A confissão de Boni sobre o debate entre Lula e Collor

Por Paulo Nogueira.

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Me enviam um vídeo que resume o Brasil.

Nele, sorridente, aparentemente orgulhoso, o ex-chefão da Globo, Boni, confessa um crime de lesa sociedade.

Você pode vê-lo aqui.

Boni conta que, no célebre debate entre Lula e Collor que definiria as eleições presidenciais de 1989, a Globo preparou Collor.

Quer dizer: uma concessão pública achou que tinha o direito de se meter nas primeiras eleições diretas para presidente.

A Globo, conta Boni, tirou a gravata de Collor para dar a ele um ar mais popular. Se pudesse, disse Boni, a Globo borrifaria caspa em Collor, a exemplo da tática clássica de Jânio Quadros para se identificar com a voz rouca das ruas.

Mas havia coisa bem pior.

Há muitos anos conheço a história das pastas de Collor. Ele se apresentou no debate com elas.

O que nas redações se comentava é que fora um truque de Collor. Chegou a Lula a informação de que na pasta estavam denúncias contra ele.

Lula ficou apavorado. Durante todo o debate, Collor fingia de tempos em tempos que ia abrir as pastas para apanhar coisas que comprometeriam Lula.

As pastas tinham papel que não significavam nada, na realidade. Mas levaram Lula a ter um desempenho sofrível num debate vital.

A revelação – confissão – de Boni é que quem armou o golpe das pastas foi a Globo, e não Collor.

Mais uma vez: ele disse isso em tom triunfal. Não tinha noção, ou não parecia ter, da gravidade do que estava dizendo.

O que se fez diante das palavras de Boni?

Nada. A mídia não se mexeu. A justiça não se mexeu. O governo não se mexeu. Para que serve um Ministério da Comunicação?

Este é o Brasil.

A Globo goza de espantosa impunidade. Pode fazer tudo, que não acontece nada.

Boni conta que o homem chave da Globo no crime foi o executivo Miguel Pires Gonçalves, filho de um general da ditadura. A Globo agora contrata filho de ministro do Supremo. Antes, contratava filho de general. Mudaram as circunstâncias, mas a Globo ficou igual.

Joaquim Barbosa arrumou um emprego para o filho na Globo. Ayres Britto escreveu o prefácio de um livro de Merval sobre o Mensalão. Gilmar Mendes aparece em fotos ao lado de Merval.

Lula, a vítima do crime eleitoral da Globo, foi ao enterro de Roberto Marinho, e produziu uma eulogia em que disse que o falecido era um brasileiro que viera “a serviço”.

A serviço do quê?

Não satisfeito em aplaudir Roberto Marinho, Lula decretou três dias de luto oficial. Ao fazer isso, Lula enxovalhou a memória de homens como Getúlio Vargas e João Goulart, vítimas das conspirações golpistas de Roberto Marinho.

É possível que o episódio do debate tenha deixado Lula para sempre com um sentimento paralisante de medo em relação à Globo, para infortúnio da sociedade.

A Carta aos Brasileiros, com a qual logo no início do mandato ele se comprometeu essencialmente a não fazer nada de muito diferente do que vinha sendo feito antes dele, foi arrancada a ele por João Roberto Marinho, filho de Roberto Marinho.

Montaigne escreveu que seu maior medo era ter medo.

A Globo pôs medo em Lula e no PT. E põe medo no Brasil.

O medo foi o responsável pela chamada “mídia técnica”, pela qual a Globo recebeu de governos petistas 6 bilhões de reais em dez anos mesmo tendo sonegado escandalosamente impostos e mesmo produzindo um conteúdo destrutivo para todas as causas sociais. A manchete do Globo quando foi efetivado o 13.o, sob Jango, dizia que se tratava de uma “calamidade”.

O medo da Globo impediu que se discutissem regras para a mídia, para evitar monopólios como a Globo.

Se Kirchner tivesse medo do Clarín, não faria o que fez.

Enquanto perdurar o medo da Globo, o país vai patinar no desenvolvimento social, porque a Globo é um obstáculo intransponível para a construção de uma sociedade justa.

É irônico que um partido que dizia que a esperança tinha que vencer o medo tenha se tornado, ele mesmo, depois de chegar ao poder, tão medroso.

Fonte: Diário do Centro do Mundo.

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