Por Aline Atsuda Braga.
A discussão sobre mobilidade urbana nas cidades se desenvolve com um bom direcionamento: a integração do desenvolvimento urbano e transportes – tendo em vista o uso e ocupação diversificados e complementares do solo; o adensamento das cidades; as viagens mais curtas; o estimulo ao uso do transporte coletivo, aos veículos não motorizados e aos pedestres. As regulamentações da área de transportes também vão ao encontro dessa discussão, mas o que tem sido, de fato, realizado para concretizar essas boas ideias?
Dentre as oportunidades para efetivar essas proposições na mobilidade da cidade de São Paulo, destacam-se algumas promessas da Campanha Haddad à Prefeitura do município, no eixo da mobilidade urbana. Até 2016, devem ser realizadas a recuperação e a construção de 150 km de novos corredores de ônibus, implantação de 150 km de faixas exclusivas para coletivos (meta superada, atualmente com 327 km), obras para melhoria do trânsito e implantação de 400 km de vias cicláveis (até o momento há obras iniciadas em 49,3 km). No que se refere à malha metroferroviária, sob responsabilidade do Governo do Estado, há obras em andamento e uma série histórica de anos de atraso em muitas obras prometidas em campanhas eleitorais – vide reportagem da Folha (http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2013/05/1278679-editorial-trens-atrasados.shtml).
Recentemente, o Plano Diretor de São Paulo – que dá diretrizes para o planejamento da cidade nos próximos 16 anos – foi aprovado com mudanças que articulam desenvolvimento urbano, meio ambiente e mobilidade na cidade. Traz oportunidades importantes como: ampliação das zonas destinadas a construção de moradia popular; recursos do Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano com destino a habitação de interesse social e sistema de transporte público e cicloviário; adensamento de eixos de transporte público; limite de número de vagas em prédios a serem construídos próximo aos eixos de mobilidade; incentivo econômico às áreas da cidade adensadas populacionalmente, mas sem distribuição de empregos, como zona leste de São Paulo.
A despeito das propostas de investimento em transporte público, a situação atual da mobilidade na cidade vai ao encontro da tendência brasileira de alta motorização dos deslocamentos. De acordo com dados da última pesquisa Origem e Destino do Metrô (2007), de mais de trinta e oito mil viagens realizadas diariamente na RMSP, 55% foram realizadas por coletivos e 45% por modais individuais. Cerca de 92% das viagens realizadas na Região Metropolitana de São Paulo ocorrem nas vias. Segundo o Secretário de Transportes Jilmar Tatto, no Seminário de “Transporte e Mobilidade Urbana no Brasil: desafios e oportunidades” (http://www.greenpeace.org.br/seminario_transportes_2014/) – promovido pelo Greenpeace -, apesar da maioria das viagens no município ocorrer via coletivos, há uma ocupação desigual do espaço viário, de 79% do sistema é ocupado por carros, 15% motos, 3% por ônibus, 1% fretados e 2% caminhões.
Espaço utilizado para transportar a mesma quantidade de pessoas em carros, bicicletas e ônibus. Fonte: http://splasho.com/blog/2007/11/
Além da superlotação do sistema viário e dos coletivos, temos enfrentado o aumento da tarifa. A elevação da renda per capita da população, desloca passageiros pagantes do transporte público, para a frota individual, mais atrativa que os coletivos. Uma vez que o transporte público é financiado por seus usuários diretos, a redução de passageiros acarreta o aumento da tarifa, que somada aos custos de operação e manutenção do sistema acima da inflação, há aumento acima da inflação também na tarifa, sobrecarregando os usuários pagantes.
Outro ponto a ser mencionado na questão, refere-se à situação da mitigação de custos ambientais, frequentemente deixada na lateralidade das metas de transporte, por enquanto o município está sem inspeção veicular, uma ferramenta importante para o controle da poluição atmosférica. Também houve paralisação do Programa Ecofrota da Prefeitura de São Paulo – uma medida importante para substituir combustíveis energéticos fósseis, por combustíveis menos poluentes -, tais medidas, apesar de não serem prioritárias no setor de transportes, são relevantes para diminuir a contribuição do setor em emissões de gases de efeito estufa e poderiam reverter em economia na área da saúde, ao reduzir a emissões de poluentes.
Priorizar o transporte de massa deve vir acompanhado de outras diretrizes para solucionar os problemas de mobilidade urbana na cidade, como destacado nos debates, diminuir a distância e o número de deslocamentos na cidade, adensar centros urbanos, incentivar o uso misto e complementar das áreas distribuindo os empregos, serviços e moradia no território, priorizar deslocamentos á pé e modais não motorizados. Com a diminuição no número e distância de viagens, os benefícios vão além da economia de tempo individual, significa economia na infraestrutura de transporte e energia, menos emissões de poluentes e economia no setor da saúde.
Para seguirmos com um modelo sustentável de mobilidade urbana, é fundamental articular as políticas em nível estadual, municipal e federal e entre os diferentes setores da gestão pública (transporte, saúde, desenvolvimento urbano, meio ambiente), para que não ocorram políticas divergentes e que os esforços não se estagnem ou anulem. Não se pode perder de vista a visão sistêmica e integrada dos problemas de transporte, desenvolvimento urbano, meio ambiente e saúde, para desenvolver políticas para melhoria da mobilidade na cidade. Visto a insustentabilidade do modelo atual e com as manifestações de junho/julho de 2013, sabe-se que o debate já está fomentado na sociedade. O desafio atual é: como institucionalizar as questões levantadas de maneira geral, pela sociedade e em especial pelos movimentos sociais, nos governos.
* Aline Atsuda Braga – Núcleo de Gestão Ambiental do Instituto Saúde e Sustentabilidade
Fonte: EcoDebate