Pisando em ovos, com o Papá Francisco

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Por Victor José Caglioni*

 

Falar de figuras públicas sempre é envolver-se em alguma polêmica, parece inevitável, e por essa mesma razão tratava do assunto só entre amigos, até que um pedido inusitado vindo de uma pessoa ligada à igreja, em que pedia maiores informações sobre este, me fez pensar: Por que não escrever um pouco sobre o Papa? Afinal hoje em dia pode-se falar de praticamente “quase” tudo no Brasil.

Foram muitas as vezes que as pessoas se questionaram sobre o Papa Francisco, particularmente algumas delas solicitavam alguma opinião sobre ele, visto que tive o prazer de morar na mesma cidade que este por três anos, e nada melhor que esperar passar a euforia de sua nomeação para que se possa pensar sem pressões externas.

Bom, visto a popularidade e ou a “famosidade” de nosso personagem, tratarei de emanar apenas aquilo que vi, e ouvi de gente que acompanhou a sua trajetória muito de perto (há quadras diria até).

Durante algum tempo, em razão de uma freira colombiana muito alegre, um amigo colombiano que à conhecia desde Bogotá e eu tivemos contato com um grupo de freiras católicas de Buenos Aires, intitulado “Siervas de Jesus”, organizado na Basílica “Santa Rosa de Lima” na Avenida Belgrano 2216, no Bairro de San Cristóbal. Aliás, uma das igrejas mais lindas da cidade, muitas vezes mais interessante que a própria catedral, uma característica da maioria das igrejas de lá localizadas nos bairros não turísticos…

Esse grupo organiza todas as noites, abrigos e comida para desabrigados e moradores de rua da capital argentina,orientação psicológica e tentativa de inserção social, que hoje não são mais assistidos por nenhuma política pública (todas cortadas do orçamento da cidade, na gestão do atual prefeito Maurício Macri, extrema direita daquele país) e que tiveram grande incremento pós crise de 2001 e suas conseqüências posteriores (para quem deseja entender mais sobre esse impacto bancário-financeiro, inclusive sobre a classe média agrícola e comercial local, indicamos o documentário “La dignidad de los nadie”, disponível no youtube.).

A população em geral realiza doações ao grupo, quando não ajuda o mesmo, em mutirões. Nada divulgado na mídia, nada é permitido ser associado à política (que localmente é mais extrema, tensa e de difícil manejo social positiva e negativamente), pois bem, este trabalho estava a comando do então Bispo de Buenos Aires, Jorge Mario Bergoglio (hoje Papa Francisco). Um trabalho que é muito mais que “elogiável” tornou-se essencial para a sobrevivência dessa população.

Sobre polêmicas como o envolvimento deste com a ditadura Argentina, como tudo que envolve esse tipo de regime, é tudo muito obscuro, mas um historiador local, Mario Abella, muito comprometido e crítico com as questões sociais relatou o seguinte conto, quando questionado por mim sobre o Papa Francisco e o sanguinário General Videla (aquele das polêmicas fotos em que ganhava a comunhão católica do próprio religioso): “Quando você está num jogo perigoso que sua vida corre risco, e tem vinte pessoas destinadas a morrer e você pode salvar doze em detrimento de oito, o que faria?”.

As Madres de la Plaza de Mayo, sempre contaram com o apoio do então Bispo de Buenos Aires, outro fator que deve ser considerado diferencial, visto as descobertas recentes do envolvimento de religiosos da época com desaparecimento de filhos de militantes contrários ao regime.

O padre mais popular da Argentina Padre Ignácio, da cidade de Rosário, conhecido por suas manifestações favoráveis a uma igreja mais aberta e compreensiva frente a temas ainda tabus na instituição (como uso de camisinhas-controle de AIDS e educação sexual, casamento igualitário e atuação de mulheres em seus degraus na organização) mantém diálogos públicos construtivos há anos com Bergoglio, a ponto do rosarino ser recebido pelo Papá em Roma, num encontro emotivo e televisionado.

A principio, numa igreja um tanto “dividida em dogmas” temos um papá novo, até em sua maneira de ser polêmico, talvez fruto de sua sociedade de cultura e personalidade forte, com coragem ao menos de por em evidencia;  talvez não inteiramente com todo o gozo de seus poderes afinal há espaços e situações em que estamos independentemente para onde se pensa seguir: “quase como pisar em ovos”.

A fim de não julgar nem tentar fazer acreditar numa teoria de conspiração, muito comuns entre igreja e governos, cabe repetir o que o mais emblemático e premiado lingüística-filósofo e cientista cognitivo dos Estados Unidos declarou em dezembro passado sobre nosso tema: “Os EUA matavam quem praticava o que prega o Papá Francisco”.

Embora sempre haverá polêmica sobre sua figura, positiva ou negativamente, até pelo passado de sua instituição, particularmente a impressão, que ficamos dessa figura pode ser representada pelas duas citações a seguir: “O mundo detesta mudanças, no entanto é a única coisa que traz progresso” Charles F. Kettering (inventor e filósofo norte americano) e “ O rei que possuir a justiça, não precisa de coragem” Aristóteles!.

Blumenau, janeiro de 2014.

* Sociólogo

Imagem tomada de: dosmagazine.com

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