Por Arnobio Rocha.
“Nem foi tempo perdido;
Somos tão jovens,
tão jovens,
tão jovens”.
(Tempo Perdido – Legião Urbana)
Hoje, estávamos no Twitter, Marinilda, Ricardo Queiroz (Klaxon SBC) falando sobre a perda da inocência, em particular a política, principalmente quando determinados eventos traumáticos acontecem, aí entrei numa viagem nostálgica ao ano de 1989, que passo a relatar.
O ano de 1989 foi longo demais, o meu então quase não teve fim, aliás desconfio que algumas vezes ainda vivo naquele ano. Naquela época, todos nós íamos tomar poder, era certeza, nosso pequeno agrupamento, Coletivo Gregório Bezerra(CGB), formado por antigos coletivos estaduais que romperam com o PCB entre 79 e 83, especialmente quando Prestes lançou a famosa “Carta aos Comunistas”, vivia um momento especial, depois de longa jornada, fez um congresso de unificação nacional, para construir o Partido da Revolução.
Liderados pelo Coletivo Estadual de Goiás, com os melhores quadros, experiência e estrutura, o conjunto de teses teve sua aprovação final em 15 de Janeiro de 1989. Logo ali, a tática eleitoral, era legalizar o pequeno Partido da Libertação Proletária(PLP), lançando inclusive um candidato à Presidente, naquela que seria a primeira eleição geral, desde 1960. Convictos de que o PT já traíra a Revolução, nós iríamos incendiar os debates e rumar para tomado do poder. Bem, não éramos nada modestos, a certeza era inabalável.
Um pequeno problema surgiu, o nome PLP já tinha registro no TSE, criou-se um impasse, o que fazer, a tática da candidatura foi para o vinagre. Num duro debate interno houve uma divisão no Comitê Central, uns(maioria) apoiavam o voto Nulo, outros(minoria), voto crítico em Lula, vejam só, em pleno ano de 1989. Como era uma maioria precária, decidiram consultar às bases, convocando uma conferência em Agosto de 1989. Um longo e desgastante debate nacional começou ali.
Paralelo a isto, na vida real, todo o leste europeu se sublevava, movimentos em todos os países, nós, herdeiros do PCB, pró-URSS, imagina um samba do crioulo doido, Revolucionários no âmbito nacional, reacionários no mundo, era uma contradição insolúvel, mas a voz interna, era que aquilo tudo era “reforço ao socialismo”, apoiávamos a Glasnot e a Perestroika com fervor, um camarada chegou a dizer, que bom não era Gorbachev, bom mesmo era o Camarada Yeltsin, um Lênin, prefeito de Moscou. Até a China se levantou com os jovens na Praça Tianan Men, massacrados pela burocracia.
Mais ainda de vida real, o PT costurou uma ampla aliança da Esquerda com PC do B, CUT, MST e atraiu, que pecado para nós, PSB, do “burguês” José Paulo Bisol. Exceto o falido PCB que manteve o Roberto Freire como candidato, para nós Brizola era de Direita, toda a esquerda estava alinhada com Lula. Mas nós estávamos discutindo, voto crítico ou nulo, com uma firmeza ideológica que impressionava.
O recalcitrante debate levou-nos ao apoio crítico ao Lula, com maioria significativa na base, ou seja, o CC, não representava o que pensava a Organização. Mesmo com esta efervescência do leste europeu, o auge do sindicalismo combativo no Brasil, um partido de base operária, com direção centrista, nós rumávamos para o “paraíso” com nossa santidade ideológica. Muitas críticas que se faz hoje ao PT, aquele grupo fazia, um esquerdismo sectário, que não levaria a lugar algum.
A maioria(no CC) e Minoria(na Base), fez uma pequena manobra ao final da conferência, que apoiou o voto crítico em Lula, ela aprovou unânime(tolice nossa da maioria(na base) e Minoria(no CC)) de que se qualquer candidato burguês viesse a apoiar Lula, num eventual segundo turno, o PLP votaria nulo. Naquela época, 15 de Agosto de 1989, Lula não passava de 3 ou 4%, com ampla pulverização de votos/candidatos, nem nós acreditávamos que ele subiria e chegaria ao segundo turno. Enfim, aceitamos aquele adendo à resolução do voto “crítico” em Lula.
A dura campanha eleitoral levou Lula a um segundo lugar, pequena margem em relação ao Brizola, a onda do Leste Europeu culminou com a queda do Muro, antes ainda do Primeiro turno da eleição presidencial. Esta onda não atingiu o PT, partido que se construiu longe do apoio à URSS, aliás, muitos grupos eram francamente contra, outros tinham reverência no Solidariedade Polonês, ou seja, não colaria em Lula a pecha de que o “comunismo” ruiu, pois o PT era identificado com o Socialismo com Democracia, seja lá o que isto significasse.
Com a ida de Lula ao segundo turno, contra um candidato da Direita, forjado pela Globo em particular, era um sonho deles, jovem, com boa imagem, falava bem, contra aquele carrancudo petista. Era apenas trabalhar firme para não vacilar. Porém, praticamente todos os partidos de centro e centro-esquerda, optaram por Lula, Brizola, Covas, Ulisses, Freire, uma frente ampla. Óbvio que no nosso meio caiu como uma bomba. O pequeno PLP se dividiu de cima abaixo, irreconciliável, o CC não teve coragem de impor o voto nulo, mas ao mesmo tempo não enfrentou o debate do Voto em Lula.
A ruptura se deu ainda antes do segundo turno, aquilo foi um duro golpe em todos nós, a camaradagem construída por quase 10 anos, se perdeu, até as relações de amizades foram juntas. Aqui foi a primeira perda real da inocência sobre Partido e Organização que tive, marcou não apenas a minha vida, mas a de todos nós, a imensa maioria com menos de 20 anos de idade, aguerridos, sectários e radicais. Naquele ano tinha mudado do Ceará para São Paulo, por opção de vida e política, em 3 meses aconteceu tudo isto.
PS: Votei no Lula (89, 94, 98, 2002, 2006), mas perdi ali a “inocência”. Ainda militei no que sobrou do PLP, um agrupamento chamado PFS, depois PSTU, mas aí, já foi outro duro aprendizado.
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