A morte de Marielle e as ameaças das milícias digitais

Foto: Reprodução da internet

Por Álvaro Miranda.

Evidente que não é normal essa situação nas redes sociais em que, diante de qualquer crítica, observação, comentário ou o que seja sobre comportamentos, anúncios e intenções do governo – ou mesmo a livre manifestação sobre qualquer coisa -, milicianos digitais fiquem fazendo ameaças de morte às pessoas ao flagrante estilo do banditismo mais tipicamente qualificado.

Esses indivíduos precisam ser identificados, caçados e submetidos às penas da lei. Os covardes que se passam de valentões e truculentos em perfis camuflados e bizarros do Twuitter ou do Facebook precisam ser capturados pela polícia e processados. Ou algum sistema centralizado de robôs digitais espalha essas ameaças? Se for isso, os responsáveis precisam ser rastreados, pegos, processados e punidos severamente. Questão de ordem pública.

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Nesse contexto não é normal também o filho do presidente da República, deputado federal, ir visitar o pai no hospital, exibindo uma pistola na cintura e posar para fotos como se isso fosse a elegância da maior fidalguia de um representante eleito. Ao fazer isso, o personagem pretendeu o quê, afinal? Ameaçar quem? O Brasil inteiro? Ou se sente ameaçado por alguém e precisa andar armado? Quem não se ofende com um comportamento desses de um político eleito?

Quem o ameaça, deputado Eduardo Bolsonaro? Ou quem o senhor está ameaçando? Se se sente ameaçado, precisamos investigar e identificar o autor de eventuais ameaças. Representantes eleitos não podem ser ameaçados. Assim como juízes, vereadores, policiais, empresários, estudantes, trabalhadores, ninguém pode ser ameaçado ou assassinado como se isso fizesse parte da rotina de riscos dos agentes públicos ou de quem quer que seja.

Para além de uma análise comportamental e psicológica do deputado e de outros, a reflexão nos leva à necessidade de apurar o que esse clima de ameaças tem a ver com o assassinato da vereadora Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes. Não se trata de um fato restrito ao Rio de Janeiro – e nem é um crime comum. É uma questão nacional – cívica e civilizacional.

O crime, cujos mandantes continuam soltos, representa um verdadeiro sapo que ainda não desceu pela garganta da República. Sapos dessa natureza não se digerem nunca porque ninguém tem o direito de interromper a vida de ninguém. Mas podem ser “resolvidos”, como se diz na linguagem investigativa.

O assassinato da juíza Patrícia Acioli, em 2011, foi esclarecido, simples assim, com a prisão de todos os envolvidos, inclusive o mandante. Além da dor pela morte de Marielle e Anderson Gomes, o episódio constitui uma ameaça a toda sociedade e à democracia. Por isso – e pela dor de parentes e amigos – precisa ser resolvido.

Enquanto o crime não for esclarecido, ilações estarão presentes no ar sobre a possibilidade de ter sido praticado por pessoas próximas, de uma forma ou de outra, à família de Bolsonaro. É o que se fala nas redes sociais e nos bastidores de maneira cada vez mais crescente. Se isso se confirmar, pode ser até que os milicianos digitais também venham a ser identificados e devidamente processados.

Evidente também que é flagrante a anormalidade desse clima marcado pela violência física e ostensiva, com metais, chumbo e palavras, e a violência camuflada, simbólica. Esta última se processa, por exemplo, na grandiloquência mentirosa de números e discursos que tentam justificar a necessidade da destruição da previdência pública.

Violência essa promovida pelos grandes meios de comunicação hegemônicos que acabam chancelando e legitimando a corrupção legalizada da evasão de divisas, das dívidas trabalhistas e previdências e tantas outras formas de descalabro.

Se as ilações sobre o assassinato da vereadora do Rio de Janeiro não incomodam o presidente da República, então a anormalidade é mais grave ainda. O previsível e esperado, numa situação de normalidade (mais do que democrática: civilizacional) seria o presidente da República empreender todos os esforços inimagináveis para esclarecer o crime.

O normal seria o presidente vir a público e se posicionar, cobrando resultados dos responsáveis pelas investigações. Uma autoridade com pulso e honesta, que nada deve ou teme, chama seus subordinados e manda essa: quero os responsáveis pelo crime presos! Pronto. E dá um prazo. Não estamos falando de uma gincana de criancinhas. Pessoas foram mortas.

Afinal, Bolsonaro não foi eleito com a bandeira contra a corrupção e para combater a violência e o banditismo? O que há de errado então? Seus eleitores apoiam o banditismo? Uma polícia e um Ministério Público tão competentes e equipados que já prenderem até ex-presidente da República não conseguem esclarecer o assassinato da vereadora? Quais são os obstáculos para isso?

As nuvens do obscurantismo espalham essa gosma malcheirosa de anormalidade no ar. Além das ameaças individualizadas pelas redes sociais, há uma espécie de ameaça constante, vinda de cima, centralizada, atuando de maneira difusa, contra todos, que é o espectro da exceção a cada momento. Eu me sinto ofendido todos os dias!

Não é nem a ameaça de golpe de estado, pois este, quando se consuma, em qualquer situação e circunstâncias, se transforma em fato manifesto e atores identificados em seus atos públicos. E, obviamente, com suas inevitáveis consequências de reação e conflito.

Pessoas de bem se expõem, pois não têm o que esconder – é assim na democracia. Tem sido assim nas redes sociais. Cadê e quem são esses bandidos valentões que espalham ameaças? O pior de tudo é esse clima de ameaça perene a toda sociedade, cujo símbolo maior é a sucessão de fatos e cenas incomuns, a exemplo do assassinato da vereadora, de forma flagrante e sórdida, com a pretensão de impunidade, como quem diz: olha o que somos capazes de fazer!

Ou, como no exibicionismo do filho do presidente, arma na cintura, com a maior cara de pau e arrogância. Que o saibamos, Eduardo, o senhor é deputado federal, e não leão de chácara ou bandoleiro! Isso não são modos de um parlamentar. O astrólogo-dizem-que-é-filósofo lá da Virgínia defende esse tipo de comportamento? Que pensador esse, heim?

Isso tudo, sem falar das agressões e das ameaças aos estratos mais pobres das favelas e periferias. Estes já estão sofrendo na pele, todos os dias, as violências mais atrozes, como a morte da menina Ághata, semana passada, no Complexo do Alemão. A violência e o ódio contra os pobres são tão graves – e a morte da pequena Ághata mais ainda pela dor de seus pais, familiares e amiguinhos – quanto à ameaça institucionalizada do bandidismo contra a democracia.

Vamos deixar que o governo nada faça contra esse banditismo? E vamos deixar esse banditismo avançar até quando?

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