A medida provisória nº 746 e sua proposta de reforma para o ensino médio: Algumas ponderações

Por Willian Simões.

O presente texto objetiva contribuir com momentos de diálogo e debate com a sociedade no oeste de Santa Catarina, em torno de uma proposta de Medida Provisória (MP 746/2016) que altera significativamente parte do texto da LDB 9.394/96 que, por sua vez, impactará diretamente sobre a organização pedagógica, financiamento e oferta de Ensino Médio (EM) no país. Sua aprovação resultará em mudanças, certamente nos processos de formação inicial e continuada de professores. Cabe salientar que a proposição de texto para esta MP por parte do atual governo federal não é resultado de um amplo e democrático diálogo com a sociedade e não leva em consideração o acúmulo de conhecimentos e experiências desenvolvidas nos últimos 15 anos, visando qualificar a pesquisa, o debate e o trabalho em torno dos desafios do Ensino Médio no Brasil1 .

Destacamos que a existência de muitos avanços está disposta desde as Diretrizes Nacionais para a Educação Básica; a perspectiva de Ensino Médio Integrado; o programa Ensino Médio Inovador; o Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio, entre outros. Tais avanços, saberes e experiências acumuladas foram descartados, por isso podemos considerar que tal MP se propõe a uma ruptura com movimentos trilhados, sobretudo nos últimos quinze anos de história no campo das políticas públicas educacionais voltadas para o EM2 .

Entre os argumentos utilizados por aqueles que estão propondo e defendendo a MP está que o EM é um fracasso em termos de desenvolvimento educacional, sendo muito enciclopédico, acarretando em sobrecarga desnecessária de estudos, por isso se configura na atualidade como um percurso formativo enfadonho e sem sentido, o que segundo esses defensores corrobora, por exemplo, com os baixos índices de desenvolvimento educacional (IDEB), taxas elevadas de abandono e reprovação. Para esses defensores, o EM precisa ser mais dinâmico, enxuto e flexível, oportunizando ao estudante a escolha de seu itinerário formativo.

Cabe destacar que, junto a isso, entidades parceiras a este governo (resultado de um golpe 1 Nota pública da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED), publicada em 23/09/2016 afirma que “a MP fragiliza o princípio do Ensino Médio como direito de todo cidadão a uma formação plena para a cidadania e o trabalho, abre canais para mercantilização da escola pública e evidencia a face mais perversa do golpe contra a sociedade brasileira, os estudantes, seus professores e a educação pública”. 2 Neste momento, 29/10/2016, contamos com a ocupação de mais de 1.000 estabelecimentos de ensino (escolas de Educação Básica, Institutos Federais e Universidades Públicas) em todo o Brasil.

Em entrevista realizada para publicação no site da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, o Prof. Dr. Salomão Ximenez, da Universidade Federal do ABC, afirma que “existe uma característica em comum entre as reformas propostas em São Paulo, em Goiás – que levaram às ocupações no passado – e, agora, a Medida Provisória; são mudanças radicais, seja na estrutura curricular, seja na estrutura de oferta de vagas escolares. No caso de São Paulo, inclusive com fechamento de escolas, remanejamento de 750 mil estudantes, que era o que se esperava. No caso de Goiás, mudança na própria natureza jurídica das escolas, com a entrega da gestão para Organizações Sociais” – chegando a 70% de professores contratados por estas organizações. Disponível em:

http://www.epsjv.fiocruz.br/noticias/entrevista/oobjetivo-do-governo-e-desmobilizar-por-todos-os-meios-o-movimento-de-ocupacao, acesso em 29/10/2016. constitucional), ligadas à iniciativa privada, defendem que o EM precisa estar mais articulado ao mercado de trabalho e suas regras 3 . No entanto, torna-se importante alertar que tais argumentos reproduzidos sistematicamente por governantes e pela grande mídia de modo positivado não podem substituir a leitura e reflexão sistemática do documento, que nos permite constatar outras facetas deste processo, cujos desdobramentos ampliarão, segundo nossas reflexões, ainda mais, o abismo existente entre a formação humana/escolarização para ricos e pobres – que por sua vez acirrará a divisão de classes em um país marcado por uma ampla desigualdade econômica e social. Cabe destacar, também, nesse contexto histórico vivenciado diuturnamente, que determinadas medidas que estão sendo tomadas irão corroborar com a precarização proposital do trabalho/poder público – reforçada com os futuros efeitos da PEC 241, com as privatizações e as reformulações da gestão e o uso dos recursos oriundos do Pré-sal, entre outros, que servirá de argumento para ampliar ainda mais as relações público-privadas tanto para administrar escolas quanto para agenciar a contratação de docentes e fornecer-lhes pacotes de formação inicial e continuada de professores4 .

