos profissionais de saúde diante das demandas;
- insegurança nutricional: no período da pandemia, as pessoas deixaram de ter acesso ao trabalho remunerado, à comercialização de produtos e foram impedidas até de circular pelas terras e nelas realizar a coleta de produtos, a caça e a pesca;
- insegurança territorial: o governo suspendeu as demarcações de terras e acabou com as políticas de proteção e fiscalização das áreas, propiciando um avanço avassalador de invasões de garimpeiros, grileiros, madeireiros e fazendeiros nas terras indígenas;
- insegurança física: dado que houve o incentivo do governo para que as terras fossem invadidas por milhares de pessoas, bem como pela fragilidade das ações de proteção e prevenção contra a pandemia.
Em síntese, os povos indígenas têm sido impactados pela perspectiva do governo em promover, nas ações em saúde, a antipolítica, fundamentada na desumanização e no negacionismo, desencadeando com ela, o que se pode denominar de incentivo ao genocídio.
Porto Alegre, RS, 01 de junho de 2021.
Roberto Antônio Liebgott é Missionário do Conselho Indigenista Missionário/CIMI. Formado em Filosofia e Direito.