A aposta de altíssimo risco do imperialismo na Venezuela

Foto: Reuters

Por José Álvaro Cardoso.

No início de fevereiro, o secretário de Estado dos EUA, Rex Tillerson, em visita a alguns países da América Latina, indicou a “necessidade” de um golpe militar na Venezuela. Segundo ele “na história da Venezuela, e dos países sul-americanos, às vezes os militares são o agente da mudança quando as coisas estão ruins e a liderança não serve ao povo”. Essa foi a manifestação de um secretário de Estado do país que comanda o golpe em curso no Brasil, e que vem perpetrando golpes mundo afora, com ou sem a ajuda de militares.
Os EUA estão em fase de legitimar internacionalmente a intervenção na Venezuela. A declaração do secretário não foi ato isolado, há uma concatenação de ações e declarações públicas, com o objetivo de vender a ideia que é a intervenção se faz necessária, por uma questão humanitária, para garantir o “bem-estar” do povo venezuelano. Em 2017, Trump tinha feito a mesma referência, sobre a necessidade de uma intervenção militar na Venezuela. A estratégia de Segurança Nacional dos EUA para 2018, menciona diretamente a “necessidade e a urgência” de propiciar uma mudança de regime na Venezuela e Cuba. Os chamados formadores de opinião (think tanks, blogs, etc.) nos EUA já discutem abertamente a hipótese de intervenção militar, inclusive, sobre qual seria a melhor estratégia a ser desencadeada. A ideia é naturalizar uma intervenção como algo imprescindível e necessário, tarefa para a qual não faltam sabujos na América Latina. Já se levantou a hipótese, por exemplo, das forças armadas estadunidense realizarem um ataque aéreo, visando levar à divisão interna nas forças armadas venezuelanas, com consequente golpe dos militares sobre o governo de Maduro.

A única certeza que se pode ter é que os EUA têm planos definidos para derrubar o governo democraticamente eleito da Venezuela. Os EUA são especialistas em golpes de Estado e invasões, quarteladas e tudo que acharem que for preciso, para defender os interesses do grande capital norte-americano. O interesse dos EUA no ataque à Venezuela nada tem de humanitário, é um ataque contra um povo soberano, visando se apropriar de suas riquezas e impor um governo títere. O que move esse país imperialista são os mesmos interesses que levaram à perpetração do golpe em curso no Brasil: petróleo, água, biodiversidade, Amazônia, nióbio, coltan e outros minerais. Os EUA e a Europa enfrentam, por exemplo, grave problema da falta de água, a maioria dos rios dos EUA e do Velho Continente estão contaminados. Como se sabe, não existe país hegemônico no mundo com escassez de um bem tão fundamental como a água.

No Brasil, para dar o golpe, os EUA precisaram apenas montar uma operação que desmoralizasse a Petrobrás, e dizimasse parte da construção civil, fechando empresas e prendendo seus executivos, em nome da farsa do combate à corrupção. Apesar das denúncias virem desde 2013, apenas agora estão mais claras as conexões internacionais da Lava Jato e suas inúmeras ilegalidades. De uma hora para outra apareceu um juiz de primeira instância, com um volume enorme de informações sobre a Petrobrás, contando com o apoio e ampla cobertura da mídia. A Lava Jato foi montada com base no mesmo receituário utilizado na chamadas Primaveras Árabes, que desestabilizou governos do Oriente Médio: acesso a um volume enorme de informações sobre a Petrobrás (possivelmente fornecido pelas organizações de espionagem dos EUA), montagem de um esquema sofisticado de comunicação, com amplo apoio da grande mídia, ecoando com força as denúncias de corrupção, e de forma sempre seletiva.

No caso da Venezuela a questão é diferente. A agressão imperialista tem sofrido uma forte resistência do governo, e das forças sociais mobilizadas, por isso estão pensando em intervenção militar. Uma intervenção militar deverá enfrentar uma firme reação das forças armadas e da população, que vem sendo preparada pelos militares para resistir. É difícil imaginar que os EUA derrubariam um governo eleito, com apoio das forças armadas, sem forte reação. Uma das possibilidades colocadas é de uma operação envolvendo exércitos latino-americanos, inclusive do Brasil. Como a reação do povo venezuelano tende a ser grande, a operação iria se prolongar e exigir a presença de milhares de soldados invasores, para os EUA terem êxito na empreitada.

O envolvimento dos vizinhos sul-americanos no embate da Venezuela é inevitável, incluindo, claro, o aspecto militar. Representantes de governos pró-imperialistas, na América do Sul, orientados pelos EUA, não hesitam em se posicionar ao lado dos agressores. O governo da Colômbia, por exemplo, tem feito ataques recorrentes contra o governo de Maduro, claramente uma estratégia preparatória de uma eventual invasão militar. Não falta idiotas para acreditar nas mais falsas versões dos acontecimentos na Venezuela. Alguns “bocas alugadas” do imperialismo têm, por exemplo, repetido que Nicolás Maduro é o Saddam Hussein da América Latina, o que revela claramente até onde chegam as intenções do império na Venezuela.

A mídia a serviço dos EUA vem reforçando a ideia de que a Venezuela atravessa uma grande crise humanitária, traduzida numa suposta “migração em massa” de venezuelanos, principalmente na direção da Colômbia. O objetivo é bombardear a opinião pública internacional, de forma a justificar qualquer coisa, inclusive, um ataque militar de países vizinhos, comandados pelos EUA. São as estratégias de “guerra híbrida”, usadas em larga escala no período recente para a execução do golpe no Brasil. Uma das vertentes da tática dos golpistas a serviço dos EUA é deslegitimar as eleições ocorridas na Venezuela nos últimos tempos, qualificando-as de ilegais e ilegítimas. É fácil de entender a razão dessa postura: as eleições deram folgadas vitórias ao governo de Maduro, e colocaram a oposição a serviço dos EUA, no seu verdadeiro lugar.

Há inúmeras indicações de que os agressores estão pensando numa operação militar rápida, apoiada pelo chamado Grupo de Lima, formado por doze países do continente, um grupo claramente articulado pelo imperialismo para, dentre outras coisas, envenenar a opinião pública contra o governo da Venezuela. Este grupo fez uma reunião em 13 de fevereiro, para discutir ações contra a Venezuela. Todo tipo de iniquidade e perversidade está envolvido neste processo de ataque aos direitos elementares do povo venezuelano, de auto determinação e independência. Mas o imperialismo, em função da grave crise do sistema capitalista, resolveu fazer uma aposta de alto risco na Venezuela. Se ganhar, pode levar a região para um período de insegurança e instabilidade; se perder, irá agravar ainda mais a crise do imperialismo no mundo.

José Álvaro Cardoso é economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa Catarina.

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