Assim, as sínteses-destaques que seguem resultam de leitura e estudo coletivo do texto da MP n. 746 de 22 de Setembro de 2016 (minuta que já sofreu, até meados do dia 07/10/2016, cerca de 500 sugestões de emendas). Trata-se, simplesmente, de algumas ponderações, uma nota técnica inicial-parcial cujo objetivo é potencializar o debate e instigar reflexões acerca dos possíveis cenários: 1.

O Art. 24 da Lei 9.394/96 delibera regras comuns a respeito da organização da oferta de Educação Básica, nos níveis fundamental e médio. O texto original do Inciso I do referido artigo estabelecia que “a carga horária mínima anual será de 800 horas, distribuídas por um mínimo de duzentos dias de efetivo trabalho escolar, excluído o tempo reservado aos exames finais…”. É importante salientar que, neste caso, o Ensino Médio “hoje” totaliza 2.400 horas de formação/escolarização.

A MP aqui em análise propõe que, no Ensino Médio, essa cargahorária pode ser ampliada em até 1.400 horas-ano. Tal medida anima ao fazer parecer que os sistemas de ensino poderão ampliar em até 600 horas-ano o tempo de permanência dos estudantes neste nível de ensino, em atividades de estudos científicos, culturais e artísticos 3 Relatório da Profa. Dra. Mônica Ribeiro, da Universidade Federal do Paraná, referente a audiência pública do Ensino Médio, realizada na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, diz que segundo a fala de representação da Confederação Nacional da Indústria (CNI):

“o Ensino Médio precisa se adequar ao mercado de trabalho para que o Brasil possa ter estoque populacional para atender o desenvolvimento econômico” do país. Disponível em:

https://avaliacaoeducacional.com/2016/10/05/monica-ribeiro-relata-audiencia-publica-do-ensinomedio/, acesso em 20/10/2016. 4 Prof. Dr. Luciano Mendes, da UFMG, destaca em suas reflexões publicadas a preocupação com a privatização da escola pública por meio de contratos com as chamadas “organizações sociais” que passam a assumir funções de gestão ou de caráter político-pedagógica, que se colocam como “sem fins lucrativos” para a sociedade, captam “recursos tanto na área pública como na iniciativa privada, via filantropia” e acabam retirando ainda mais a responsabilidade do Estado em garantir políticas educacionais que defendam uma educação pública, emancipatória e com respeito aos estudantes e trabalhadores da educação (e seus direitos constitucionais).

São exemplos destas organizações: Fundação Lemann; Instituto Airton Senna; entre outros. Ver publicação completa em: https://avaliacaoeducacional.com/2016/10/26/luciano-mendes-sobre-os-novos-parceiros-do-mec/, acesso em 22/10/2016. etc., como vislumbramos em debates em torno da oferta de Ensino Médio em tempo integral – a exemplo das experiências de Ensino Médio Inovador (esta possibilidade torna-se cada vez mais inviável, diante dos muitos desdobramentos da PeC 241). A questão é que o Ministério da Educação anunciou que apenas um pouco mais de 560 escolas em todo o Brasil terão essa configuração e se tornarão escolas de referência. No estado de Santa Catarina, o atual secretário de Estado da Educação anunciou que 30 escolas adotarão essa medida logo de imediato – quando da aprovação da BNCC.

Assim, não haverá escola de tempo integral para todos – com laboratórios, quadra de esporte, biblioteca, currículo pleno e dinâmico, entre outros – assim como podemos considerar que seu público também será selecionado, uma vez que a realidade brasileira tem sinalizado que parte significativa da juventude precisa inserir-se no mercado de trabalho5 . 2. A referida medida, ao propor mudanças no Art. 36, inserção de §6º, cujo texto diz “A carga horária destinada ao cumprimento da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) não poderá ser superior a mil e duzentas horas da carga horária total do ensino médio”, nos permite constatar uma redução em 50% o tempo de formação dos estudantes e de atuação docente no que se refere aos conhecimentos/conteúdos escolares que historicamente estiveram presentes na escola e são de direito de todos.

