Por Vitor Abdala.*
O crescimento da violência e da sensação de insegurança por parte da população impõe ao país vários desafios na área de segurança pública, entre eles, a redução do número de homicídios que, desde 2008, ultrapassam os 50 mil por ano. Segundo o Ministério da Saúde, em 2012, o número de pessoas assassinadas chegou a 56,3 mil. Mais da metade das vítimas de homicídio no país (53%) têm entre 15 e 29 anos.
“Precisamos de uma política nacional de enfrentamento da violência. Cada estado tem uma política diferente. A violência virou problema nacional. Antigamente, as regiões eram restritas a algumas poucas regiões metropolitanas, como Rio, São Paulo e Recife. Na virada do século, a violência se espalhou para o interior dos estados e para outras regiões”, afirma o sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, organizador do Mapa da Violência, divulgado anualmente com informações sobre crimes violentos em todo o país.
A criação de um plano nacional de redução de homicídios é uma das propostas do documento Agenda Prioritária de Segurança Pública, produzido por organizações não governamentais e especialistas em segurança de vários estados.
“A gente tem uma dificuldade imensa de esclarecer esses crimes. A média é de que apenas 8% dos homicídios são esclarecidos. É preciso que esse plano estimule a investigação de homicídios, que seja uma prioridade nos estados com o incentivo à criação de departamentos especializados nesse tipo de crime e estímulo às perícias criminais”, afirma Carolina Ricardo, analista do Instituto Sou da Paz.
Segundo ela, um dos primeiros passos para lidar com a queda dos homicídios é definir melhor as responsabilidades de cada ente federativo. “Hoje isso ainda é muito difuso. A gente sabe apenas que os estados controlam as polícias Civil e Militar. Mas é preciso definir as responsabilidades do governo federal, montar um bom plano nacional, estabelecer como parte da responsabilidade federal a formação de gestores policiais e disseminar informação padronizada de qualidade. Sem informação não se faz política de segurança”, disse Carolina.
A especialista explica que é preciso construir um banco de dados nacional com informações referentes às armas em circulação e aos crimes cometidos em todos os estados, que integre todos atores das áreas de justiça e segurança. Segundo ela, também é preciso ter uma política de controle de armas e reformular o Fundo Nacional de Segurança Pública, que preveja repasses periódicos anuais e cujo financiamento obedeça a critérios objetivos.
“A violência não é inevitável. Não é um fenômeno natural. Programas pró-ativos que impliquem a proteção da cidadania, prevenção à violência e também repressão à violência quando ela acontece. Mas o que vemos hoje é basicamente a repressão à violência depois que ela já aconteceu”, afirma Waiselfisz.
Outro ponto da Agenda Prioritária é a reforma do modelo policial existente hoje no Brasil, em que há duas polícias estaduais, uma civil (responsável pela investigação e cumprimento de mandados judiciais) e outra militar (responsável pelo policiamento ostensivo).
O sistema prisional é outro desafio do próximo governante. Segundo os últimos dados disponíveis do Ministério da Justiça, havia, em dezembro de 2012, 548 mil detentos em presídios e cadeias públicas de todo o Brasil. Além do número elevado de pessoas encarceradas, muitas unidades prisionais apresentam problemas como superlotação, estrutura física inadequada e falta de políticas de reinserção dos presos.
Esses problemas acabam gerando situações extremas, como chacinas e rebeliões com vítimas, como as vistas recentemente em Pedrinhas, no Maranhão.
Para Carolina Ricardo, uma das ações que poderiam ser adotadas é a redução do número de encarceramentos por meio da priorização de penas alternativas para crimes de menor potencial ofensivo.
“O governo federal é uma importante fonte de financiamento da política penitenciária. Grande parte dos estados brasileiros dependem desses recursos. O [próximo] presidente precisa dizer que não vai mais tolerar que o Brasil encarcere essa quantidade de pessoas sem nenhum resultado efetivo para a sociedade. Quando a gente vê o orçamento de 2013, do Fundo Penitenciário Nacional, 95% foram gastos com criação de vagas [em presídios]. Só 5% foram destinados a alternativas à prisão. É preciso mudar o foco”, disse.
Para a juíza aposentada Maria Lucia Karam, da Leap Brasil, grupo de policiais, promotores e juízes defensores da legalização das drogas, uma parte importante dos detentos é encarcerada por crimes relativos a drogas ilícitas. Além disso, um grande número dos homicídios está relacionado a drogas. Para ela, é fundamental que o próximo governante lide com a mudança na legislação antidrogas do país. “Sem isso, qualquer medida para reduzir a violência será mero paliativo”, disse.
Maria Lucia defende a legalização das drogas e outras medidas como a mudança na legislação para deixar mais claro quem é usuário de drogas (portanto que não pode ser preso) e quem é traficante (portanto, é passível a prisão), a redução do encarceramento de pequenos traficantes e o investimento em políticas de prevenção.
Segundo a Constituição Federal, a segurança pública é uma responsabilidade compartilhada da União com os entes federativos. A União é responsável pelas polícias Federal, Rodoviária Federal e Ferroviária Federal, enquanto os estados respondem pelas polícias Civil e Militar, e também pelo Corpo de Bombeiros. As prefeituras podem criar suas guardas municipais.
*Repórter da Agência Brasil
Imagem: Wilson Dias/Agência Brasil
Fonte: Agência Brasil