Por Guila Flint.
Mais do que qualquer outro líder israelense, Ariel Sharon simboliza a linguagem da força. Em sua longa carreira, como militar e político, Sharon esteve envolvido nos capítulos mais violentos do conflito entre Israel e os palestinos, ocupando postos-chave desde a fundação de Israel, em 1948.
Em 1953, quando era um jovem militar de apenas 24 anos, Sharon comandou a operação na aldeia palestina de Qibya, também conhecida como massacre de Qibya, que deixou 69 mortos, a maioria deles civis. A operação foi uma decisão do governo israelense, naquela época liderado pelo primeiro-ministro David Ben Gurion, em represália a um atentado na cidade de Yehud que havia deixado 3 civis israelenses mortos.
Agência Efe
Sharon em 2005, quando era primeiro-ministro e tinha grandes chances de ser reeleito
A Unidade Especial 101, comandada por Sharon, atacou a aldeia na Cisjordânia — então sob dominio jordaniano — destruindo 49 casas, uma escola e uma mesquita. Muitas das vitimas estavam dentro das casas, que foram explodidas pelas tropas.
Na guerra de outubro de 1973, já general do Exército, Sharon comandou a travessia do Canal de Suez, que foi decisiva para a vitória das tropas israelenses contra as forças egípcias. Essa operação lhe rendeu o reconhecimento como um dos estrategistas militares mais importantes da história do país.
Carreira política
Em 1977, após se aposentar do Exército, Sharon iniciou sua carreira politica. Seu primeiro cargo foi de ministro da Agricultura no governo de Menahem Begin, lider do partido de direita Likud. Naquela época Sharon foi apelidado de “trator”, por sua ação enérgica em favor da ampliação dos assentamentos israelenses nos territórios ocupados.
Sharon foi considerado o “pai” dos assentamentos ao longo de quase tres décadas de carreira politica. Em 1981 foi nomeado ministro da Defesa no governo de Begin e, em 1982, liderou a primeira guerra do Libano, contra as forças da OLP (Organização de Libertação de Palestina), baseadas no país.
O massacre nos campos de refugiados palestinos de Sabra e Chatila, em setembro de 1982, levou a um afastamento temporário de Sharon da vida politica. Cerca de 1.500 civis palestinos foram assassinados por milícias falangistas libanesas, que entraram no campos enquanto as tropas israelenses os cercavam.
Afastamento
A Comissão Kahan, nomeada pelo governo israelense para investigar o massacre, chegou à conclusão de que Sharon era responsável por ter “ignorado o perigo de derramamento de sangue e não tomar medidas adequadas para impedi-lo”.
Wikicommons
No mundo árabe, após o massacre de Sabra e Chatila, Sharon tornou-se a figura israelense mais odiada e foi denominado “o açougueiro de Beirute”.
[Sharon em maio de 1982, pouco antes do massacre de Sabra e Chatila]
Sharon foi afastado do cargo de ministro da Defesa e muitos em Israel pensaram que sua carreira política havia chegado ao fim. No entanto, ele permaneceu entre os líderes mais importantes do partido Likud e ocupou cargos de ministro até 1999, quando se tornou presidente do partido.
Em setembro de 2000, Sharon, escoltado por mil policiais, entrou na Esplanada das Mesquitas, em Jerusalem Oriental, desencadeando a segunda Intifada (levante palestino).
A presença do lider israelense mais odiado pelos palestinos, no lugar mais sensível e em uma época de extrema tensão entre os dois povos, foi o estopim de uma onda de violência que durou 4 anos e deixou mortos dos dois lados.
“Homem forte”
Em 2001, em meio à Intifada, Sharon foi eleito primeiro-ministro. Sua imagem de “homem forte” fez com que grande parte do público israelense o elegesse para pôr um fim à série de atentados suicidas que assolava as cidades israelenses.
Em março de 2002 Sharon ordenou o início da chamada Operação Muralha de Defesa, durante a qual as tropas israelenses reocuparam as cidades palestinas e cercaram o quartel general do presidente palestino, Yasser Arafat, em Ramallah.
No mesmo ano, sob o comando de Sharon, foi iniciada a construção do Muro israelense na Cisjordânia.
O Muro, que consiste em um complexo de muros de concreto nas áreas urbanas e cercas nas áreas rurais, e tem mais de 400 quilometros de extensão, foi construído supostamente para separar israelenses de palestinos e, assim, impedir a entrada de atacantes suicidas no país.
No entanto, a barreira não separa israelenses de palestinos, mas sim palestinos de palestinos, pois não passa na chamada Linha Verde — a fronteira entre Israel e a Cisjordânia até a guerra de 1967– mas dentro da Cisjordânia, anexando parte do território palestino a Israel.
Guinada
Em 2003, Sharon deu uma guinada em direção a uma posição de centro, mais pragmática do que aquela que havia defendido praticamente a vida inteira.
Wikicommons
“Não é possível continuar mantendo 3,5 milhões de palestinos sob ocupação”, disse em maio de 2003. “Essa situação é ruim para os palestinos, para Israel e para a economia de Israel”.
[Sharon e George W. Bush em 2003, ano da guinada política do israelense]
Naquela época, Sharon aceitou o Mapa do Caminho, plano proposto por Estados Unidos, Russia e União Europeia, para a paz entre israelenses e palestinos, e anunciou seu apoio à ideia da criação de um Estado Palestino.
Em 2005 Sharon conduziu a retirada das tropas e dos assentamentos israelenses da Faixa de Gaza.
A guinada de Sharon gerou choque e indignação da direita israelense, que passou a considerá-lo traidor da ideologia do Grande Israel.
Ele enfrentou uma rebelião dentro de seu próprio partido, o Likud, e em 21 de novembro de 2005 renunciou à liderança do partido e fundou o partido de centro Kadima.
Em 4 de janeiro de 2006 Sharon sofreu um derrame cerebral que o deixou em estado vegetativo por oito anos, até a sua morte, neste sábado (11/01).
Fonte: Ópera Mundi.