Neste caso, os componentes curriculares da BNCC terão carga-horária de 400 horas-ano para o trabalho com os conhecimentos/conteúdos científico-escolares. Se somarmos o fato de que a prioridade e a obrigatoriedade para os três anos de EM recai apenas para os componentes de Língua Portuguesa e Matemática, teremos tensões instaladas, uma vez que, de imediato: 2.1 Haverá redução da demanda por docentes (pode piorar se, seguindo essa tendência, a contratação seja feita por área do conhecimento e não mais por área de formação específica); 2.2 Haverá redução do tempo de estudo a respeito do total dos conhecimentos/conteúdos das áreas dispostas na BNCC. Cabe destacar que, com a carga-horária proposta “hoje”, já seria muito difícil cumprir o que tem sido proposto pela BNCC, seus direitos e objetivos de aprendizagem.

A realidade sinalizaria para a necessidade de compartimentação/simplificação extremamente perigosa, fragilizando e precarizando ainda mais a perspectiva de formação humana integral em um mundo ancorado em pressupostos capitalistas, uma sociedade de classes amplamente desigual. 3. Medidas que levam à fragilização/precarização é possível ser observada ao longo do texto proposto para esta MP, a exemplo: 3.1 O Art. 26 da LDB 9.394/96 dizia que “os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte diversificada”.

A MP aqui em análise propõe modificações significativas, tais como: 3.1.1 O texto delibera que “o ensino de arte, especialmente em suas expressões regionais, constituirá componente curricular obrigatório da educação infantil e do ensino fundamental”. Neste caso, podemos compreender que “o ensino de arte”, hoje 5 Segundo dados do IBGE (2012), cerca de 3,7 milhões de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos se inseriram (ou já estavam inseridos) no mercado de trabalho em 2011. ofertado como componente curricular, poderá ter sua oferta alterada (exluída? ofertada de outra forma?) do Ensino Médio.

É preciso destacar que o texto original da LDB 9.394/96, em seu Art. 36, que trata especificamente sobre o currículo do Ensino Médio, trazia como uma de suas diretrizes que os currículos deviam considerar “a compreensão do significado da ciência, das letras e das artes”. Na segunda versão do texto da BNCC, Artes é um dos componentes da Área de Linguagens, mas corre o risco dos sistemas de ensino não a ofertarem nas escolas. 3.1.2 O texto original da LDB 9.394/96, em seu §1º do Art. 36 deliberava que “os conteúdos, as metodologias e as formas de avaliação serão organizados de tal forma que ao final do ensino médio o educando demonstre” (uma espécie de perfil do egresso): “III – domínio dos conhecimentos de Filosofia e de Sociologia necessários ao exercício da cidadania”.

Sabemos muito bem que, nos últimos anos, Filosofia e Sociologia voltaram a integrar a matriz curricular do EM. No entanto, o texto proposto para a MP exclui a obrigatoriedade de oferta destes componentes6 . Sua oferta ou não como um componente curricular será definida pela versão final da BNCC. Se haverá ou não inclusão futura como componente obrigatório, essa decisão, segundo a MP, será do MEC em diálogo com o CONSED e UNIME – a população, a comunidade escolar, não estão oficialmente incluídos no diálogo. 3.1.3 Nos três anos de EM, conforme o texto proposto pela MP para o § 9º, somente língua portuguesa e matemática serão obrigatórias nos três anos – tal fato indica preocupação maior com avaliações de larga escala. 3.1.4 Na proposição de § 8º, do Art. 36, a obrigatoriedade da oferta apenas da língua inglesa, em detrimento da possibilidade de opção em outras línguas, a exemplo da língua espanhola, também é motivo de questionamento.

Como faremos com as escolas de fronteira, cujos estudantes transitam entre países de língua espanhola? Daremos, mais uma vez, as costas à América Latina, aos países vizinhos do Mercosul? E a pluralidade linguística em um país pluriétnico como o Brasil?7 3.1.5 No que diz respeito à Educação Física: o texto proposto pela MP, § 3º, altera o original da LDB 9.394/96. No texto original desta LDB a Educação Física era prevista no ensino fundamental e médio como componente obrigatório. Na MP, o texto trata que 6 A Associação Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Letras e Linguística, em nota de repúdio à MP, publicada em 06 de outubro de 2016, corrobora com nossa compreensão ao afirmar que: “a proposição de itinerários formativos que flexibilizam o acesso a conhecimentos das ciências humanas e sociais, possibilitando que conteúdos curriculares de áreas de Filosofia, Sociologia, Educação Física e Artes sejam simplesmente excluídos do currículo, minimizam o papel do Ensino Médio na formação de jovens capazes de (inter)agir de forma mais crítica nas diversas esferas sociais, (inter)ações fundamentais para a construção de futuros sociais mais éticos.

