A luta do 10% para educação pode ser uma grande vitória

Por Raul Fitipaldi.

Entrevista a Otaviano Helene.

Otaviano Helene é Professor do Instituto de Física (USP) e ex-presidente da ADUSP /ANDES. No próximo dia 29 de outubro participará do Seminário “Autonomia universitária, democracia e políticas de cortes” na UDESC (informação em anexo).

1. R.F.: De que maneira a onda privatizadora neoliberal afeta nossas universidades públicas, estatais e federais?

Otaviano Helene: A privatização já vem afetando nossas universidades há muito tempo e não me parece que tenha havido um aumento significativo em algum período mais recente: o aumento tem sido constante, durante o tempo todo e há muitas décadas. As fundações privadas dentro das universidades e as possibilidades de complementação salarial mesmo mantendo a dedicação exclusiva (que, obviamente, deixa de ser exclusiva) sempre existiram e têm se expandido, tanto na forma como na quantidade de instituições afetadas. A mesma expansão sistemática ao longo do tempo tem ocorrido com os cursos pagos.

Essa privatização afeta as universidades na medida em que seus docentes passam a dedicar parte do tempo – e, portanto, grande parte de seu interesse científico e acadêmico – a atividades que não interessam à sociedade como um todo (e às vezes até mesmo em detrimento das necessidades e desejos da sociedade). Isso implica, obviamente, em apropriação privada de um recurso público, a saber, a capacidade de trabalho dos pesquisadores ligados às instituições públicas.

2.   R.F. Como se verifica a desconstrução da Autonomia Universitária a partir  da crise orçamentária pública, se é que ela existe?

O.H. A perda de autonomia acadêmica também tem ocorrido de forma sistemática ao longo do tempo e, pelo que parece, sem um momento específico que marque seu início ou um crescimento abrupto. Ela ocorre pela via financeira, certamente, mas também pela acadêmica. Talvez a recente expansão das universidades federais por meio do Reuni seja um exemplo de uma decisão de amplo alcance que foi tomada fora das universidades; a expansão das universidades paulistas oferece outro exemplo de uma decisão tomada fora da universidade (embora com apoio interno).

Entretanto, cabe uma pergunta: há instrumentos suficientes para que as universidades respondam aos interesses e necessidades da sociedade? Em outras palavras: apenas a autonomia é suficiente para que a universidade assuma sua função na sociedade?

3. R.F. Por quê os cortes afetam especialmente às atividades fins (ensino, pesquisa e extensão) e não outras? Qual o cenário que se apresenta depois da greve nacional que houve este ano no setor da educação, unida a outros setores sensíveis com a saúde, etc.?

O.H. O setor público no Brasil é muito minguado. Os gastos públicos totais não chegam a mais do que 32% do PIB, muito menos do que se observa nos países – ricos ou não – que respondem adequadamente às necessidades da sociedade. Esse fato, associado ao fato que no Brasil menos do que 10% dos trabalhadores estão no setor público (o dobro e o triplo disso nos países mais organizados), está na raiz do problema que afeta os serviços públicos brasileiros. Enfrentar essa questão, em especial a baixa arrecadação pública, é fundamental, mas difícil, pois os setores dominantes fazem exatamente uma campanha em sentido contrário: de reduzir ainda mais o estado e a arrecadação pública.

Essa situação do setor público brasileiro – sua pequenez – é um dos fatores que levaram às recentes crises e às manifestações dos servidores públicos.

4. R.F. Como devem agir servidores, professores, estudantes e população afetada para garantir a Autonomia Universitária e evitar os cortes e  recortes de verbas, o prejuízo à qualidade do ensino e a exploração por parte do Estado e da Federação na carga de trabalho?

O.H. A luta pelos 10% do PIB para a educação pode ser uma grande vitória. Isso resolveria parte dos problemas da educação nacional e colocaria o país em outra plataforma de desenvolvimento social, com um sistema educacional republicano, democrático e igualitário.

Intensificar essa luta, que já tem algumas batalhas ganhas, deve estar na pauta de todas as pessoas e entidades comprometidas com a construção de um país democrático.

 Programação:

http://desacato.info/2012/10/seminario-autonomia-universitaria-democracia-e-politicas-de-cortes/

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