O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, requereu ao Supremo Tribunal Federal (STF), na última quinta-feira (30/1) a suspensão de liminares e sentenças em ações de reintegração de posse ajuizadas por donos de fazendas localizadas na Terra Indígena Tupinambá, no sul da Bahia. A controvérsia gira em torno do direito de ocupação das terras objeto do conflito agrário.
Segundo o chefe do Ministério Público Federal (MPF), o caso demanda a intervenção excepcional do STF para atuar como agente pacificador. Conforme explica o PGR, “aliado ao conflito agrário em si, há enorme instabilidade no exame da questão pelo juízo na origem. São inúmeras as ações possessórias que buscam a retirada dos indígenas das terras na região”. O pedido argumenta que se deve priorizar uma solução provisória prudente e cautelosa, a qual poderá evitar a ocorrência de dano maior à ordem e à segurança pública.
Estudo da Funai
No caso em análise, o MPF relata que existe um estudo específico e conclusivo da Fundação Nacional do Índio (Funai) sobre as terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas Tupinambá. “O fato de não haver sido concluído o procedimento demarcatório não poderia ser óbice, como foi, ao reconhecimento do direito – possessório que seja, no momento – dos Tupinambá sobre as terras que ocupam”, ressalta.
Rodrigo Janot pontua que a proteção possessória dos fazendeiros não poderia ter sido efetivada da forma como ocorreu, na medida em que se prestigiou a comprovação da posse e do esbulho alegadamente sofrido pelos não-índios e se ignorou o estudo pericial da Funai, que atestou, em 2009, o direito dos indígenas sobre a área.
De acordo com o MPF, “a manutenção das decisões impugnadas mina, novamente, o direito dos Tupinambá e protela o exercício da posse e ocupação de suas terras originárias, com tudo o que isso representa para a comunidade e sua subsistência”.
O pedido ressalta que o deferimento de liminares em ações de reintegração de posse não é solução para o conflito já instalado no sul da Bahia, tampouco o ameniza. “Ao contrário, a retirada dos indígenas das terras à força, nesse momento, contribuirá para o aumento da tensão e do conflito agrário, porque toca em ponto especialmente sensível aos indígenas”, observa.
O MPF conclui que “o ciclo de invasões e retomadas das terras, pelos fazendeiros da região e indígenas, encerrar-se-á, de modo definitivo, apenas com a finalização do procedimento demarcatório.”
Constituição Federal
Para o PGR, o deferimento dos pedidos se justifica pelo iminente abalo à segurança e à ordem pública. Ele destaca que a Constituição da República prevê, de forma expressa, o direito de posse permanente e a extinção de atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das regiões indígenas.
Rodrigo Janot explica que a resposta à discussão passa, necessariamente, pelo exame da Constituição Federal (CF), a qual determina que “são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças, tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”.
A norma constitucional também anota que “são terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por ele habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições”. A peça processual pontua, ainda, que toda a legislação infraconstitucional deve ser interpretada de acordo com a Constituição Federal.
Na visão do MPF, “a demarcação, também constitucionalmente prevista, será uma consequência lógica e necessária, com vistas à concretização dessa proteção constitucional, o que não significa dizer, entretanto, que o direito não possa e deva ser, desde logo, resguardado”. A demarcação, conforme destaca Janot, tem natureza declaratória, reconhecendo o direito originário, precedente, dos indígenas.
Foto: Reprodução/AgenciaPulsar.org