7 Para a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Letras e Linguística a imposição da oferta de língua inglesa como obrigatória a partir do sexto ano do Ensino Fundamental e no Ensino Médio “desconsidera a prerrogativa de que as línguas adicionais a serem ofertadas nas escolas públicas devem ser escolhidas a partir das questões sociais, culturais e históricas que atravessam as comunidades escolares nas mais diferentes regiões do Brasil. Ao desconsiderar a heterogeneidade de contextos e vozes que devem orientar a escolha da(s) línguas adicionais a serem ofertadas nos diversos ciclos da educação básica, a imposição da oferta da língua inglesa desrespeita o multilinguismo e plurilinguismo que caracteriza a sociedade brasileira”.

“A educação física, integrada à proposta pedagógica da escola, é componente curricular obrigatório da educação infantil e do ensino fundamental, sendo sua prática facultativa ao aluno”. Sabemos que na BNCC a Educação Física faz parte da área de linguagens. Ela permanecerá? Como iremos instigar práticas de vida saudável ou esportivas se à juventude poderá ser negada esta oportunidade no EM? 3.1.6 Em nome de um currículo flexível, mais dinâmico e menos enciclopédico – segundo seus idealizadores – a MP prevê que uma parte da formação seja resultado de uma escolha feita pelos estudantes – trata-se do que está denominado de “ênfase”.

A proposta de texto para o Art. 36 diz “O currículo do EM será composto pela BNCC e por itinerários formativos específicos, a serem definidos pelos sistemas de ensino”. Desta forma, podemos concluir que esta ênfase poderá emergir não como resultado de um diálogo com a comunidade escolar, mas de acordo com o planejamento e os interesses das secretarias de estado. Esta ênfase poderá ser ofertada nas áreas da BNCC – Linguagens (L), Matemática (M), Ciências da Natureza (CN), Ciências Humanas (CH) – assim como Formação técnica e profissional (FtP). Neste caso, por exemplo, se um aluno optar em seguir CN, terá em sua matriz curricular componentes de língua portuguesa e matemática (que são obrigatórias nos três anos), seguidos de Química, Física e Biologia.

Assim, terá o seu direito ceifado de estudar os demais conhecimentos científico-escolares. Cabe salientar que o texto propõe que outros itinerários formativos possam existir ao final deste, mas a decisão da existência destes itinerários ficará a cargo dos sistemas de ensino. Podemos compreender aqui a constituição de um movimento reformista que potencializa hierarquização de saberes/conhecimentos, fragmenta a formação humana, amplia as possibilidades de especialização/verticalização antecipada da formação (algumas escolas podem focar em algumas áreas pensando em preparar seus estudantes para o acesso rápido ao mercado de trabalho (ênfase na profissionalização) como mão de obra barata (precarização/degradação do trabalho e a serviço da lógica do capital) para cursos universitários específicos, como: as escolas que querem formar para acesso aos cursos da área da saúde terão mais ênfase em Ciências da Natureza; entre outros.

Cabe ressaltar, ainda, que no caso da ênfase em Formação técnica e profissional, muito embora continue a obrigatoriedade da oferta de L. Portuguesa e Matemática, observamos, mais uma vez, o reforço de uma dualidade histórica existente nas políticas educacionais brasileiras – a formação intelectual, separada da formação para o mundo do trabalho. O que se propõe acirra mais esta separação e ainda subordina o processo formativo/de escolarização aos interesses do mercado de trabalho – podendo induzir outros itinerários formativos rápidos visando a formação continuada/permanente do trabalhador, que precisa atender as demandas de um mundo mais complexo.

Abre-se, também, as possibilidades de fortalecimento de relações público-privadas, procurando suprir itinerários formativos, legitimando o repasse de recursos públicos a organizações/entidades sociais educativas de caráter privado. O estado poderá simplesmente validar parte do itinerário formativo realizado nestas organizações/entidades, reconhecendo que o estudante cursou o EM? 3.1.7 O § 11, do Art. 36, texto proposto pela MP, diz que “a critério dos sistemas de ensino, a oferta a que se refere o inciso V do caput considerará”: I – a inclusão de experiências práticas de trabalho no setor produtivo estabelecendo parcerias (ou seja, uma concepção de trabalho enquanto profissionalização, desconsiderando o trabalho como princípio educativo “ontocriativo”, como afirmaria Gaudêncio Frigotto). Uma das compreensões que podemos ter é que a lógica do mercado em uma sociedade de classes – marcada por uma ampla desigualdade social – induzirá a um processo de profissionalização cada vez mais precoce, cujos espaços produtivos servirão de ambientes pedagógicos.

