Por José Álvaro de Lima Cardoso.
O governo federal está cortando mais de R$ 10 bilhões dos programas Bolsa Família, aposentadoria por invalidez e auxílio-doença. A alegação é que o corte ocorreu em função de irregularidades na concessão dos benefícios. A decisão do governo golpista afeta 5,7 milhões de pessoas: 5,2 milhões do Bolsa Família e 478 mil dos auxílios-doença e aposentadoria por invalidez. O governo declarou que pretende ainda cortar mais R$ 20 bilhões de gastos sociais. O detalhe fundamental é que as medidas atingem a população extremamente pobre, que caminha literalmente no limiar da fome, apesar do Brasil ser um dos maiores produtores de alimentos no mundo.
Outro detalhe nada desprezível é o de que, ao mesmo tempo em que economiza migalhas do orçamento (que são, no entanto, vitais para a sobrevivência dos pobres), o governo gastou mais de R$ 384 bilhões nos últimos 12 meses para pagar juros da dívida pública, valores que alimentam o apetite abutre de cerca de 10.000 famílias de super ricos. O orçamento do Bolsa Família, fundamental para quase 50 milhões de brasileiros, corresponde a cerca de 24 dias de pagamento da dívida pública, dívida essa cujo pagamento deveria ser imediatamente interrompido e que deveria ser auditada, como determinou a Constituição de 1988.
Para revelar a sua natureza antipopular e antinacional, o governo não precisaria em uma canetada provocar um prejuízo ao Brasil de R$ 1 trilhão em 25 anos, em favor das petroleiras, nem precisaria entregar a riqueza do pré-sal para as multinacionais do petróleo. Não precisaria tampouco destruir a CLT, uma conquista de 74 anos, que custou sangue, suor e lágrimas dos brasileiros. Não precisaria, da mesma forma, esvaziar o SUS, para construir um “novo sistema de saúde”, transferindo recursos do Sistema para financiar a Alta Complexidade nos planos privados de saúde.
Tampouco precisaria fazer reuniões secretas com as multinacionais, para lhes dar acesso ao Aquífero Guarani, uma reserva que pode suprir a humanidade de água doce, durante 300 anos, uma riqueza de valor simplesmente incalculável. Não seria necessário, também, provocar a maior recessão já registrada na história do Brasil, que destruiu a indústria e colocou o desemprego nas alturas. Nada disso seria preciso. Somente o desmonte das políticas sociais, e a condenação de milhões de brasileiros ao horror da fome, já seria suficiente para revelar toda a natureza macabra do golpe em andamento no Brasil.
Imagem: Arte sobre foto Jefferson Rudy/Agência Senado
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José Álvaro Cardoso é economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa Catarina.