Por Rayan Hindi, Josefa Suárez
A construção de uma instalação da gigante dos transgênicos americana Monsanto está paralisada há um ano na província de Córdoba, região agrícola do centro da Argentina, por moradores e ativistas de uma pequena cidade que denunciam seu impacto ambiental.
“A Monsanto contamina. A Monsanto representa agroquímicos, o glifosato, o roundup, o PVC. Não queremos mais que a Monsanto se instale nessa terra”, disse à AFP Vera Figueroa, que mora perto da fábrica. O centro da discórdia é uma usina que servirá para armazenar sementes nas Malvinas Argentinas, uma humilde localidade rural de 15 mil habitantes a 25 km da cidade de Córdoba, a segunda do país e 700 km a noroeste de Buenos Aires.
Os malvinenses cordobeses temem que o vento sopre nos silos da usina e espalhe poeira que possa afetar as vias respiratórias. Temem também que contamine os três poços de água da cidade, e que os campos vizinhos terminem semeando milho transgênico. Essas são as denúncias pontuais, mas moradores e militantes antitransgênicos apontam para todas as atividades da Monsanto. Segundo eles, a empresa não se preocupa com o meio ambiente.
“Não à Monsanto. Malvinas luta pela vida”, eram os dizeres vistos nas camisetas verdes usadas por moradores em um festival celebrado em meados do mês passado, enquanto um cartaz comparava uma espiga a uma granada. A população local calcula que a disputa seja a mesma de todos os povoados que ficam perto de campos fumigados com glifosato, um herbicida comercializado pela transnacional. Essa substância beneficia as plantas transgênicas, mas mata todo o resto.
Com sua resistência e um acampamento que mantêm na estrada, em frente ao prédio da fábrica, moradores e ambientalistas conseguiram paralisar as obras há um ano. Em janeiro, a Justiça suspendeu a construção do empreendimento até que um estudo de impacto ambiental seja concluído.
Os moradores garantem que o glifosato tem afetado a cidade. “Quando fizemos o primeiro estudo epidemiológico com a Universidade de Córdoba apareceram abortos espontâneos, más-formações e patologias ligadas à respiração e a doenças cutâneas”, enumerou Eduardo Quispe, morador e membro da Assembleia Malvinas Luta pela Vida, em conversa com a AFP.
A Argentina é um grande produtor de grãos e, na safra 2013/14, praticamente 100% da superfície de soja e de algodão foi semeada com variedades geneticamente modificadas (OGM), enquanto o milho transgênico representou 95% do total desse cultivo.
O motor de entrada de divisas da terceira economia da América Latina são as exportações agrícolas, que em 2012 superaram os 29 bilhões de dólares, segundo cifras oficiais. Essa quantidade de recursos, fundamental para a frágil economia argentina, faz que o lobby agrícola não permita que as preocupações dos ambientalistas ganhem peso.
A Monsanto está presente há mais de 50 anos na Argentina, onde o uso de sementes de soja transgênica começou em 1996. Desde então, cresceu de forma contínua e transformou o país no terceiro produtor mundial, depois de Estados Unidos e Brasil.
Em 2050, “9 bilhões de pessoas precisarão de alimentação, combustível e roupas. Como vamos conseguir (atender a esta demanda)?”, questionou a multinacional da agroquímica no site da filial argentina. Já a ArgenBio, uma organização que defende o uso da biotecnologia, promove o uso dos transgênicos e alega não haver provas de que os agrotóxicos possam afetar a saúde, se usados corretamente. “Precisamos de uma agricultura muito mais rentável e produtiva, se levarmos em conta que precisamos de uma produção para alimentar os argentinos e exportar. A Argentina vive das exportações agrícolas”, alegou a especialista em Biotecnologia Gabriela Levitus.
Mas a dúvida está especialmente no uso do glifosato, que, na Argentina, é usado para fumegar próximo de áreas urbanas. Um informe recente da Universidade de Río Cuarto, em Córdoba, que exigiu oito anos de pesquisas, concluiu que há um “claro vínculo” entre o glifosato e mutações genéticas que podem causar câncer, abortos espontâneos e nascimentos com más-formações. “Os agroquímicos e o dano que provocam estão absolutamente vinculados ao modelo agropecuário vigente”, afirmou o biólogo da UNRC Fernando Mañas, que também denuncia que empresas, produtores e funcionários do governo “costumam ignorar, ou desqualificar pesquisas, cujos resultados lhes sejam inconvenientes”.
Foto: Pascal Pavani / AFP
Fonte: Carta Capital
Nesta reportagem até a foto está errada: ela mostra uma manifestação na França…
O que se passa na pequena comunidade argentina é a repetição da estratégia de bucha de canhão, onde ONGs internacionais contra a biotecnologia e, particularmente, contra as multinacionais do ramo, usam populações fragilizadas e exploradas como espoleta para disparar suas balas contra o sistema. Uma vergonha.
PS. Só para lembrar: o que a monsantoo quer construir é uma fábrica de sementes e estoque de grãos e sementes, nada tem a ver com produção de herbicidas…