Neste caso, sem uma formação intelectual que amplie a capacidade dos estudantes em compreender a trama social, política, econômica e ambiental que perpassa o mundo do trabalho no capitalismo histórico. E, depois, essa parceria se dará com quem?8 3.1.8 O Art. 44 da LDB delibera sobre acesso ao Ensino Superior, Art. 44 – A educação superior abrangerá os seguintes cursos e programas: “II – de graduação, abertos a candidatos que tenham concluído o ensino médio ou equivalente e tenham sido classificados em processo seletivo” (os mais comuns são os vestibulares e o ENEM). A inserção de texto proposto como parágrafo terceiro afirma que os processos seletivos “considerarão exclusivamente as competências, as habilidades e as expectativas de aprendizagem das áreas do conhecimento definidas na BNCC”.

Neste caso, mais uma vez, a medida provisória contribui para ampliar o abismo entre a formação intelectual e a profissional. Aqueles que aprofundarem apenas uma área do conhecimento, caso os processos seletivos também não sofram alteração, terão maior dificuldade de enfrentar os processos seletivos para ingresso no ensino superior, que já são excludentes “hoje”. Aquele que optar pelo aprofundamento no profissional, então, terá condições ainda piores (aqui brilham os olhos dos cursinhos e IES particulares, das escolas que querem fragmentar a formação e especializar-se).

A formação humana integral, como viemos construindo ao longo dos últimos anos, ancorados na ciência, na cultura, no trabalho e na tecnologia é jogada às traças. 3.1.9 O Inciso V do Art. 36 refere-se à formação profissional. O notório saber, neste caso, é para atuação nesta área de aprofundamento. Entendemos que esta medida reforça o pacto de precarização do ensino público. 8 Segundo nota publicada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação: “a privatização e a terceirização das escolas se mostram claras na MP.

Primeiro, cria-se mais um segmento profissional (sem necessidade de habilitação) dentro da categoria dos trabalhadores em educação (art. 61 da LDB). Para a contratação desses profissionais bastaria a comprovação de “notório saber”, o que reforça a afronta a um dos princípios da qualidade da educação já mitigado pela Lei das Organizações Sociais. Depois admite-se o repasse de parte da ajuda federal aos estados para pagamento de bolsas de estudo na rede privada. E por último, ao limitar a “ajuda” da União aos estados em no máximo 4 anos – depois disso os entes estaduais terão que arcar com as despesas integrais das “novas escolas” –, abre-se caminho para as parcerias público-privadas sobretudo pela via já pavimentada das OSs.

Considerações finais

A proposta em discussão afirma que a MP deverá ser implementada no segundo ano letivo subsequente à data de publicação da BNCC, por isso algumas secretarias afirmam que nada ocorrerá ainda em 2017, apenas a partir de 2018. Para atendimento em tempo integral, ás escolas (de referência) que terão seu tempo ampliado para 1.400h\ano, os recursos só serão transferidos da União aos Estados e Distrito Federal desde que cumpridos os critérios de elegibilidade estabelecidos na MP. Cabe destacar que o repasse de recursos às escolas de tempo integral será pelo prazo máximo de quatro anos por escola, ou seja, e depois? Como ficarão os demais anos, considerando os efeitos da PEC 241? Vamos precarizar outras escolas em nome de escolas de referência? As escolas ficarão abandonadas?

Quem garantirá que os governos estaduais não deixarão de manter estas escolas? Entendemos que esta MP ofende gravemente a democracia, desconsidera totalmente o diálogo com a sociedade e se propõe a precarizar o ensino público brasileiro. Compreendemos que ela não cumpre os requisitos de urgência e relevância necessários para sua edição, propondo mudanças significativas que causarão prejuízos à população que tem a escola pública como sendo seu espaço, por excelência, de aprendizagem e caminho por um mundo humanizado, que contribua para sua inserção ao ensino superior e ao mundo do trabalho.

Chapecó, 30 de Outubro de 2016.

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