Por Juca Guimarães.
O rap é o ritmo musical mais indicado para manifestações ideológicas e confronto de discursos conservadores. Libertário, o hip-hop foi a linguagem que a rapper JuPat, de 34 anos, encontrou para se expressar em relação a sua mudança de gênero ocorrida nos últimos seis anos, coincidindo também com o fim um relacionamento hétero que durou dez anos. O resultado é o álbum “Toda Mulher Nasce Chovendo”, lançado nesta sexta-feira (1º de junho), dia em que acontece a 1ª Marcha do Orgulho Trans, em São Paulo.
JuPat nasceu em Ribeirão Preto e mora em Piracicaba. Ela conta que começou a ouvir rap aos 13 anos, como todo garoto que gostava de skate e saia de rolê com os amigos. A transição de gênero foi acontecendo em diversas camadas e ritmos diferentes.
“Fui aos poucos transformando minhas roupas e meu corpo, bem gradualmente, num processo lento, me sentindo mais livre em relação à expressão de gênero, à medida que ia afirmando minha identidade. depois fui trabalhando essa transição com outras pessoas próximas, amigos, família. Até que no começo do ano passado veio um movimento mais forte de efetivamente me posicionar como mulher”, diz.
O posicionamento corajoso de se revelar como realmente sente abriu caminho para a processo de criação do álbum. Antes ela fazia alguns raps, estava atenta aos lançamentos e evolução do ritmo. No entanto, a necessidade também de se expressar foi ficando mais forte.
“O rap foi minha muleta, foi a forma que eu encontrei de extravasar toda a existência que estava transbordando e que precisava ir para algum lugar”, diz.
Nessa mudança toda, a rapper encontrou apoio da ex-companheira Denise, que a acompanhou o passo a passo do processo. A família de JuPat também foi compreensiva de certo modo. “Com a família foi mais delicado. Parte compreendeu e hoje apoia. Outra parte, tem mais dificuldade e ainda está processando e trabalhando no seu ritmo. Tenho consciência que não passei pela realidade enfrentada pela maioria da população trans, que é o completo abandono por parte da família”, diz.
Vivendo no país onde mais se mata trans, a rapper JuPat tem consciência que, mesmo com as músicas mais intimistas e pessoais, está falando sobre questões que refletem uma árdua luta por reconhecimento de amplos direitos para uma parte significativa do país. Como mulher, ela também luta contra o machismo.
“É uma luta diária por existir. Mas não me vejo em outro caminho que não seja este. Existir da forma mais plena, livre e fiel a si mesma”, diz.
A rapper já lançou u vídeoclipe da música “Transe”. O álbum tem 13 faixas, que misturam vários estilos e influências, como “introbiografia”, “Maré Alta”, “A terra quer meu corpo”, “Corpo Inabitável”, e “O Circo”.
Segundo dados de ONG europeia Transgender Europe, o Brasil é o país que mais mata pessoas transexuais no mundo. Entre 2008 e 2016, 868 travestis e transexuais foram assassinados.