Por Brigadas Populares de Santa Catarina. O recente licenciamento do projeto de hotel de 18 andares na Ponta do Coral deixa claro que, quando se trata dos interesses da cidade-empresa, a prefeitura de Florianópolis não vê limites legais. O canetaço em favor da construtora Hantei traz uma série de irregularidades e desmandos, como mostra o vereador Lino Peres¹. Ignora pareceres do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Fundação Catarinense de Cultura (FCC), Superintendência do Patrimônio da União (SPU), Ministério Público Federal (MPF) e posições da academia.
Passa por cima do Plano Diretor e do Estatuto das Cidades, ferindo a Constituição. Aceita como legítima uma posse repleta de contrariedades. E ainda desmente o que os próprios prefeito Cesar Souza Júnior e secretário Dalmo Vieira afirmavam em outros momentos. O primeiro quando era ainda candidato, nas eleições de 2012, e o segundo enquanto ocupava o Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (IPUF) no ano anterior.
Um raro pedaço de terra com acesso ao mar da baía-norte, a Ponta do Coral é um caso emblemático de resistência social na cidade desde a década de 1980, quando o primeiro projeto de hotel de luxo foi barrado pela mobilização do povo, que ainda ocupou o espaço com atividades culturais, educativas e artísticas³.
Diante do histórico de autoritarismo e total desrespeito às leis ambientais e de planejamento urbano, uma nova vitória só virá se voltarmos a envolver a população na luta e transformar a Ponta do Coral em 100% pública na marra. Apesar de fundamentais, os recursos institucionais e jurídicos não conquistaram nada sozinhos – a organização popular é o fator determinante agora, como foi na década de 80.
Neste sábado, dia 21, a partir das 14h, teremos já uma importante prova de fogo. Acompanhe o evento no Facebook: http://migre.me/oGU6u. Todos e todas para o Enterro dos Ossos da Hantei e do Prefeito!
Proprietários duvidosos
Além dos seríssimos danos ao meio ambiente e à pesca artesanal; dos impactos paisagísticos e de mobilidade urbana; a construção do hotel legitimaria uma propriedade com, no mínimo, uma série de desvios legais. A Ponta do Coral consegue ser síntese de um histórico de apropriação de terras em Florianópolis, envolvendo grandes construtoras e especuladores aliados aos políticos da elite local.
A longa trajetória jurídica do terreno carrega mistérios até hoje. Em 1929, foi vendida para os gringos da Standard Oil utilizarem de depósito de combustíveis. Trinta anos depois, o governo do Estado readquire o terreno, quando já funcionava um abrigo de menores. Nas décadas seguintes, com a especulação imobiliária cada vez mais acentuada, o terreno tornou-se cobiçado por construtoras e grandes investidores.
Em 1980, as instalações do abrigo de menores foram destruídas por um incêndio intencional criminoso. Dois meses depois, o então governador Jorge Bornhausen abriu processo licitatório para a venda do terreno e no final do ano a empresa Nova Próspera Mineração, de Criciúma já era a nova proprietária da Ponta do Coral por uma quantia equivalente hoje a irrisórios R$ 4,1 milhões. O novo dono logo tentou construir um hotel de luxo no local, mas foi barrado pela Fatma, pela Capitania dos Portos e pelo povo que se organizou para protestar contra a venda mais do que suspeita.
Em 1991, o terreno foi envolvido em um empréstimo da Nova Próspera Mineração junto à Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), que na época ainda era a estatal fundada por Getúlio Vargas. O empréstimo nunca foi pago, a CSN foi privatizada em 1993 e, com a morte de Realdo Guglielmi, dono da mineradora, a posse do terreno caiu no colo de sua viúva: Maria Bernadette Pinho Moreira Guglielmi, irmã do atual vice-governador e presidente estadual do PMDB, Eduardo Pinho Moreira. Nos anos 2000, a família Guglielmi firmou parceria com a construtora Hantei, que pretende construir um hotel de luxo a qualquer custo.
A alternativa necessária
O povo de Florianópolis não só rejeita a privatização da Ponta do Coral, o ataque ao meio ambiente e ao espaço urbano, mas também oferece alternativa: o Parque Cultural das 3 Pontas. A proposta está estruturada em torno da valorização e conservação dos ecossistemas marinhos e terrestres; da melhoria da qualidade de vida da população; e do resgate da cultura da região4.
A luta pela expropriação do terreno e transformação da região das três pontas em parque 100% público faz parte da luta pelo direito à cidade, contra a privatização de Florianópolis. Sabemos que as leis de zoneamento são flexivas ao avanço do capital. Somente a organização popular pode conter o avanço da cidade-empresa.
A Ponta do Coral pertence ao povo! Hotel é para poucos, parque é para todos!
Brigadas Populares de Santa Catarina – BPs-SC
Fevereiro de 2015
¹ http://www.professorlinoperes.com.br/pagina/349/hotel-eacute-para-poucos-a-ponta-eacute-pa
² Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Fundação Catarinense de Cultura, Secretaria do Patrimônio da União, Ministério Público Federal.
³ https://parqueculturaldas3pontas.wordpress.com/documentacao/historico/
4 https://parqueculturaldas3pontas.wordpress.com/parque-cultural-das-3-pontas/
Foto: Reprodução/Brigadas Populares
Fonte: Brigadas Populares.org.br