Por Maurício Molinari, para Desacato.info.
Henrique Meirelles há muito tempo é o homem forte da burguesia brasileira. Tanto foi assim que o ministro esteve à frente do Banco Central de Lula durante oito longos anos e hoje ocupa o núcleo orgânico e intocável do governo capenga e medíocre de Michel Temer. Sempre foi efetivo ao servir aos interesses das finanças, mantendo inalterada a lógica da austeridade contra o povo e assalto do Estado pela classe dominante. Entretanto, a conjuntura, pela primeira vez, é adversa ao chefe dos banksters. A incapacidade de aprovar a destruição da previdência, que deve ser votada entre 20 e 28 de fevereiro, é grande, representando um dado profundo da conjuntura atual: o crescimento acelerado da ingovernabilidade da burguesia e a ineficiência de seu grande representante.
A destruição da previdência é peça chave na nova rodada da guerra de classespromovida pela classe dominante contra o povo brasileiro. Sem ela, o congelamento de gastos públicos por vinte anos promovido pela Emenda Constitucional 95 é mera letra morta. A burguesia sabe que precisa destruir a previdência, garantindo intocável o mecanismo de assalto ao orçamento público que é o sistema da dívida pública. Só em 2016 o sistema consumiu 1 trilhão e 250 bilhões de reais, verdadeiro saque contra o esforço tributário dos trabalhadores, classe que de fato paga impostos no Brasil, ao contrário dos grandes empresários.
Nas palavras de Meirelles em reunião da Câmara dos Deputados no final de 2017: “Nós temos certamente uma trajetória de crescimento explosivo da dívida pública se não for aprovada a reforma da Previdência. No momento em que o gasto da previdência chegar a 10% do PIB, em alguns anos, não será possível aumentar a carga tributária nessa proporção, nós teremos um aumento da dívida. E um aumento da dívida junto com um aumento dos juros, produto deste aumento da dívida, produto da queda da confiança na economia, com tudo isso, nós voltaríamos a uma recessão, desta vez muito mais grave do que tudo que tivemos até hoje”.
Meirelles dá voz ao medo da classe dominante de ver seu sistema da dívida pública se transformar em insolvente. Comprometendo o volume extraordinário de propriedade privada na forma de títulos de dívida que só sobrevivem em função deste assalto permanente ao orçamento público. Uma incapacidade de arcar com isso, seria uma perda imensa para a burguesia, que veria ameaçada sua capacidade de controlar a produção social e a política nacional. Não por acaso, depois de ver seu projeto original de reforma da previdência ser derrotado em 2017, o governo reenvia uma proposta “reduzida”, tentando aprovar qualquer coisa para manter a farra ao menos até 2019, quando novo governo supostamente teria capacidade de realizar a reforma na sua destrutiva totalidade.
Chegamos no pós-carnaval e ainda não se tem os votos necessários para aprovar a reforma no parlamento. Não só Meirelles se mostra ineficiente, mas também o covil de ladrões que é o Congresso Nacional coloca sua reeleição na frente dos interesses da classe dominante. O jogo está mais pesado, rios de dinheiro estão sendo injetados nas campanhas dos ratos parlamentares para que mudem de opinião. A estratégia, no entanto, não vem gerando os efeitos na proporção desejada. Os parlamentares estão com medo de perder suas precárias reeleições. Votar contra o povo, em momento de ebulição popular onde o sistema político está em total descrédito aos olhos do povo, pode trazer danos incontornáveis.
A greve geral convocada pelas centrais sindicais para o dia 19 de fevereiro é ponto culminante deste processo. Não só a greve, mas toda a agitação política que vem sendo feita nos locais de trabalho e nas ruas, pode acuar ainda mais o cretinismo parlamentar. As chances de a reforma ser derrotada são reais, muito pelo desgaste político do governo medíocre do presidente “Vampiro Neoliberalista”, achincalhado em todos os cantos do carnaval. A revolta popular, por sua vez, é latente, mas ainda não encontra tradução por parte das lideranças políticas, que preferem pensar unicamente nas eleições burguesas de 2018 e não no drama da população que cresce de maneira explosiva.
Meirelles, o grande bankster, afunda sua imagem de homem sério e responsável dentro de um governo composto por uma Ministra do Trabalho não empossada, seu iate e seus “empresários gogo boys”. A classe dominante perde o controle momentaneamente do processo econômico, vendo aumentar a pressão das agências internacionais do imperialismo que ameaçam rebaixar a nota de crédito do Brasil. Do outro lado, o drama social aumenta, com o povo sentindo na pele os efeitos da guerra de classes travada pela burguesia. Violência e repressão do Estado, caos nos serviços públicos, surtos de febre amarela e os efeitos calamitosos da destruição das leis do trabalho.
O resultado é um jogo político totalmente aberto. Se por um lado a classe trabalhadora ainda não encontrou uma tradução política para seu drama, de outro lado a burguesia queima suas fichas. Temer já dançou, na política e no carnaval. Os políticos-empresários do estilo Dória também viram sua imagem de novidade rapidamente ser apagada, na mesma velocidade que os grafites de São Paulo. O pastor Crivella, apoiado pelos bicheiros do carnaval carioca nas eleições de 2016, passou a objeto de protesto na Sapucaí. Agora é a vez de Meirelles, o bankster na encruzilhada, que poderá ficar marcado com a pecha de não conseguir aprovar a reforma da previdência.
Que a profecia se realize e a chama do carnaval, marcado pela alegria e pela política, possa inflamar a greve geral do dia 19 de fevereiro e o decretar o fim definitivo do honorável bankster da política brasileira.
Imagem de capa: The Brazilian Report.
Maurício Mulinari é economista no DIEESE de Santa Catarina.