A virada: vai ter preto sim!

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    A Virada Antirracista, realizada na Universidade Federal de Santa Catarina na tarde de terça-feira, 25, foi uma resposta em alto e bom tom contra o racismo vivenciado cotidianamente por estudantes, negros e negras. Foto: Rubens Lopes.

    Por Rubens Lopes.

    A Virada Antirracista que aconteceu na Universidade Federal de Santa Catarina na tarde de terça-feira, 25, foi uma resposta em alto e bom tom contra o racismo vivenciado cotidianamente por estudantes, negros e negras. Pichações recentes com mensagens homofóbicas e alusivas ao nazismo na sala Quilombo, espaço de encontro dos estudantes, trouxeram à tona o debate. Um ataque simbólico, mas que carrega em si o ódio daqueles que não aceitam a diversidade. Ódio que se fez agressão. Durante um ato no Restaurante Universitário (RU), no mesmo dia do evento, um estudante branco jogou água e cuspiu comida em duas estudantes negras e agrediu uma delas com um tapa no braço. Como forma de resistência e de denúncia negros e negras fizeram a Virada que contou com roda de conversa, aula pública, oficinas e apresentações culturais.

    Jayro De Jesus, teólogo da tradição de Matriz Africana abriu a roda de conversa com um canto em saudação a Ogum. Corpos dançantes tomaram o varandão do Centro de Comunicação e Expressão. Por um instante a festa se fez luta e seguiu-se o debate. Jayro criticou a universidade como um espaço racista e de apropriação cultural. Ressaltou a importância de descolonizar os saberes e valorizar a cosmogonia do povo negro.

    Yérsia Souza, estudante de ciências sociais, questionou o papel da universidade na construção de um pensamento hegemônico que reforça uma visão estereotipada do negro. Reforçou a fala de Jayro para que os estudantes, negros e negras, estudem para romper com essa lógica. Citou o intelectual Manoel Bonfim, que se debruçou sobre a realidade latino-americana, como referencial teórico para compreender o lugar do povo brasileiro no mundo.

    Débora Caroline, estudante de psicologia, relatou situações de racismo na sua trajetória de mulher negra na universidade. “Nas salas de aulas a batalha é mesma, os professores trazem autores eurocêntricos que não dão conta da complexidade de nosso povo. Por isso, pretas e pretos, estudem os intelectuais que falam sobre nosso povo, leiam as autoras e autores negros para questionar os professores”.

    O que ficou visível nas três primeiras falas foi que a presença desses estudantes traz consigo uma herança de luta, ancestralidade e saberes que questionam as velhas estruturas que mantêm o sistema capitalista. Coloca em evidência um país marcado pelo racismo e a luta de classes. Claro que há uma transformação à medida que esses espaços ditos democráticos são ocupados por aqueles que viveram marginalizados na totalidade do processo histórico do Brasil. Quando essa presença negra e também indígena assoma na universidade provoca espécie àqueles que vêm seus privilégios ameaçados. Têm sido assim historicamente.

    Prova disso foi o outro ponto debatido na Virada Antirracista: O Haiti. Mikirson Altenor, haitiano, falou sobre “a história escondida da revolução negra” e as contribuições para entender o movimento negro hoje. A Revolução Haitiana, também conhecida por Revolta de São Domingos (1791-1804) foi um período de conflito brutal na colônia de Saint-Domingue, onde os negros sairiam vitoriosos, o que contribuiu para a eliminação da escravidão em todo o continente Latino-Americano e a independência do Haiti como a primeira república governada por pessoas negras. Para Mikirson, conhecer a história da revolução haitiana é saber da importância histórica desse país para emancipação do povo negro e compreender os verdadeiros motivos porque, hoje, seu país é relegado ao esquecimento (desconhecimento) e à miséria imposta pelos poderosos.

    A Virada continuou com oficinas de Hip-Hop, turbantes, apresentações culturais e Sarau. A despeito da chuva que insistia em cair se fez Ubuntu, todas/os unidos pelo bem viver do povo negro. Denunciou o racismo na UFSC e mostrou que os estudantes, negros e negras, estão preparados para enfrentar os ataques no campo das ideias e na luta cotidiana. Gritam para se fazerem escutar: Vai ter preto, sim!

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    A Virada contou com oficinas de Hip-Hop, turbantes, apresentações culturais e Sarau. Foto: Rubens Lopes.

    Fonte: IELA.

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