Por Vanessa Ibrahim.*
Há muitas formas de revolucionar ou revolucionar-se, desde a sociedade ou os costumes mas, sobretudo (ou a princípio), a si mesmo. Na essência, a palavra que fala de um corpo capaz de completar voltas, como um planeta ao redor do sol ou a lua em volta da Terra, remete também às pernas que rodam uma bailarina em um rond de jambé, ou a levam a girar numa valsa. “Se não posso dançar, não é minha revolução”. Reflito sobre a frase gravada no quadro que decora a minha sala, quando sou interrompida pela filha mais nova, que chega gargalhando repetindo o meme da internet: “o mundo não gira, ele capota”.
A cena diz muito sobre minha própria revolução. Sei pelas muitas voltas que meu corpo já deu ao redor do sol e também pelas fases da lua que contei e anunciaram a chegada das minhas filhas. Lembram-me sobre como parei de dançar, levada pelas obrigações do estudo, do trabalho e da maternidade. Afinal, em uma sociedade de resultados, que preza o pragmatismo, dançar pra quê? Talvez foi capotando que me rendi à necessidade de girar por mim mesma, apesar de tudo, e coloquei as sapatilhas num festival de dança, um dos poucos que já incluem a categoria master em Florianópolis.
Isso aconteceu na mesma semana em que uma mãe de dois venceu uma competição culinária na tevê e contou sobre as muitas vezes em que seu trabalho foi colocado em dúvida por não estar em casa. Acredito que ela afaste de si a mesma culpa que refuto ao me dedicar aos meus prazeres enquanto poderia (ou deveria) aproveitar o tempo das crias pequenas. A revolução das mulheres é assim, começa de dentro e vai contra muitas coisas, bem sabia Emma. Por isso é diferente, capaz de dançar.
Mas, como mãe por vocação, sei que as interrupções inevitáveis também são necessárias. Afinal, se não fosse a mais velha no 7º ano, teria passado despercebido por mim o movimento da revolução na astronomia. Aprendo com elas e com as mulheres que escrevem e dançam comigo. E também lendo Sabino, fazendo das quedas “um passo de dança”. Só espero que todas sejamos capazes de cumprir nossos ciclos, não aqueles determinados pelo gênero ou a idade, mas por nós mesmas. E assim a revolução de uma vai se fazendo coreografia de todas.
*Vanessa Ibrahim é mãe, jornalista, servidora pública federal e pós-graduada em Arte no Campo pela Udesc. Já morou em Rondônia e há onze anos vive em Florianópolis/SC. Na aventura pela arte da palavra, foi premiada em concurso, publicou em antologias, ebooks, portais, integra os coletivos Ruído Rosa, Mulherio das Letras de Santa Catarina e mantém o Instagram literário @santoscontos.